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O ano em que Michel saiu da rotina

Ator principal do filme O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias, Michel Joelsas dá autógrafos, tira fotos com fãs e freqüenta eventos, mas não se deslumbra. Ainda brinca, estuda e faz planos para o futuro

gerardo lazzari

Michel nunca havia sequer estrelado campanhas publicitárias e foi parar direto na tela do cinema. A vida começou a virar a partir de um teste do qual participaram outras 2 mil crianças de várias escolas judaicas em todo o país, incluindo o colégio I. L. Peretz, onde estuda desde o maternal. “Comecei a fazer o teste por curiosidade, fazíamos um pequeno texto e uma encenação”, conta. Como nos movimentos do videogame, foi passando de fase, avançando e, de repente, foi parar no cinema. Michel Joelsas virou Mauro, personagem – principal! – de um dos melhores filmes da safra brasileira dos últimos tempos, produção escolhida para concorrer a uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias (2005), dirigido por Cao Hamburger.

Sua mãe, Marisa Dias, também foi surpreendida. Num primeiro momento nem se preocupou em saber direito que teste era aquele: “Como o pedido veio do colégio, que é absolutamente confiável, nem atentei muito para o que era e autorizei. Durante três meses outros pedidos de autorização vieram. Só fui saber o que era de fato quando o Michel, então com 10 anos, me disse que estava entre 12 crianças que participariam do filme. Foi então que vi que era o Cao Hamburger. Lembrei do Castelo Rá-Tim-Bum e percebi que se tratava de um trabalho realmente sério”.

Na história, os pais de Mauro, envolvidos na luta contra a ditadura militar na virada da década de 60 para a de 70, o deixam na casa do avô, no bairro paulistano do Bom Retiro. Para interpretá-lo, seria necessário saber a respeito desse período da história do Brasil e também dos hábitos e tradições da cultura judaica. Enquanto os pais sofriam as agruras da repressão no momento mais cruel da ditadura, Mauro estava totalmente entregue à euforia da Copa do Mundo do México. A poesia do filme mistura com equilíbrio a obscuridade do terror à memória do melhor futebol do mundo, em meio a uma crônica que reconstrói com leveza o dia-a-dia naquele reduto da comunidade judaica.

Michel lembra-se do clima das filmagens como de altíssimo astral e de grande integração na equipe. “A cena em que chorei, por exemplo, exigiu grande concentração. Já na cena da dança maluca (ao som do hit da Jovem Guarda Eu Sou Terrível), com vários colegas meus, eu me diverti muito”, conta. Outro momento marcante foi quando conheceu um dos maiores atores do Brasil, Paulo Autran, que faz uma participação especial no início do filme.

Nas cenas externas, filmadas em Campinas (interior de São Paulo), Michel era acompanhado por seus avós. “Eu e minha mulher tivemos de mudar um pouco o ritmo de vida. Foi tudo uma grande surpresa. Primeiro, por ele ter sido escolhido. Depois, pelo fato de Cao Hamburger ter me dito, no pré-lançamento do filme, que o Michel foi um presente de Deus para todos da equipe”, lembra o avô Adolfo Dias, de 73 anos.

Para conciliar o trabalho nas filmagens e as tarefas da escola, Michel não tinha moleza. “Uma professora de inglês e outra de hebraico, que é matéria regular da escola, foram contratadas para dar aulas no set de gravação. Uma pessoa autorizada pela escola levava as provas. Ele não teve facilidades. Ao contrário, o combinado era continuar muito bem na escola para poder fazer o filme.”

O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias foi lançado em outubro de 2006. Rapidamente se tornou um dos filmes brasileiros mais elogiados por público e crítica nos últimos anos. Nos festivais de Berlim e Israel, Michel aproveitou para passear. Apelidado de “Férias” e “Mauro” por colegas da escola, ele parece ter realmente gostado da experiência. Acaba de participar do curta-metragem A Ópera do Malandro, de André Moraes, baseado no musical de Chico Buarque.

O ego também está sob controle. Desde a produção de O Ano até os primeiros sinais do sucesso, a preocupação dos pais de Michel e de sua colega de filme, a atriz mirim Daniela Piepszyk, era que não ficassem deslumbrados. E contaram com o apoio da produção, observa Marisa: “O próprio Cao me falou que, de Pixote para cá, existe no meio um cuidado especial com todas as crianças. Chegaram até a me perguntar se eu achava que era preciso uma psicóloga ou algum cuidado especial com o Michel. Eu disse: ‘Olha, talvez a mãe precise, mas ele não’”.

Houve até situações em que os papéis se inverteram: era ele que levava a mãe a manter os pés no chão em momentos de excesso de euforia. “Olha, o mais importante é o trabalho, senão, quando passar esse boom da mídia, você ficará com um vazio”, ensinava o jovem ator, que, hoje aos 12 anos, já faz novos planos para a carreira cinematográfica: “Pelo que vi nas filmagens, gostei muito da direção de fotografia…”