Entreguismo

Privatização da Eletrobras é exemplo de ‘capitalismo de rapina’, diz economista

Para o economista André Roncaglia, o Brasil vai na contramão do mundo ao apostar em usinas térmicas a gás para a produção de energia

Eletrobras Eletrosul
Eletrobras Eletrosul
Privatização da Eletrobras ainda deve resultar em demissões em massa, sem garantias de investimentos ou redução na conta de luz

São Paulo – O Senado aprovou nesta quinta-feira (17) o texto-base do projeto que permite a privatização da Eletrobras. Com mudanças, a proposta contida no projeto de lei de conversão (PLV) 7/2021, proveniente da MP 1.031/2021, volta à Câmara. Os deputados têm até a próxima terça-feira (22) para convalidar a proposta aprovada, antes que o texto perca sua validade. Além da perda do controle acionário pelo Estado, a medida aprovada prevê a contratação de energia subsidiada de termelétricas movidas a gás natural no Norte, Nordeste e Centro-Oeste. A instalação dessas novas usinas, além da rede de gasodutos para garantir suas operações, terá custo estimado de R$ 20 bilhões.

De acordo com o economista André Roncaglia, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a proposta vai contra a tendência mundial de favorecer fontes renováveis de energia. Para ele, trata-se de uma “ação desesperada” da equipe econômica do ministro Paulo Guedes, que tenta “mostrar serviço” para o mercado financeiro, entregando a estatal estratégica ao setor privado.

“É o que os especialistas do setor elétrico vão chamando de capitalismo de rapina”, afirmou Roncaglia, em entrevista ao Jornal Brasil Atual, nesta sexta-feira (18). “É literalmente pegar um ativo que o estado brasileiro vem construindo desde os anos 1960, que já foi amortizado, repassando para as mãos de pessoas que vão explorar isso da pior maneira possível, nos levar em direção a matrizes energéticas mais sujas”, acrescentou.

Ele criticou que mudanças num setor tão estratégico, como a produção de energia, tenham sido feitas a toque de caixa, sem o devido debate com a sociedade. Além do mercado financeiro, beneficiado com a alta das ações da Eletrobras, esse modelo de privatização também vai garantir lucros para as empresas que vão operar as termelétricas.

Tarifas e investimentos

Para o economista, não há qualquer garantia que os subsídios ofertados para a criação desse novo parque termelétrico se reverta em redução na conta de luz. Ao contrário, ele destaca que um estudo da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), realizado em 2017, indica que essa modalidade deve acarretar em reajuste de 15% nas tarifas. De lá para cá, o governo vem se negando a oferecer dados que sustentem a suposta redução no preço da energia aos consumidores.

“Eles argumentam que vai baratear a energia, mas não entregam dados. É preciso lembrar que esse não é um governo comprometido com a realidade, mas com narrativas. Especialistas do setor estão pedindo que eles entreguem seus dados e estimativas. Mas o governo simplesmente não o faz”, ressaltou.

Além disso, segundo ele, esse novo marco regulatório do setor elétrico com a privatização da Eletrobras “tem tudo para criar baixos investimentos”. Ele cita, por exemplo, que o financiamento do Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Cepel) está previsto apenas para os próximos quatro anos. “Depois, acabou. Notem a falta de compromisso do governo com o conhecimento e com a ciência”.

Demissões

Roncaglia afirma que a mudança no controle acionário da Eletrobras vai ocorrer gradativamente. Ainda assim, afirma que o histórico de privatizações no Brasil indica o risco de demissões em massa nas empresas que integram o sistema elétrico. Ele destaca que se trata de uma mão de obra altamente qualificada, composta por técnicos e engenheiros. Nesse sentido, a tendência é que ocorra uma “fuga de cérebros”. “Esses especialistas vão acabar indo para fora. Possivelmente para estatais de outros países”, lamentou.

Assista à entrevista

Redação: Tiago Pereira – Edição: Helder Lima