DIREITOS EM RISCO

André Mendonça ‘não virou um democrata ontem’, aponta jurista

Para advogada e integrante da ABJD Tânia Oliveira, futuro ministro do STF “já colocou a religião acima do direito” em algumas ocasiões e “é impossível separar as práticas pretéritas” daquilo que se espera dele na Corte

Jefferson Rudy/Agência Senado
Jefferson Rudy/Agência Senado
Logo depois da aprovação, Mendonça voltou a demonstrar verdadeira face religiosa. "Voltou a ser um pregador, um pastor", diz advogada

São Paulo – Para a advogada, historiadora, pesquisadora e integrante da coordenação-executiva da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), Tânia Oliveira, a aprovação do advogado e pastor presbiteriano André Mendonça para ocupar uma cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF) é uma afronta ao Estado democrático de direito.

O plenário do Senado aprovou nesta quarta-feira (1°), por 47 votos a 32, o nome do bolsonarista “terrivelmente evangélico” para ocupar a vaga deixada pelo ministro Marco Aurélio Mello. Durante a sessão, Mendonça buscou usar um tom mais “moderado” para ser aprovado.

“Foram mais de oito horas de sabatina onde ele tentou esconder sua militância bolsonarista e as práticas religiosas. Essa aprovação é bastante complicada, apesar dele se afastar do radicalismo na sabatina, não há como acreditar no que foi dito ali. Ele disse, por exemplo, que respeitaria o casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas não significa que não votará contra. É um jogo de palavras”, afirmou Tânia, em entrevista a Glauco Faria, no Jornal Brasil Atual.

Após ter o nome aprovado pelo Senado, Mendonça comemorou com um discurso emocionado para seus apoiadores evangélicos. “Logo depois da aprovação, ele voltou a mostrar sua verdadeira face. Sem precisar mais dos votos, voltou a ser um pregador, um pastor”, analisou a advogada.

Mendonça na sabatina

Durante a sabatina, André Mendonça disse que sua posição religiosa não prejudicaria seu trabalho como ministro do STF. Para a advogada da ABJD, não há problemas em professar ou não qualquer tipo de fé, mas sim ter conexões particulares com igrejas, como demonstrou em sua defesa da reabertura de cultos religiosos, na posição de advogado-geral da União, durante o auge da pandemia de covid-19.

“Nós não sabemos a religião de nenhum dos dez ministros do STF, o que mostra a necessidade de haver a separação entre Estado e a religião. Portanto, se houver essa mistura, é uma afronta ao Estado democrático e à Constituição”, criticou Tânia Oliveira.

Enquanto o Brasil registrava cerca de 4 mil mortos diários por covid-19, Mendonça disse que os cristãos estavam “dispostos a morrer por sua fé”. “Ele já colocou a religião acima do direito. É impossível separar as práticas pretéritas do André Mendonça e dizer que ele virou um democrata ontem. Essa aprovação é negativa para a sociedade”, acrescentou a entrevistada.

Senadores que se destacaram na CPI da Covid ao se posicionarem contra o governo Bolsonaro como a relatora da indicação de Mendonça, Eliziane Gama (Cidadania-MA), Simone Tebet (MDB-MS) e Omar Aziz (PSD-AM) deram um “voto de confiança” ao ex-ministro do atual governo. Segundo a advogada, chegou a hora de debater o método de sabatina.

“As sabatinas precisam ser repensadas e discutidas no Senado. Virou uma coisa completamente burocrática, sem cumprir os mínimos requisitos de procedimento. O que não aconteceu ontem também foi a disposição dos senadores para questionarem de maneira certa um candidato a ministro do Supremo Tribunal Federal”, defendeu.

Confira a entrevista


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