‘O presidente me ligou… Ele tá com um pressentimento’, disse Milton Ribeiro à filha
Desdobramentos do escândalo do MEC fogem do controle de Bolsonaro, mesmo com a interferência na Polícia Federal a favor do ex-ministro
Publicado 24/06/2022 - 17h19
São Paulo – Os desdobramentos do caso Milton Ribeiro parecem ter fugido ao controle do governo Jair Bolsonaro. Mesmo com a interferência na Polícia Federal a favor do ex-ministro da Educação, apontada pelo próprio delegado Bruno Callandrini, que conduziu a Operação Acesso Pago, o Planalto não tem como cobrir todas as frentes para abafar o caso. A Justiça Federal em Brasília enviou nesta sexta-feira (24) a investigação ao Supremo Tribunal Federal (STF). A justificativa para apelar à mais alta Corte do país é justamente a interferência na apuração que, segundo suspeitas, vem do “alto”.
O juiz federal Renato Borelli cita conversas telefônicas de Ribeiro interceptadas no âmbito das investigações. Nos diálogos, o ex-ministro dá a entender que sabia do trabalho dos investigadores. Mas informado por quem? Segundo o juiz, existe a “constatação do envolvimento de autoridades com prerrogativa de foro, inclusive a Presidência da República”.
“Tudo caminhando, tudo caminhando. Agora tem que aguardar”, diz Milton Ribeiro em uma conversa gravada revelada pelo portal g1. “Alguns assuntos estão sendo resolvidos pela misericórdia divina: o negócio da arma, resolveu. Aquela mentira que eles falavam que os ônibus estavam superfaturados no FNDE, também. Agora vai faltar o assunto dos pastores, né? Uma coisa que eu tenho receio um pouco é de o processo fazer aquele negócio de busca e apreensão, entendeu?”, continua o ex-ministro na conversa.
Ribeiro cita Bolsonaro ao telefone
Segundo ainda o g1, Milton Ribeiro disse em conversa com uma filha ter recebido ligação de Bolsonaro, na qual o presidente teria manifestado temor de ser atingido pela investigação da PF. Eis o diálogo:
– A única coisa meio… hoje o presidente me ligou… Ele tá com um pressentimento, novamente, que eles podem querer atingi-lo através de mim, sabe? É que eu tenho mandado versículos pra ele, né?, disse Ribeiro à filha.
– Ele quer que você pare de mandar mensagens?, quer saber a filha.
– Não! Não é isso… ele acha que vão fazer uma busca e apreensão… em casa… sabe… é… é muito triste. Bom! Isso pode acontecer, né? Se houver indícios, né?, respondeu o ministro.
“Investigação prejudicada”
Na mensagem enviada aos colegas denunciando interferência, o delegado da PF Bruno Callandrini agradece o “empenho na execução da Operação Acesso Pago”, mas lamenta que a “investigação envolvendo corrupção no MEC foi prejudicada no dia de ontem em razão do tratamento diferenciado concedido pela PF ao investigado Milton Ribeiro”.
Ribeiro era para ter sido conduzido “até o aeroporto em São Paulo para viagem à Brasília” (sic), segundo Callandrini, mas foi conduzido para a unidade da PF em São Paulo. “O deslocamento de Milton para a carceragem da PF em SP * é demonstração de interferência na condução da investigação, por isso, afirmo *não ter autonomia investigativa e administrativa para conduzir o Inquérito Policial deste caso com independência e segurança institucional”, escreveu o delegado. Segundo ele, “o principal alvo, em São Paulo (Milton Ribeiro), foi tratado com honrarias não existentes na lei”.
Outro problema que ameaça Bolsonaro é a CPI do MEC, que já conta com 28 assinaturas, uma a mais do que as 27 exigidas pelo Regimento do Senado. O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), autor da iniciativa, argumenta que, com a visível interferência do Planalto na Polícia Federal a favor de Milton Ribeiro, a CPI se torna ainda mais importante.
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