A coragem dos hermanos

A vitória de Cristina Kirchner, na Argentina, e o resgate do gosto pela política (foto: © Pablo Busti) A Argentina entrou quebrada no século 21. Entre a chegada e a […]

A vitória de Cristina Kirchner, na Argentina, e o resgate do gosto pela política (foto: © Pablo Busti)

A Argentina entrou quebrada no século 21. Entre a chegada e a partida do governo de Carlos Menem, de 1989 a 1999, o país entregou-se à cartilha econômica escrita em Washington. O Estado foi desmontado, empresas públicas foram privatizadas, o sistema financeiro foi internacionalizado e concentrado, o desemprego subiu. Falido, o país ainda ficou por um triz de sepultar qualquer apreço pela democracia pela qual tanto havia lutado, após dois períodos de ditadura (1966-1973 e 1976-1983). A repressão foi brutal. A redemocratização trouxe porém frustrações políticas e econômicas, com Menem e Fernando de la Rúa.

Enquanto viviam a pior crise desde o século 19, os argentinos passaram a ficar desencantados com a democracia. A chegada de Néstor Kirchner, em 2003, iniciou uma ruptura com a onda neoliberal. O êxito na condução econômica foi demonstrado com a eleição de Cristina Kirchner em 2007. E referendado com a reeleição da presidenta agora em outubro. Além da economia novamente na rota do crescimento, avançaram as investigações e punições dos crimes da ditadura. Grandes interesses da elite econômica foram contrariados, inclusive os da velha mídia, lá liderada pelo grupo Clarín. A integração entre os países do Cone Sul foi privilegiada. Ressurgiu  interesse das pessoas na política, em intervir nos rumos do país. Enfim, celebrar, novamente, a democracia.

O Brasil vive ambiente semelhante. Mostra que é possível crescer, distribuir renda e tocar sua economia sem pedir a bênção aos países ricos. Apresenta-se nos grandes fóruns internacionais e dá um pito nos ricos pela maneira desastrosa como conduzem a crise que eles mesmos criaram, ao elevar o sistema financeiro à condição de divindade. Outras semelhanças com a Argentina, porém, ainda são aguardadas. Os crimes da ditadura continuam impunes. Os interesses das grandes corporações da comunicação, comandadas por meia dúzia de famílias, seguem intocados.

Aqui, essa velha mídia se “indigna” com a corrupção denunciada em Brasília, como se esta tivesse sido inventada agora, mas omite os escândalos que orbitam o governo de São Paulo e seus seguidores no Legislativo. Se Geraldo Alckmin fosse um governador petista, como Agnelo Queiroz (DF), teria saído na capa daquela revista semanal com chifrinhos na cabeça, sangue nos olhos e a manchete “O chefe do bando”. Se Bruno Covas, com sua farra nas emendas, fosse ministro da base aliada de Dilma, já teria caído. Mas como é secretário do governo Alckmin, ninguém sabe, ninguém viu.