efeitos da militarização

Para CPI da Covid, Helcio Bruno demonstrou ‘elo obscuro’ entre corrupção e fake news

Senadores exploraram ligações entre militares da reserva que atuavam na intermediação de empresas junto ao ministério por vacinas contra a covid

Leopoldo Silva/Agência Senado
Leopoldo Silva/Agência Senado
“Não se iluda, coronel Helcio, o senhor pode até esconder quem banca o instituto, mas vamos descobrir”, dise Aziz ao depoente do dia na CPI da Covid, que preside o IFB, de extrema direita

São Paulo – No depoimento à CPI da Covid nesta terça-feira (10), o coronel Helcio Bruno de Almeida estava protegido por um habeas corpus concedido pela ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia . Mas o presidente da organização de extrema direita Instituto Força Brasil (IFB) foi confrontado pelos senadores com informações retiradas do site de sua própria organização, redes sociais, fotos e documentos que mostram não só sua proximidade com o governo federal e o presidente Jair Bolsonaro. Os senadores também identificaram o ativismo negacionista e a campanha “criminosa” contra medidas de combate à pandemia pelo IFB. A oitiva foi uma significativa coincidência por ter ouvido um coronel no dia do desfile militar promovido por Bolsonaro em Brasília.

Com documento em mãos, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da comissão, elencou uma série de encontros do depoente com o presidente, o vice-presidente da República, Hamilton Mourão, o ministro da Secretaria Geral da Presidência, Luiz Eduardo Ramos, e o ex-secretário executivo do Ministério da Saúde Elcio Franco. Uma foto exibida pelo senador mostra uma visita da turma de 1976 da Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) a Bolsonaro em 2019, para “cumprimentar o presidente e apresentar algumas intenções”, nas palavras de Helcio.

Randolfe mostrou postagens em redes sociais de campanha do próprio depoente contra o STF e ministros, entre os quais Cármen Lúcia (confira abaixo). Num dos posts, um “cartaz” pede a presença de ativistas em manifestações de 18 de julho deste ano com os dizeres: “STF – principal pilar da corrupção – se eles caírem o resto cai tudo”. A imagem mostra os ministros Luís Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski e a própria Cármen. “Ainda bem que ela não caiu, porque possibilitou que o senhor utilizasse o silêncio”, ironizou Randolfe.

Ligações

Alessandro Vieira (Cidadania-SE) explorou uma série de “ligações obscuras” de Helcio Bruno com os irmãos e coronéis Claudio Barroso Magno e Aristomendes Barroso Magno, ex-sócio de Hélcio. Segundo o senador, o depoente teve reunião com Élcio Franco para tratar de vacinas. O ex-secretário executivo da Saúde sob Eduardo Pazuello foi “mentor” de Hélcio Bruno na carreira  militar. De acordo com Vieira, os militares da reserva mencionados atuavam na intermediação de empresas junto ao ministério.

Uma delas, a CTU Security, “na esfera de atuação dos irmãos Barroso”, teve envolvimento em contratação de R$ 40 milhões em equipamentos de segurança de policiais assinada em 2018 pelo general Walter Braga Netto, então interventor federal na segurança pública do Rio de Janeiro e hoje ministro da Defesa de Bolsonaro. O contrato foi posteriormente cancelado. A CTU Security “tem possível envolvimento com o assassinato do presidente do Haiti” (Jovenel Moise), lembrou o senador por Sergipe.

Vieira quis saber então “como funciona o mecanismo de ida para reserva e “a entrada imediata” na consultoria de empresas que “contratam com as Forças Armadas ou o governo brasileiro”. Hélcio Bruno repetiu a frase exaustivamente proferida de “seguir a orientação” dos advogados e não responder. “É uma boa orientação para quem não pode se explicar. Tem toda razão e direito de fazê-lo”, respondeu o parlamentar. Ele lembrou ainda que o depoente é “referido em todos os diálogos de (Luiz Paulo) Dominguetti como responsável por fazer a interface com esse grupo de estelionatários” na negociação de vacinas da empresa Davati que nunca existiram.

Fake news e discurso de ódio

A inquirição de Randolfe sobre as fake news e campanhas negacionistas da organização presidida por Helcio Bruno foi contundente. Ele mostrou um vídeo em que o empresário Otávio Fakhouri (vice do IFB) afirma a uma interlocutora ser patrocinador da Awake Giants Brasil e d’A Verdade dos Fatos, perfis acusados de divulgação em massa de fake news e discurso de ódio. A Awake Giants Brasil é apoiada no Twitter por “perfis com alto grau de automação” (robôs), segundo matéria de O Globo.

O Instituto Força Brasil é divulgador de campanhas contra vacinas, uso de máscaras e uma série de propagandas negacionistas. Por exemplo, é de lá uma “matéria jornalística” segundo a qual “a maioria (das pessoas) é imune ao vírus da covid”. A informação estava no ar no momento do depoimento, o que deixou de ser verdade em seguida. “Presidente, o site acaba de sair do ar”, avisou a senadora Soraya Thronicke (PSL-MS) a Randolfe, que presidia a mesa. “Quantos dos 563 mil foram levados à morte? O senhor não só é apoiador deste governo, o senhor frequenta o gabinete do presidente da República, está o tempo todo junto dos personagens desse governo”, afirmou Randolfe dirigindo-se a Hélcio Bruno e Bolsonaro.

Renan Calheiros (MDB-AL), relator da CPI da Covid, interrompeu para apontar as intenções do coronel expressas nas redes sociais. “Em plena pandemia, o depoente atacava o SUS, a única saída de milhões de brasileiros. Isso não pode ficar impune.” O presidente da CPI da Covid, senador Omar Aziz (PSD-AM) – que foi chamado de “palhaço’ em uma postagem do IFB – dirigiu-se ao depoente: “não se iluda, coronel Helcio, o senhor pode até esconder quem está bancando o instituto, mas vamos descobrir”. Aziz informou que a CPI solicitou a quebra dos sigilos fiscal e bancário do militar e disse não acreditar que o STF negue tal pedido para “investigar esse crime contra a nação brasileira”.

Próximos depoimentos

Em coletiva após a sessão, a senadora Simone Tebet (MDB-MS) comentou os próximos depoimentos à CPI da Covid. Nesta quarta-feira (11), Jailton Batista, representante e administrador de rotinas da farmacêutica Vitamedic, empresa que vende ivermectina, droga receitada para “tratamento precoce” da covid pelo bolsonarismo. Segundo a Agência Senado, a venda do medicamento movimentou R$ 409 milhões em 2020, o que representa aumento de 829% em relação a 2019, antes da pandemia. Foram 52,3 milhões de caixas de ivermectina vendidas ao mercado.

Para a senadora, o depoimento tentará investigar “a ideologia de ganhar dinheiro fácil e os interesses privados de grupos em ganhar dinheiro à custa da morte de milhares de brasileiros”. Na quinta, será ouvido o deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), depoimento “prematuro”, segundo Simone, que deveria ser realizado após as oitivas do dono da Precisa Medicamentos, envolvida no “rolo” da Covaxin, e o advogado da empresa, ambos na semana que vem.

Confira posts de Hélcio Bruno contra ministros do STF

https://twitter.com/VARdaCPI/status/1415694452136493059


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