Trabalho à moda antiga

Museu em Belo Horizonte resgata ofícios que ajudam a contar a história do Brasil pré-industrial, expondo o engenho dos primeiros trabalhadores brasileiros.

Foto:João Correia Filho

Não há notebooks, sinais de fax nem muito menos mãos robóticas controladas por um cérebro eletrônico. O Museu de Artes e Ofícios de Belo Horizonte leva direto a uma época em que o trabalho estava mais atrelado às mãos do homem e a ferramentas que nem de longe lembram as modernidades de hoje. Fundado em 2005, o MAO, como é chamado, possui recursos futuristas apenas para valorizar e expor o acervo de mais de 2.200 peças, do século 17 ao início do 20, que contam um pouco a história de um Brasil pré-industrial e valorizam o trabalho de milhares de brasileiros de um passado não muito distante, mas surpreendente. 

Ferramentas, utensílios, máquinas e equipamentos diversos conduzem a uma verdadeira identificação com o universo do trabalho, ao mesmo tempo em que fascinam por seu apuro estético e pelo que representam na construção do país. É o caso das ferramentas usadas na ourivesaria, que demonstram o primor tanto no fazer joias quanto na aferição de riquezas, como é o caso das balanças de precisão milimétrica, cujas peças também chamam a atenção por seu design rico em detalhes – por si só uma verdadeira joia. Se o assunto é balanças, outra peça atrai os olhares, dessa vez não por sua precisão, mas por sua função: pesar escravos. Datada do século 18, proveniente da Bahia, põe a pensar sobre o quanto o progresso tecnológico caminha descolado da evolução civilizatória.

A tecelagem também demonstra sua arte em máquinas rudimentares para os dias de hoje, mas verdadeiras obras de engenhosidade. São dezenas de descaroçadores de algodão, rodas de fiar e lançadeiras, a maioria do século 19, que auxiliaram mulheres e homens a tramar o passado com perfeição.

A sala que expõe a culinária explica a relação entre os alimentos, suas técnicas de processamento e os hábitos cotidianos de vários povos que habitaram o país desde sua formação. Cenários completos dão detalhes da produção do queijo, da mandioca, do milho, da cana-de-açúcar, entre outros alimentos milenares que fizeram história em terras brasilis.

Estação

Ambientes inteiros são dedicados ao comércio, aos boticários e à fundição, além de um grande acervo de carpintaria do século 18, com centenas de ferramentas usadas na fabricação de quase tudo que se pudesse imaginar em madeira.

E nada disso fica solto no espaço e no tempo. Todo o museu é dividido em áreas­ temáticas: ofícios ambulantes (que inclui de dentistas a afiadores de facas), ofícios da cerâmica, da cozinha, da madeira, da mineração, da terra, do couro, do fogo, do transporte e até da proteção ao viajante, que inclui uma coleção de armas. Para facilitar, os temas estão ainda agrupados em categorias, como carpintaria, ferraria, fundição e ourivesaria, entre outras que deram origem a muitas profissões contemporâneas.

Sobre geração de energia, algo muito comentado nos dias de hoje, o MAO também dá seu recado: o Jardim das Energias é um espaço dedicado a grandes moendas de cana originalmente movidas a água e a animais e exibe estruturas com engrenagens complexas, feitas por carpinteiros e marceneiros, também homenageados no museu.

Lá dentro, a descrição do modo de vida de barqueiros e comerciantes de vias fluviais leva a entender o universo mítico das antigas embarcações, que adentraram o país com suas carrancas – espécie de escultura instalada na frente das embarcações –, usadas como forma de proteção espiritual. Algumas ali expostas são originais do grande mestre Francisco Bisquiba Guarani, criador das primeiras peças, que percorreram o Rio São Francisco até meados do século passado. 

A criação do museu foi iniciativa do Instituto Cultural Flávio Gutierrez, em parceria com o Ministério da Cultura e a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU). O MAO ocupa os espaços da Estação Central de Belo Horizonte, construída no final do século 19, com sua bela fachada em meio à Praça da Estação, esta inaugurada junto com a fundação da cidade. O local foi totalmente restaurado e se tornou um dos cartões-postais de BH. 

Por ali transitam diariamente milhares de pessoas, tanto na praça como nos trens que ainda adentram as plataformas do edifício do museu e servem de parada para composições que cortam a cidade. Aliás, uma estrutura de vidro instalada em algumas áreas do MAO permite ver o embarque e desembarque de passageiros. E dá provas de que se está diante de um museu vivo, onde o trabalho, esse componente vital de nosso cotidiano, é protagonista permanente da história. 

Programe-se

Museu de Artes e Ofícios: Praça Rui Barbosa, s/n (Praça da Estação), Belo Horizonte. Terça, quinta e sexta-feira, das 12h às 19h. R$ 2 a 

R$ 4. Quarta-feira, de 12h às 21h (grátis das 17h às 21h). Sábado, domingo e feriados, das 11h às 17h (grátis aos sábados). Confirme antes: 

(31) 3248-8600. Visita virtual: www.mao.org.br