PNDH é, para a esquerda, o que foi a Carta ao Povo Brasileiro para a direita, diz cientista político

Para Antonio Augusto de Queiroz, assessor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), decreto é uma forma de sinalizar limites a concessões de eventual governo Dilma

A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, durante o lançamento da terceira edição do Programa Nacional de Direitos Humanos, em dezembro. Sinalização à esquerda (Foto: Roosewelt Pinheiro/Agência Brasil)

O decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no final de dezembro que estabelece o terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) tem, na visão de Antonio Augusto de Queiroz, assessor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), função semelhante à que teve a “Carta ao Povo Brasileiro” na campanha de 2002. Mas em vez de o alvo ser os setores ligados ao mercado, a finalidade do documento, desta vez, são movimentos e segmentos de esquerda.

“Esse decreto do Programa Nacional de Direitos Humanos é uma forma de o governo sinalizar para um setor mais à esquerda que criticava seriamente as concessões do governo à direita”, analisa Queiroz. “O Programa de Direitos Humanos é, para a esquerda, o que foi a ‘Carta aos Brasileiros’ para a direita. Podemos fazer esse contraponto”, compara.

Em junho de 2002, o então candidato à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva publicou um compromisso de não romper contratos nem promover mudanças radicais na economia. A “Carta ao Povo Brasileiro” pregava mudanças e rejeitava ‘qualquer forma de continuísmo, seja ele assumido ou mascarado’. Mas, ao mesmo tempo, prometia ‘transição’ e ‘respeito aos contratos e obrigações do país’. Um recado claro de que não haveria radicalismos na condução da economia.

Agora, na visão de Queiroz, o PNDH-3 cumpre função análoga diante da almejada aliança do PT com o PMDB. “É uma forma de (o governo) dizer que, mesmo com o pessoal do PMDB vindo para a aliança, vão ser trabalhadas algumas bandeiras nessa linha mais à esquerda”, avalia.

Fruto de discussões a partir da 13ª Conferência Nacional de Direitos Humanos e continuidade das duas edições anteriores – de 1996 e 2002 –, o PNDH-3 foi assinado no dia 21 de dezembro. Provocou reações de diferentes setores. Ruralistas, militares, membros da Igreja Católica e de grupos evangélicos, além de segmentos conservadores da sociedade criticaram o que consideram exageros provocados por um olhar esquerdista.

Diretrizes relacionadas à Comissão de Justiça e Verdade, à revisão da Lei de Anistia, à defesa de direitos de gênero, reprodutivos e ligados à diversidade – e questões sensíveis como aborto, união e adoção por casais homoafetivos etc. – despertaram duras críticas. O texto foi revisado e uma nova versão foi publicada no dia 14 de janeiro.