Governo usa foto de homem armado em ‘homenagem’ aos agricultores
De mau gosto, a homenagem da Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência aos agricultores causou indignação nas redes sociais. Jagunços estão ligados à violência no campo, e não à produção de alimentos
Publicado 28/07/2021 - 16h38
São Paulo – A Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República (Secom) causou indignação ao usar a foto de um homem armado em material de homenagem ao Dia do Agricultor, comemorado nesta quarta-feira (28). “Hoje homenageamos os agricultores brasileiros, trabalhadores que não pararam durante a crise da Covid-19 e garantiram a comida na mesa de milhões de pessoas no Brasil e ao redor do mundo”, diz uma das mensagens.
“O @Govbr também conseguiu reduzir a invasão de terras e está melhorando a infraestrutura das estradas, o que reduz os custos de transporte dos alimentos. Além disso, o Presidente @jairbolsonaro estendeu a posse de arma do proprietário rural a toda a sua propriedade”, diz outra, reiterando um recado dirigido aos latifundiários, que produzem principalmente soja, milho e algodão, exportados como commodities agrícolas para produção de ração animal, em vez de alimentos.
São os pequenos agricultores, aliás, que levam à mesa dos brasileiros mais da metade dos alimentos consumidos. Esses trabalhadores rurais não têm jagunços a seu serviço, não andam armados e vem perdendo investimentos do governo, especialmente no governo de Jair Bolsonaro.
A importância deste setor para a segurança alimentar do povo brasileiro foi lembrada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em sua homenagem pelo Dia do Agricultor. “Se a roça não roça, a cidade não almoça. Se a roça não planta, a cidade não janta. Feliz Dia do Agricultor!”
Se a roça não roça, a cidade não almoça. Se a roça não planta, a cidade não janta. Feliz Dia do Agricultor! #equipeLula
— Lula (@LulaOficial) July 28, 2021
Foto: Ricardo Stuckert pic.twitter.com/5TS4cqHyfh
O governo Bolsonaro é insano e fascista. Tiveram o desplante de retratar um camponês no dia do agricultor como um jagunço armado. Não entendem nada da vida no campo. Santa paciência!
— João Pedro Stédile (@stedile_mst) July 28, 2021
Segurança alimentar?Com + d 116 milhões d brasileiros sem ter comida suficiente ou passando fome e com 321 agrotóxicos q foram liberados só em 2020?Fora os q são usados e os q foram liberados esse ano.Ñ vejo segurança alimentar no país nem ele sendo potência mundial nesse quesito
— Tatiane Araújo (@TatiAraujoos) July 28, 2021
Violência contra agricultores
“A tentativa de vincular o ser social e histórico das camponesas e dos camponeses à figura de um jagunço é um ato criminoso. O modo de vida campesino, ao contrário do submundo jagunço, é voltado para o cultivo da vida, seja da vida da terra, das matas e das pessoas”, disse à RBA Carlos Lima, da coordenação nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT).
Dados de 2020, divulgados em maio pela CPT mostram outro viés da violência no campo que o governo de Bolsonaro e seus apoiadores escondem. Desde 1985, em nenhum momento da história o número de conflitos por terra foi tão alto: 1.576, envolvendo 171.625 famílias. Segundo relatório da pastoral, os dados são ainda mais assustadores quando relativos aos povos indígenas: 656 ocorrências (41,6% do total), com 96.931 famílias (56,5%).
O relatório mostra ainda aumento considerável no número de ocorrências da violência no campo, de maneira especial, nos últimos dois anos. Em 2019 apresentava um aumento de 26% em relação a 2018. Passou de 1.000 ocorrências para 1.260). Em 2020, esse aumento foi 25,1% ainda maior, alcançando 1.576 ocorrências, totalizando 21.801 nesses 35 anos.
Foto da internet
A foto usada pela Secom para a “homenagem” foi adquirida em um dos bancos de imagens da internet. No portal iStock, a imagem foi encontrada pela reportagem da revista Fórum, ao custo de R$ 45, usando as palavras chaves: “homem”, “arma”, “violência” e “campo”. Em outro portal, o Getty Images, a imagem é mais cara: R$ 3 mil.