Greve

Não se pode desaprender

Não se pode desaprender

Manifestante em Brasília durante greve dos Correios (foto: © Anotnio Cruz/ABr)

Enquanto esta edição era concluída, nos primeiros dias do mês de outubro, categorias nacionalmente importantes encontravam-se em greve, ou em vias de, na busca de soluções para as campanhas salariais. As paralisações são resultado do embrutecimento patronal, inclusive de empresas estatais que, sob um governo de esquerda e composto de muitas lideranças formadas no movimento sindical, andaram para trás nos últimos anos nas relações com os trabalhadores. Os bancos públicos chegaram a mostrar que podem ser diferentes do que eram nas gestões neoliberais, quando passaram a negociar decentemente com os empregados. E como importante ferramenta de Estado na indução do crescimento sustentável e na proteção do país contra a explosão da crise de 2008. Parou por quê?

Em vez de se mostrarem diferenciados do sistema bancário também nas relações de trabalho e no respeito aos clientes, os estatais reproduzem o que a concorrência privada tem de pior: estressam funcionários e aborrecem clientes. A postura nas negociações salariais tem levado, ano após ano, a greves que poderiam ser evitadas com um diálogo sério que levasse ao compartilhamento civilizado dos bons resultados com trabalhadores e sociedade. Em vez disso, tentam blindar seus lucros e ainda abusam dos interditos proibitórios, recurso jurídico que latifundiários usavam no passado para “proteger” propriedades e passou a ser empregado por banqueiros para constranger o direito de greve. Constrangimento imposto também pela direção dos Correios ao tentar forçar a barra para suspender a greve e descontar abruptamente os dias parados de seus funcionários, prática interpretada no próprio Tribunal Superior do Trabalho como hostil ao direito.

A chegada da esquerda ao poder é recente em países da América do Sul. E, se a divisão do poder por meio de coalizões conservadoras limita o raio de ação dos partidos progressistas em relação a seus discursos originais, a ampliação do diálogo social daria maior vazão à sua criatividade programática e de gestão, em direção à “democracia real”, bandeira dos novos movimentos em gestação no mundo. Reproduzir práticas retrógradas no campo trabalhista, e viciadas no campo político, mais que um embrutecimento, pode emburrecer. Não ajuda a superar uma história secular de desmandos de uma elite avessa ao mundo democrático e justo que queremos.