Fogo no parquinho

A aprovação do Fundo Eleitoral como estratégia de paralisar a CPI

Congresso só poderia entrar em recesso após aprovar LDO, e junto o Fundo Eleitoral. Bolsonarismo fez cálculo político, afirma analista do Diap

Reprodução/Youtube
Reprodução/Youtube
"Ele deveria é dizer que vai vetar, mas vai tentar arrumar alguém para responsabilizar", diz vice da Câmara

São Paulo – O presidente da República, Jair Bolsonaro, seus filhos no Congresso Nacional e parlamentares aliados se esforçam para convencer seu eleitorado de que foram enganados por uma manobra e que votariam contra o Fundo Eleitoral que deve chegar a R$ 5,7 bilhões em 2022. Mas a tentativa dos parlamentares bolsonaristas de justificar seus votos na semana passada não é barbeiragem nem amadorismo. Foi cálculo político. Pela Constituição, o Congresso só pode entrar em recesso após aprovar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), em cujo projeto foi colocado o Fundo Eleitoral encorpado, o chamado “fundão”. Ou seja, se o texto não fosse aprovado, o parlamento não teria recesso. Consequentemente, a CPI da Covid não seria paralisada por 17 dias (as reuniões serão retomadas em 3 de agosto).

O fato é que Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2022 foi aprovada, com o Fundo Eleitoral junto, por 278 votos a favor e 145 contrários na Câmara. PSL, PSDB, DEM, PSD e demais partidos do Centrão à direita votaram a favor. Os principais partidos do centro à esquerda – PT, Psol, PCdoB, PDT, PSB, Rede votaram majoritariamente contra. No Senado, o placar foi de 40 votos a favor e 33 votos contrários.

“A CPI continuaria funcionando e o bombardeio ao governo continuaria. Fizeram um cálculo político para tirar a CPI de cena no momento, responsabilizando o vice-presidente da Câmara (deputado Marcelo Ramos, PL-AM)”, diz Antônio Augusto de Queiroz, o Toninho, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). Ramos estava presidindo a sessão que aprovou a LDO.

Manobra

A base do governo, incluindo o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), votou a favor do “fundão” e depois se fez de desentendida, dizendo que foi vítima de uma manobra. Segundo eles, após a aprovação do texto base, eles votariam em um destaque do partido Novo que retirava a previsão do fundo eleitoral. Como o destaque foi apreciado por votação simbólica (o voto dos deputados não seria conhecido) por acordo entre as lideranças, o fundão ficou no texto.

“O PSL, o bolsonarismo, preferiram se fazer de bobos, dizer que o vice da Câmara manobrou. Mas isso para evitar que a CPI continuasse funcionando”, diz Toninho. As lideranças sabiam que o destaque do Novo tinha acordo para ser votado simbolicamente. A constatação evidente é que a maioria dos parlamentares queria o fundo, do Centrão aos bolsonaristas. “Fizeram um acordo prévio e depois disseram que foi responsabilidade do Marcelo Ramos”, interpreta o analista.

Para tentar contornar o desgaste e muitas críticas dos seguidores nas redes sociais, Carla Zambelli (PSL-SP), Bia Kicis (PSL-DF) e a base bolsonarista justificaram o voto “sim” no texto base dizendo que o país não poderia ficar sem orçamento. Seria “uma irresponsabilidade incrível, como base do governo”, disse Zambelli, por exemplo.

“Eu votei na LDO inteira, que trata de saúde, segurança, educação e tudo mais”, afirmou Eduardo Bolsonaro no Twitter, ressaltado que ia votar contra o fundão no destaque do Novo. Já o presidente atacou Marcelo Ramos no domingo (18). “O responsável por aprovar isso é o Marcelo Ramos lá do Amazonas. Ele que fez isso tudo”, atacou Bolsonaro.

Bola dividida: Ramos contra ataca

Para o analisa do Diap, Bolsonaro vai vetar o texto aprovado em relação ao fundo partidário e negociar o encaminhamento de uma alternativa. De quebra, com isso, ele pretende capitalizar os dividendos políticos e assim tentar reverter o claro desgaste junto ao seu eleitorado. O filho Eduardo já afirmou que “a matéria agora vai para a Presidência da República, que pode vetar esse dispositivo”.

Mas o constrangimento com o Centrão também é uma consequência da estratégia, e Bolsonaro terá de contornar isso, porque Marcelo Ramos é um líder importante do bloco informal. Portanto, como acredita Toninho, é uma “bola dividida entre eles”. O vice da Câmara reagiu à tentativa bolsonarista de imputar a culpa do impopular fundão a ele.

“Se depender do Bolsonaro, ele não é responsável por nenhuma das mais de 530 mil pessoas mortas na pandemia, nem por 15 milhões de desempregados, nem por 19 milhões de brasileiros com fome e nem mesmo pela escandalosa tentativa de roubo na compra de vacinas”, disparou o deputado no Twitter. “Ele deveria é dizer que vai vetar, mas vai tentar arrumar alguém para responsabilizar também, porque é típico dele e dos filhos correr das suas responsabilidades e obrigações”, acrescentou.