CPI da Covid

‘Estratégia’ de Bolsonaro ante pandemia tem nome, diz senadora: ‘Assassinato’

No depoimento do ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde Élcio Franco, Simone Tebet cita estudo da USP e diz que há uma estratégia deliberada de disseminação da Covid pela tese de imunidade de rebanho

Edilson Rodrigues e Jefferson Rudy/Agência Senado
Edilson Rodrigues e Jefferson Rudy/Agência Senado
Randolfe lamentou mais um ataque de Bolsonaro às vacinas e Simone Tebet disse a Franco que há estratégia deliberada de disseminar a doença

São Paulo – Na parte final da sessão da CPI da Covid nesta quarta-feira (9), a senadora Simone Tebet (MDB-MS) mencionou documento enviado ao colegiado com trabalho realizado pelo Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário da Universidade de São Paulo (USP). O estudo, com apoio do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), analisou cerca de 3 mil atos normativos de 2020 e 580 deste ano, entre decretos, portarias, leis, PECs e outros. Segundo a senadora, a estratégia de Jair Bolsonaro para enfrentar a pandemia é cercada de atos conscientes e deliberados. “Há confluência entre a consciência dos atos e omissões praticadas e a vontade de praticá-los”, disse. A afirmação foi feita durante o depoimento do ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde Élcio Franco.



“Há coerência entre o que se diz, o que se faz e o que se quer alcançar. Há a hipótese, sim, da existência de uma estratégia federal de disseminação da covid numa tese de imunidade de rebanho. Não por vacina, mas por contágio e contaminação em massa”, disse a parlamentar. “Isso tem outro nome, ao meu ver. Isso é assassinato.” De acordo com Simone, o estudo mostra que a disseminação de “imunidade natural” é feita de diversas formas, como incitar a população a ir às ruas, tomar remédios ineficazes para “voltar à vida normal”, banalizar a morte, atacar a imprensa questionando dados oficiais sobre a dimensão da pandemia.

TCU e fake news

A Polícia Federal deve investigar o caso do documento produzido pelo auditor do Tribunal de Contas da União Alexandre Figueiredo Costa Silva Marques (já afastado) com informações falsas sobre a pandemia de covid. O auditor é ligado à família Bolsonaro. O documento que ele produziu diz que “50% dos óbitos por Covid não foram por Covid”. O objetivo do presidente da República é dizer que há supernotificação de mortes pela covid-19, o que os estados utilizariam para obter mais recursos. A falsa informação circula nas redes sociais com incentivo de Jair Bolsonaro.

Ao encerrar a sessão, o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AM), mencionou mais um “ataque do presidente da República ao povo brasileiro”. “Remédios de tratamento precoce não têm comprovação científica. E eu pergunto: a vacina tem comprovação científica ou está em estado experimental ainda?”, questionou Bolsonaro hoje (9). “Isso quando a gente está desesperado por imunização de brasileiros e só com 11% da população imunizada”, afirmou Randolfe.

Na inquirição de Élcio Franco, o senador Otto Alencar (PSD-BA), como tem feito nas audiências envolvendo autoridades bolsonaristas, questionou o coronel sobre pontos específicos para demonstrar a falta de preparo e conhecimento do ex-secretário-executivo. Perguntou, por exemplo, se Franco sabia qual é o percentual da população brasileira no mundo e qual a relação entre o número de mortos por covid-19 no país em relação ao planeta. Diante da hesitação do depoente, Alencar informou a realidade “perversa” do Brasil, que tem 2,7% da população mundial e 13,5% dos óbitos pela covid no mundo.

Mentira reiterada

O senador baiano também desmentiu a informação mentirosa reiterada por todos os depoentes aliados a Bolsonaro, e repetida por Elcio Franco, segundo a qual o Brasil é hoje o quarto país que mais vacina no mundo. A realidade é que a posição mencionada pelos governistas desconsidera a relação entre o número de vacinados e de habitantes. “Dois meses atrás o Brasil estava no 56° lugar e, hoje, por falta da vacina, passou para 66°, com 10,8% das pessoas vacinadas com a segunda dose”, esclareceu Alencar.

Desde a manhã, Élcio Franco deturpou informações e insistiu que “não houve em momento nenhum o cancelamento das tratativas” para a compra da CoronaVac, mesmo diante de evidências  cabais, como o vídeo em que Bolsonaro anuncia que não compraria a “vacina da China”, desautorizando o então ministro Eduardo Pazuello, que, por sua vez, acatou o chefe com o famoso “um manda, outro obedece”.

“Negam até que negam”

“O ministério é integrado por pessoas negacionistas negando tudo: negam doenças, vacinas, evidências, fatos, vídeos, áudios, negam ordens, negam que receberam ordens, negam até que negam. Ao cabo do nosso trabalho, serão responsabilizados pelo que fizeram e pelo que não fizeram no combate à pandemia”, afirmou o senador Rogério Carvalho (PT-SE).

O ex-secretário insistia em dizer que o governo evitou comprar vacina da Pfizer porque a Anvisa ainda não havia autorizado. Carvalho então lembrou que Canadá, Estados Unidos, Israel, Reino Unido e China “apostaram no cemitério de vacinas”, termo que Franco usou, talvez como ato falho, para se referir à terceira fase dos testes clínicos dos imunizantes. Ao contrário do governo brasileiro, o dos EUA assinou um contrato bilionário com a Pfizer em julho de 2020, lembrou o petista.

Confira os próximos depoimentos da CPI

  • Quinta-feira (10) – Wilson Lima, governador do Amazonas
  • Sexta-feira (11) – Claudio Maierovitch, ex-presidente da Anvisa e da Fiocruz, e Natalia Pasternak, microbióloga e pesquisadora da USP
  • Terça-feira (15) – Marcellus Campélio, secretário de Saúde do Amazonas
  • Quarta-feira (16) – Wilson Witzel, ex-governador do Rio de Janeiro
  • Quinta-feira (17) – Carlos Wizard, empresário apontado como membro do gabinete paralelo
  • Sexta-feira (18) – Paulo Baraúna, representante da White Martins, fornecedora de oxigênio hospitalar


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