Rumo à tirania

Só novo governo pode conter totalitarismo de Bolsonaro, diz Deborah Duprat

Ex-procuradora-geral da República disse que Bolsonaro usa método para capturar instituições. E que objetivo é expandir domínio para os outros poderes

LUIZ SILVEIRA/AGÊNCIA CNJ
LUIZ SILVEIRA/AGÊNCIA CNJ
Deborah Duprat foi subprocuradora-geral da República até 2013 e procuradora federal dos Direitos do Cidadão até 2020

São Paulo – Mais do que uma regra em tempos de Jair Bolsonaro, o assédio institucional é um método do seu governo que visa ao totalitarismo. O alerta veio da jurista Deborah Duprat, em debate sobre o tema na noite de ontem (25), primeiro dia de atividades da 74ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

Vice-procuradora-geral da República de 2009 a 2013, Deborah resumiu o desmonte proposital da estrutura do Estado logo no início do governo. A extinção dos conselhos de participação social, que pôs a perder todas as conferências nacionais realizadas nos governos populares democrático. E as alterações na estrutura do estado, com a capturação dos espaços institucionais. Servidores forma expulsos, silenciados, licenciados, aposentados, demitidos.

“O impacto na atualidade é de tal monta que vai ser um desafio enorme para o próximo governo, se tivermos um próximo governo, recuperar da capacidade da administração pública federal de funcionar. Ela foi absolutamente desmobilizada, desorganizada em termos administrativos. Não temos capacidade administrativa, organizacional, servidores”, disse.

E alertou: “Será um esforço hercúleo. Por isso estamos aqui falando de assédio institucional. O governo populista começa pela burocracia, mas se expande ao ponto de se tornar totalitário quando alcança os demais poderes”.

Coordenado pela antropóloga Maria Filomena Gregori, professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o debate teve participação do economista José Celso Cardoso Junior e do antropólogo Frederico Barbosa, pesquisadores do Ipea. Ambos integram o corpo de organizadores do livro Assédio Institucional no Brasil: Avanço do Autoritarismo e Desconstrução do Estado, lançado em maio.

Avanço do autoritarismo no governo Bolsonaro

Bolsonaro
Métodos do governo de perfil autoritário sinalizam que o pior sempre pode piorar

A obra parte de 211 denúncias, reportagens de jornais e redes sociais para discutir o tema. Enquanto o assédio moral e sexual nas relações de trabalho estabelecem comportamentos deletérios, como ameaças, constrangimentos e desqualificações, partem de pessoas que se conhecem e envolvem aspectos pessoais. E não são regra, mas exceções no ambiente.

Já no institucional, o objetivo é político-ideológico. É o caso de Ricardo Galvão, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que foi demitido por divulgar informações contrárias aos interesses do governo no caso das queimadas e desmatamento da Amazônia. “Não havia relação prévia. O assédio institucional se converte em assédio moral, mas começa com índole político-ideológica, com fins determinados”, disse José Celso.

Ou seja, no caso da Funai, o assédio institucional levou o indigenista Bruno Pereira a pedir licença não-remunerada da Funai. E foi assessorar a Terra Indígena Vale do Javari até se assassinado no começo de junho com o jornalista inglês Dom Phillips. O caso exemplifica também como esse tipo de assédio tem efeitos sobre o funcionalismo público, os povos indígenas, o meio ambiente e, por tabela, a sociedade em geral. E para além disso, é um atalho escolhido por governos com aspirações totalitárias, como o governo Bolsonaro.

Esta é a quarta edição do evento realizada em meio à negação da ciência institucionalizada e da perseguição a cientistas, ao corte de recursos para o setor de educação, ciência, tecnologia e inovações. Neste ano, o tema é Ciência, independência e soberania nacional”, em alusão ao bicentenário da Independência do Brasil comemorado neste ano.

Confira a íntegra do debate


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