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CPI da Covid: juristas apontam possíveis crimes de Bolsonaro na pandemia

Parecer entregue a senadores afirma que presidente cometeu crimes contra a humanidade em relação aos povos originários e à população de Manaus na crise de oxigênio hospitalar, além de crimes comuns e de responsabilidade

Alan Santos/PR
Alan Santos/PR
Parecer de juristas também acusa Bolsonaro ser "charlatanismo" ao estimular uso de medicamentos sem eficácia

São Paulo – Um grupo de juristas apresentou nesta terça-feira (14) um parecer à CPI da Covid apontando sete crimes que teriam sido cometidos pelo presidente Jair Bolsonaro na condução da pandemia. O documento é coordenado pelo ex-ministro da Justiça Miguel Reale Júnior e deve ajudar a embasar o relatório final do senador Renan Calheiros (MDB-AL).

De acordo com o parecer, Bolsonaro cometeu crimes de responsabilidade, crimes comuns e crime contra a humanidade, incluindo delitos como infração de medida sanitária, charlatanismo e incitação ao crime. Os juristas apontam “omissão consciente” e “inação” não só do presidente, mas também do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello e do ex-secretário executivo da pasta Élcio Franco.

Os especialistas dizem ainda que Bolsonaro e membros do governo são “coautores” do “desastre humanitário” causado durante a pandemia. “Quanto aos crimes contra a saúde pública, no sentido de que há farto material para o oferecimento de denúncia contra o Presidente e os demais agentes apontados pelos crimes comuns narrados, material que traz prova da materialidade dos delitos e indícios contundentes de suas autorias”, afirmam no documento.

O estudo foi realizado a pedido do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), membro da CPI da Covid. Em outro trecho, os juristas destacam a falta de coragem na imposição de medidas impopulares, mas necessárias no combate à pandemia. “A omissão consciente, assentindo no resultado morte derivado da inação, conduzem à evidente responsabilização do desastre humanitário aos condutores da política de saúde no país”, acrescenta o parecer.

Crimes de Bolsonaro

O parecer dos juristas também acusa Bolsonaro de cometer o crime de charlatanismo ao recomendar o uso de medicamentos sem eficácia para combater o novo coronavírus. Durante a maior parte da pandemia, o presidente endossou o uso do ineficaz “tratamento precoce”, com cloroquina e ivermectina.

“Restou provado que o estímulo ao uso de cloroquina e outros medicamentos não comprovados cientificamente foi um braço da política de estímulo à propagação da doença. Houve, portanto, um contexto de prática dessas condutas pelo Presidente da República e outras autoridades, bem como uma reiteração de manifestações”, denunciam os juristas.

Além de Reale Junior, assinam o documento a juíza federal Sylvia Steiner, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, a professora da Universidade de São Paulo (USP) Helena Regina Lobo da Costa e o advogado Alexandre Wunderlich.

O documento diz também que houve um atraso deliberado na aquisição de vacinas “por razões ideológicas” e por “razões ligadas ao tráfico de influências e à corrupção”. Os especialistas afirmam que essa prática do governo Bolsonaro levou teve consequência direta e significativa no número de mortes pela doença.

Crime contra indígenas e a população de Manaus

Em outro trecho, o estudo destaca os danos causados à população indígena por parte de uma “política deliberada de desassistência” do governo federal. Os juristas acrescentam que, apesar de não ser tema da CPI da Covid, há uma “política de exterminação dessas populações originárias” e, durante a pandemia, “um ataque dirigido contra a população indígena, através de uma política de Estado de adoção de medidas concretas e de omissões deliberadas que resultaram no número de contaminações e de mortos entre as populações indígenas proporcionalmente superior ao que atingiu as populações urbanas”.

Em relação à condução da epidemia no território do Amazonas, e especialmente na cidade de Manaus, o parecer também aponta que a população teria sido vítima de crimes contra a humanidade. “Há elementos probatórios razoáveis para acreditar que houve, por parte do Governo Federal, em especial por parte do Presidente da República e do Ministro da Saúde, bem como de seus subordinados, entre eles Dra. Mayra Correia Pinheiro, um ataque dirigido contra a população civil, através de uma política de Estado de adoção de medidas concretas e de omissões deliberadas que resultaram no número de contaminações e de mortes, inclusive por falta de oxigênio, número esse desproporcional à média nacional e evitável, tivessem sido tomadas as medidas adequadas para
enfrentamento da crise naquele Estado.”

Os crimes de responsabilidade apontados no documento, segundo a Constituição Federal, podem resultar na abertura de processo de impeachment do presidente da República. Os juristas finalizam o documento apontando que a gestão Bolsonaro foi deliberadamente irresponsável e infringiu a lei penal, “devendo haver pronta responsabilização”. “Não se trata, apenas, de descumprimento de deveres por parte dos gestores públicos, mas, também, da recusa constante do conhecimento científico produzido ao longo do enfrentamento da pandemia do covid-19”, diz trecho final do parecer.

Leia o documento na íntegra:


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