Governo negação

CPI da Covid: Mayra Pinheiro afirma que ignorou órgãos técnicos e se contradiz sobre cloroquina

Ao ser questionada sobre qual medicamento é comprovadamente eficaz contra doenças virais, médica respondeu: “A vacina”

Jefferson Rudy/Agência Senado
Jefferson Rudy/Agência Senado
Mayra Pinheiro falou que 'há um estudo de 2005 que comprova o efeito antiviral da cloroquina'. Porém, os testes nunca passaram da primeira fase

São Paulo – A secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, disse à CPI da Covid, nesta terça-feira (25), que ignorou recomendações contrárias de órgãos e entidades científicas para indicar o uso de hidroxicloroquina aos pacientes de covid-19. A médica pediatra é conhecida como “Capitã Cloroquina” por defender o uso de medicamentos comprovadamente sem eficácia para tratar a infecção causada pelo novo coronavírus.

A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) lembrou que a Anvisa, o Conselho Nacional de Saúde, a Sociedade Brasileira de Pediatria e a a Sociedade Brasileira de Infectologistas recomendaram a não utilização da cloroquina no tratamento da covid-19, e questionou o motivo de Mayra não ter seguido as notas técnicas.

A secretária disse que buscou seguir apenas as recomendações favoráveis aos medicamentos, com base no Conselho Federal de Medicina (CFM – que não é formado por cientistas e pesquisadores). “A nossa referência é o CFM e os médicos, que nós escolhemos, dão o parecer. O Ministério da Saúde não está subordinado às entidades científicas e vamos levar em consideração os trabalhos que comprovarem os fatos com metodologias que nós usamos”, alegou.

A senadora rebateu os argumentos da bolsonarista e afirmou que suas decisões ignoram os laudos técnicos, olhando apenas para o viés político que a interessa. “Autonomia médica tem limite. Suas orientações para uso de medicamentos que são ineficazes, você apresenta um desserviço ao Brasil, no momento tão grave da pandemia”, criticou a parlamentar.

Contradição de Mayra

Mayra Pinheiro afirmou à CPI da Covid que a cloroquina é um medicamento “antiviral”, mas foi corrigida pelo senador Otto Alencar, que também é médico. “É um remédio antiprotozoário”. Alencar lembrou que não existe no mundo medicação que possa evitar a contaminação por vírus. Além disso, ele rebateu as alegações da secretária sobre a existência de pesquisas sobre a eficácia da cloroquina. “Não tem como afirmar isso sem os estudos da parte pré-clínica, que ainda envolvem outras quatro fases. Não foram feitos todos esses testes para atestar a cloroquina contra covid-19”, acrescentou.

Ao questionar em seguida sobre o uso de medicamentos para doenças virais pelo Ministério da Saúde, a secretária do Ministério da Saúde caiu em contradição. Ele perguntou qual medicamento é usado para evitar sarampo, paralisia infantil ou H1N1. “Só a vacina”, respondeu Mayra Pinheiro. “Então, como inventaram que cloroquina pode evitar a contaminação do coronavírus? É um absurdo”, respondeu Otto Alencar.

Estudo falso

O senador do PSD continuou a crítica à aplicação do chamado tratamento precoce como política de saúde. Ele reafirmou que não há “estudos sérios” que comprovem que a cloroquina é um antiviral, o que foi comprovado com a chegada da pandemia. Porém, para defender seu ponto de vista na CPI da Covid, Mayra Pinheiro falou que “há um estudo de 2005 que comprova o efeito antiviral da droga”. Entretanto, a pesquisa citada por ela foi feita apenas com células em laboratório, primeiro passo da testagem de medicamentos, longe ainda dos testes em humanos.

O biólogo e cientista Átila Iamarino foi às redes sociais para criticar a falta de embasamento de Mayra. “É como se ela defendesse que milhares de pessoas juram de pés juntos que tratamento precoce funciona. Sem apontar um resultado concreto”, tuitou.

Por fim, Otto disse ainda que 95% dos casos de covid-19 se manifestam por sintomas leves e que defensores se apropriam disso para afirmar a eficácia da cloroquina. “Minha discordância é científica, não é política. Não existe droga contra o coronavírus. 95% das pessoas melhoram ou ficam assintomáticas. Aí dizem que foi a cloroquina. Isso não é honesto”, finalizou.

Sem aparo aos profissionais

Por sua vez, o senador Humberto Costa (PT-PE) tomou a palavra e questionou Mayra Pinheiro sobre a falta de políticas de governo para proteger os profissionais da saúde da linha de frente. Primeiro, o petista perguntou à médica quantos profissionais da saúde já morreram no combate à pandemia. Ela chutou “mais de 300”, mas foi corrigida: até março de deste ano, morreram 1.292 trabalhadores do setor, “sendo 622 médicos, 200 enfermeiros e 470 auxiliares técnicos de enfermagens”.

Em seguida, Costa mencionou pesquisa feita com médicos que apontava a falta de equipamentos de proteção e sensação de insegurança para o trabalho em todas as áreas da saúde. “70% dos profissionais não tiveram treinamento para enfrentar a covid-19 e ainda foi apresentada uma ação na Comissão Interamericana de Direitos Humanos para denunciar o abandono do governo aos profissionais”, acrescentou o senador.

Mayra tentou rebater, afirmando que a pasta criou 25 cursos de capacitação no combate à pandemia e estabeleceu parcerias com universidades. Porém, o senador respondeu que “esses cursos não fazem nem cócegas nas necessidades que os profissionais têm. Os países pobres que controlaram a pandemia usaram a atenção básica. O que era da sua alçada, não fez. A senhora se desviou do que seria sua função: a de garantir que os profissionais de saúde pudessem fazer o trabalho adequado, mas assumiu a posição de defensora de um medicamento sem eficiência”, finalizou.


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