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Ilhas de transações sem transparência, times brasileiros podem ter a responsabilidade social entre seus objetivos. Para isso, há muito a evoluir

Toru Hanai/REUTERS

Consagrado como melhor do mundo, ao vencer o Barcelona, no Japão, em dezembro, o Internacional de Porto Alegre (RS) tem se destacado também fora dos gramados. O clube gaúcho desenvolve uma série de ações sociais e foi o autor do primeiro balanço social feito por um time brasileiro. A relação dos clubes de futebol com os interesses da coletividade nem sempre é das melhores. São habituais freqüentadores dos tribunais trabalhistas e da listas de devedores do INSS. Foi, aliás, a partir de uma imposição do Ministério Público do Trabalho da 4ª Região, em Porto Alegre – prestação de trabalhos comunitários – que o Colorado gaúcho acabou se diferenciando.

Em sua página na internet, o clube admite que a criação do programa Saci Colorado foi “uma forma socialmente responsável de substituir uma dívida financeira do S.C. Internacional com o MP, através de ações sociais em benefício dessas crianças e adolescentes”. As atividades começaram em 2005 e acabaram tomando corpo, ampliando o público-alvo e associando-se a outros parceiros, como ONGs, prefeituras e profissionais de diversas áreas na promoção de atividades artísticas, esportivas e de lazer, cursos de qualificação e oportunidades de geração de renda junto a escolas e entidades assistenciais.

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Por suas iniciativas, o Inter conquistou em 2005 o prêmio Responsabilidade Social da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul e certificado pela apresentação do Balanço Social no Prêmio Ethos, de São Paulo. O orçamento anual do Inter é de 100 milhões de reais. Em 2005, foram aplicados mais de 21 milhões em projetos de geração de renda, saúde e saneamento, educação e cultura. “É uma obrigação nossa e está em nosso planejamento”, afirma o vice-presidente Mario Sergio Martins.

Essas ações, no entanto, ainda são tímidas diante do potencial dos clubes. Segundo o gerente de Políticas Públicas do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, Caio Magri, a diretoria do clube será procurada no início deste ano para saber se estão dispostos a ir adiante. “Acreditamos que possa ser um exemplo para o Brasil. Mas será preciso avançar em aspectos como a transparência da gestão”, declarou Magri, para quem a responsabilidade social empresarial no futebol é um filão que pode se desenvolver, mas há dificuldades na implementação do conceito num setor ainda distante da gestão aberta e do respeito ao consumidor. “O esporte tem capacidade de agregar a responsabilidade social de forma muito poderosa, pois clubes e patrocinadores não têm interesse em manter uma imagem de violência, de administração antiética ou de ligação com lavagem de dinheiro internacional, como tem acontecido nos últimos anos”, afirmou.

Magri acredita que o Inter tem margem para evoluir e que já deu um pontapé inicial nas preocupações sociais. Além de diversas ações de voluntariado, existem iniciativas como o projeto Genoma Colorado, cuja função é mobilizar as crianças das comunidades carentes a se dedicar ao futebol, ao mesmo tempo em que recebem orientações para promoção da cidadania. São beneficiados cerca de 7.400 meninos no Rio Grande do Sul e em alguns estados.

Outro projeto, chamado de A Escola Rubra, atende mais de mil alunos por ano e busca ensinar ou aprimorar os fundamentos técnicos e táticos do futebol, trabalhando a formação social das crianças. “Nas escolinhas, temos às vezes 2 mil meninos e meninas. Vou formar 2 mil jogadores? Talvez não forme nenhum, mas vou formar, com certeza, 2 mil cidadãos”, destaca o dirigente Martins. Fica lançado mais um desafio para o futebol brasileiro.

Camisa a honrar
No começo do século 20, futebol era coisa de elite. Clubes abertos passaram a adotar o nome Internacional, ligeiramente inspirados na 2ª Internacional Socialista (1889, precursora do socialismo democrático). Em São Paulo, em 1907, foi criado um Sport Club Internacional. Em 1908, três irmãos da família Poppe, sócios do time paulista, mudaram para Porto Alegre e, não aceitos nos clubes, fundaram outro Internacional. Primeiro a admitir negros e pardos como jogadores no RS e virou o “clube do povo”. Seu mascote é o Saci. Diz a lenda que em cantava-se o hino da Internacional Socialista em algumas reuniões do clube.
Flávio Aguiar

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