Pautas polênicas

Rosa Weber continua relatora de ações sobre aborto, orçamento secreto e Daniel Silveira

Como nova presidente do STF, ministra poderia repassar os três processos para Luiz Fux, mas preferiu manter os mais controversos em seu poder

Fellipe Sampaio/STF
Fellipe Sampaio/STF
Ministra se aposenta em outubro de 2023, e portanto não ficará sequer por dois anos na presidência

São Paulo – A nova presidenta do Supremo Tribunal Federal, Rosa Weber, deu indicação clara, nesta quarta-feira (14), de que os recados diretos que deu a Jair Bolsonaro e seus seguidores ao tomar posse no cargo, não eram palavras ao vento. Mesmo tendo chegado à chefia da Suprema Corte do país, a ministra decidiu manter com ela a relatoria de três processos controversos e caros ao bolsonarismo: a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação, o perdão concedido pelo presidente ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) e orçamento secreto (este, mais importante ao Centrão).

De acordo com o regimento do Supremo, ao assumir a presidência, a ministra poderia repassar os processos de que era relatora antes de assumir o cargo, para o colega que substituiu – no caso, Luiz Fux. Foi o que fez Rosa Weber, exceto nos processos mais emblemáticos que estavam com ela em seu gabinete. É significativo que ela tenha guardado para si a relatoria das ações sobre orçamento secreto, Daniel Silveira e aborto.

No discurso de posse, Rosa Weber proferiu um discurso considerado duro nos meios políticos, apesar de ela ter um perfil avesso a holofotes. Bolsonaro não compareceu à cerimônia. “Sejam as minhas primeiras palavras a de reverência incondicional à autoridade Suprema da Constituição e das leis da República, de crença inabalável na superioridade ética e política do Estado Democrático de Direito”, disse.

Princípios republicanos

Destacou enfaticamente a “prevalência do princípio republicano” e a “igualdade entre as pessoas, de estrita observância da laicidade do estado brasileiro”. Acrescentou a necessidade da “garantia de pleno exercício da liberdade religiosa, de respeito ao dogma fundamental da separação de poderes, de rejeição aos discursos de ódio, e repúdio a práticas de intolerância”.

O julgamento da “graça presidencial” concedida por Bolsonaro a Daniel Silveira deve ter grande repercussão, pelo envolvimento político do próprio presidente da República no caso. Ao proferir seu voto pela condenação de Silveira, em abril de 2022, a ministra agora presidente negou a alegação da defesa de que o bolsonarista era vítima de perseguição.

Daniel Silveira condenado

“Em absoluto há aqui falar em perseguição por delito de opinião. Quando o agente ataca, como no caso, a própria existência desta Suprema Corte enquanto instituição, não há duvidas de que ele se expõe, com efeito imediato dos mecanismos de autodefesa da democracia, à censura penal do Estado”, afirmou Weber.

Ela acrescentou que não estava em questão “a proteção dos juízes transitórios da Corte, mas a defesa do próprio Estado Democrático de Direito.” Silveira acabou condenado a 8 oito anos e 9 meses de prisão, mas recebeu a “graça” do protetor Bolsonaro.

Aborto e orçamento secreto

A ministra relata também ação do Psol, de 2017, com pedido de descriminalização do aborto para grávidas com até 12 semanas de gestação. A agremiação alega que a norma do Código Penal (de 1940) que criminaliza o ato viola a dignidade da pessoa humana, da saúde e outros princípios.

Quanto ao orçamento secreto, em novembro de 2021 a ministra ordenou por liminar a suspensão imediata do orçamento secreto. Depois, acatou o argumento das Mesas da Câmara e do Senado, de que a suspensão pura e simples prejudicaria os serviços públicos essenciais. Porém, a ministra destaca ser necessário dar “ampla publicização dos documentos”. A decisão depende agora do Plenário.

A ministra será aposentada compulsoriamente em outubro de 2023, quando completará 75 anos de idade. Portanto não ficará pelos dois anos regimentais na presidência do STF. Ela tem de pautar os três julgamentos antes disso. Não decidiu ficar com as relatorias se não fosse para dar andamento a eles. Mas os colocará em pauta apenas depois das eleições, para não conturbar ainda mais o ambiente tenso do país.

Leia a íntegra do discurso de posse da ministra Rosa Weber.