Reino em queda

Denúncias contra a Universal na África do Sul são travas para nomeação de Crivella embaixador

Indicação de Bolsonaro já não era bem vista devido às denúncias contra o sobrinho de Edir Macedo. A tentativa de ter um representante no país para conter movimentos contrários à seita também fica em xeque

Reprodução
Reprodução
Ex-pastores e bispos da igreja encaminharam à Justiça do país acusações de racismo, lavagem de dinheiro e esterilizações forçadas contra a ala de comando da Universal

São Paulo – Poucos meses após perder o comando dos templos da Igreja Universal em Angola, o fundador e líder da organização neopentecostal, Edir Macedo, já enfrenta um novo movimento contrário à direção brasileira da seita na África do Sul. Ex-pastores e bispos locais encaminharam à Justiça do país acusações de racismo, lavagem de dinheiro e esterilizações forçadas contra a ala de comando da Universal. Nas últimas semanas, a revolta dos dissidentes, que teve início neste ano, vem ganhado força nas ruas com a organização de protestos em frente aos templos pelo país. 

De acordo com informações do jornalista Gilberto Nascimento, em reportagem para o The Intercept Brasil, as denúncias já são apuradas pelas Comissão para a Promoção e Proteção dos Direitos das Comunidades Culturais, Religiosas e Linguísticas, órgão do governo. Entre fevereiro e março, religiosos e familiares de pastores prestaram depoimento confirmando as acusações. 

A queda em Angola

Ao jornalista, o bispo angolano Felner Batalha, porta-voz da Reforma, – como é chamado o movimento contra a ala brasileira – afirmou que essa onda de denúncias deve se repetir em muitos outros países. A possibilidade é que o mesmo roteiro angolano seja remontado na África do Sul. No final de 2019, um grupo de 330 bispos e pastores de Angola decidiu romper com a direção de Edir Macedo. À época, denúncias semelhantes às do grupo sul-africano também foram apresentadas.

O movimento ganhou força e, em um junho do ano passado, assumiu o comando dos templos da Universal. Pouco depois, o governo angolano reconheceu as lideranças locais como os novos líderes. Os pastores brasileiros acabaram expulsos, a TV Record teve as atividades suspensas e dirigentes foram acusados formalmente pela Justiça de lavagem de dinheiro e associação criminosa. O que se repete agora na África do Sul. 

Os planos de Bolsonaro e Crivella

O país, inclusive, é para onde o presidente Jair Bolsonaro quer indicar o ex-prefeito do Rio Marcelo Crivella para o cargo de embaixador. Candidato derrotado nas eleições municipais em 2020, Crivella é também sobrinho de Edir Macedo e bispo da Universal.

A jornalista Marilu Cabañas conversou na edição desta sexta-feira (18) do Jornal Brasil Atual com Gilberto Nascimento. Para o repórter, está evidente que a escolha de Crivella seria por interesse da organização. A direção da Universal espera ter um representante na África do Sul para conter possíveis movimentos contrários à seita no país. Mas, segundo ele, esse objetivo não será tão fácil. 

Colaborador da Rádio Brasil Atual, Gilberto é também autor do livro O Reino – a história de Edir Macedo e uma radiografia da Igreja Universal (Companhia das Letras, 2019) e afirma ter informações de que “a indicação do bispo Marcelo Crivella como embaixador do governo Bolsonaro deve acirrar ainda mais a discussão no país”. “A imprensa local já tem publicado reportagens também e pode ser que esse movimento acabe ganhando força como ganhou em Angola”, explica. 

Má-fama

Além disso, a intenção do presidente já causava polêmicas internamente aqui no Brasil. “Crivella chegou a ser preso em dezembro, ficou até fevereiro (nessa condição). A prisão foi revogada, mas o STF (Supremo Tribunal Federal) o impediu de sair do país, o passaporte está apreendido. Conversei com diplomatas que acharam (a indicação) um desrespeito ao Itamaraty. Primeiro, porque não é comum indicar como embaixador pessoas que não são da área da diplomacia. Isso até já ocorreu, mas com personalidades conhecidas, de mérito inquestionável. Agora, indicar alguém processado por corrupção é considerado um desrespeito ao Itamaraty e até ao próprio país”, explica Nascimento. 

Para ser nomeado, Crivella ainda terá de ser aceito pelo governo da África do Sul. O que se torna imprevisível com as denúncias contra a Igreja Universal. Os senadores também precisarão legitimar seu nome em sabatina e o Supremo terá de reverter a decisão que hoje o impossibilita de deixar o país. 

Confira a entrevista  

Redação: Clara Assunção