ponto de vista

A demagogia da oposição

Para combater a violência não basta enviar forças policiais aos morros. É preciso dar a seus moradores conforto e esperança, saúde, educação e trabalho – e isso custa dinheiro

A reação dos ricos contra a CPMF e, agora, contra a Contribuição Social para a Saúde (CSS), coincide com a posição dos chamados “formadores de opinião”. Os ricos detestam pagar impostos. Os pobres não podem sonegar. O imposto de renda é cobrado na fonte e cada mercadoria comprada tem imposto embutido no preço. Os ricos, mediante a pressão de suas entidades de classe (CNI, Fiesp, Febraban e outras), pressionaram o Congresso e impediram a prorrogação da CPMF. Argumentavam que o tributo onerava os preços para o consumidor.

Para quem movimentasse R$ 2.500 mensais a contribuição era de R$ 9,50. Mas imaginem quanto pagavam as grandes empresas ou seus executivos. Quem movimentasse R$ 1 bilhão, sem a taxa de CPMF, acrescentaria R$ 38 milhões aos seus lucros. Quem ganhou e quem perdeu com o fim da CPMF? Os pobres perderam, ao ter a assistência à saúde ainda mais comprometida com a falta desse dinheiro.

O país é como a nossa casa. Para cuidar do lar e da família temos de buscar os recursos, trabalhando. O que ganhamos não é só nosso. Vai para aluguel, condomínio, o pão e o leite, as despesas do supermercado, a educação das crianças, roupas e sapatos – e o pouco de lazer a que todos temos direito. Sem os salários, o padrão de vida cai, pais perdem o respeito dos filhos, e o lar pode desmoronar. Com o país é a mesma coisa. O Estado precisa de recursos para manter a infra-estrutura e os serviços públicos (portos, estradas, hospitais, escolas, universidades, forças armadas, forças policiais, e assim por diante). Esse dinheiro vem do trabalho de todos. Cada um deve contribuir com o que pode.

Mas, como só o trabalho gera as riquezas, desde que os portugueses chegaram aqui só os pobres pagam impostos. Os empresários compram e vendem trabalho. Adquirem as matérias-primas – que necessitam do trabalho para serem extraídas da natureza – e alugam o trabalho dos operários e dos administradores para transformá-las em produtos de uso e consumo. Como não põem a mão na massa, são simplesmente homens de negócios, embora se identifiquem como “produtores”. Produtores são os que transformam minério em automóveis, fibras de algodão em tecidos, o couro do boi em sapatos.

Os trabalhadores, embora sejam os que realmente pagam impostos, sabem que são essenciais para que o país seja soberano e cresça. Não são os impostos que os fazem pobres, mas os salários injustos que recebem. Por mais que o Estado cobre em tributos, as necessidades nacionais são maiores a cada dia. Estamos agora com ameaças sobre a Amazônia. Temos de estar prontos para defendê-la com forças militares numerosas, bem preparadas e bem equipadas. Essa defesa não tem preço.

Para combater a violência não basta enviar forças policiais aos morros e às favelas das grandes cidades. É preciso dar a seus moradores o mínimo de conforto e de esperança, com saúde, educação e trabalho – e isso custa dinheiro. O governo que ocupa o Estado e não cuida desses problemas, é um governo contra seu povo. Mas deles não pode cuidar, se não tiver recursos. Recursos que vêm de parcelas do trabalho – e deveriam vir também dos lucros – de todos.

O presidente da República decidiu que não intervirá para que o Congresso aprove a CSS. É responsabilidade do Parlamento. Ainda que seja depois do processo eleitoral, como estão anunciando alguns senadores, a oposição acabará por admitir a contribuição, se o povo exercer a contrapressão. Os líderes oposicionistas entenderão que, no caso em que se situem contrários à CSS (negando recursos para a saúde pública), serão esfacelados nas eleições parlamentares de 2010. Hoje, com a transmissão pública das sessões da Câmara e do Senado, os eleitores podem acompanhar os debates e tirar suas próprias conclusões, sem passar pelos “formadores de opinião”.

Mauro Santayana trabalhou nos principais jornais brasileiros a partir de 1954. Foi colaborador de Tancredo Neves e adido cultural do Brasil em Roma nos anos 1980