Tortura e assassinato

Ex-agente do Dops, ‘Carlinhos Metralha’ é denunciado pelo MPF

Investigador trabalhou com o delegado Fleury, que considera herói. Segundo a denúncia, ele participou da tortura e morte de um militante em 1971

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Em 2014, 'Carlinhos Metralha' foi a lançamento de livro sobre o DOI-Codi, escrito pelo jornalista Marcelo Godoy, e ainda afirmou ser amigo de Ustra

São Paulo – Carlos Alberto Augusto, 77 anos completados justamente em 1º de abril, aniversário do golpe de 1964, voltou a ser denunciado pelo Ministério Público Federal (MPF) devido a crimes cometidos durante a ditadura. Ex-investigador do Dops de São Paulo, ele carrega o apelido de “Carlinhos Metralha” e é um dos 377 citados no relatório final da Comissão Nacional da Verdade pela prática de tortura e assassinatos naquele período.

Na denúncia, assinada pelo procurador Andrey Borges de Mendonça, o MPF lembra que ele integrava a equipe do delegado Sérgio Paranhos Fleury. Assim, “participou das intensas sessões de tortura que levaram à morte o militante de esquerda Devanir José de Carvalho em abril de 1971”. A ditadura diria depois que Devanir foi morto em “confronto” com policiais, versão recorrente usada pela repressão. Segundo o Ministério Público, “documentos e testemunhas atestam que ele foi levado com vida ao Deops, onde passou por agressões durante três dias”.

Vítima de emboscada

Devanir, lembra ainda o MPF, foi um fundadores do Movimento Revolucionário Tiradentes (MRT). Participou do sequestro do cônsul japonês Nobuo Okushi, em março de 1970. Ele foi vítima de emboscada em 5 de abril de 1971, “auando recebeu uma rajada de metralhadora nas pernas ao chegar a uma casa que integrantes do MRT utilizavam para se encontrar clandestinamente na Barra Funda, zona oeste de São Paulo”.

Antiga sede do Dops abriga agora o Memorial da Resistência (Reprodução)

Levado ao Dops, mesmo torturado, Devanir não passou informações que fossem consideradas úteis pelos torturadores, que decidiram matá-lo, simulando um confronto. “O laudo necroscópico de Devanir procurou sustentar a versão oficial de que ele havia morrido em virtude de um suposto confronto com os policiais no momento de sua captura, no dia 5. O documento, porém, não apresenta a trajetória das balas que teriam causado o óbito e omite marcas evidentes da tortura.”

Vala comum

O Ministério Público observa que registros “dos próprios órgãos de repressão” desmentem a versão oficial. O corpo do militante foi enterrado em vala comum no cemitério da Vila Formosa, zona leste de São Paulo. “A família nunca recuperou os restos mortais.”

“Carlinhos Metralha” também foi denunciado por participar do sequestro do ex-fuzileiro Edgar de Aquino Duarte, também em 1971. Há uma ação penal aguardando julgamento.

Em 2014, o agente foi à Assembleia Legislativa de São Paulo, durante lançamento de livro do jornalista Marcelo Godoy sobre o DOI-Codi (A Casa da Vovó). Afirmou que Fleury foi um “herói” e disse que compraria um exemplar para Carlos Alberto Brilhante Ustra, que morreu em 2015.

“O MPF destaca que a morte de Devanir ocorreu em um contexto de ataque sistemático e generalizado do Estado brasileiro contra a população civil”, afirmam os procuradores. Por isso, acrescentam, “constitui um crime contra a humanidade, para o qual não cabe anistia nem prescrição”.


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