Machismo na Assembleia

Autor da pena que poupa Fernando Cury de cassação por assédio silencia Isa Penna. ‘Estou te ensinando’

Ao assumir presidência temporária da sessão que analisa afastamento do deputado por quatro meses, Wellington Moura (Republicanos) interrompeu por duas vezes Isa Penna no momento em que a parlamentar formulava uma questão de ordem

Reprodução
Reprodução
Depuada Bebel (PT) protestou, chamando a atitude de Wellington Moura de "machista"

São Paulo – Durante sessão plenária virtual desta quarta-feira (31) da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), que analisa o projeto de resolução pela perda temporária de mandato do deputado Fernando Cury (Cidadania) por assédio sexual, o deputado Wellington Moura (Republicanos) interrompeu por duas vezes a vítima, a também deputada Isa Penna (Psol), no momento em que ela formulava questões de ordem.

Em sua primeira fala, a parlamentar tentava protestar contra a presença de Moura na Mesa Diretora. Isso porque ele é autor do voto em separado que atenuou a punição inicialmente prevista no Conselho de Ética da Casa. Articulada por aliados de Cury, a proposta derrubou a punição maior defendida pelo relator do caso, o deputado Emídio de Souza (PT), que pedia o afastamento por seis meses do assediador, sem remuneração. 

Apesar de defensor da cassação como pena mais justa, Emídio optou pela suspensão temporária. Segundo o relator, este seria o entendimento dos membros do conselho que, em sua maioria, não aprovariam a anulação do mandato. O deputado do Republicanos, no entanto, passou por cima do acordo e apresentou a pena que alivia para o parlamentar do Cidadania. A alegação de Moura é que a medida visa garantir a manutenção do gabinete de Cury e impede que o suplente fosse convocado. 

Interrupções e machismo

Ao começar sua fala, Moura rapidamente cortou o microfone de Isa Penna, alegando que ela não estaria fazendo uma questão. Mais tarde, quando a deputada pedia que sua emenda pela cassação e o texto originalmente proposto pelo colegiado fossem discutidos, e a votação da punição adiada, o presidente da Alesp, Carlão Pignatari (PSDB) pediu que novamente o microfone da parlamentar fosse silenciado. 

Por volta das 14h30, Isa Penna teve fala autorizada. Mas, ao tentar questionar se era correto a Mesa Diretora ser presidida temporariamente por Moura, a deputada foi atravessada por ele, sob o argumento de era preciso formular uma questão. Em seguida, ao declarar “peço aos deputados”, o deputado do Republicanos a interrompeu novamente. “A questão de ordem é dirigida ao presidente, não aos deputados”, afirmava.

Em resposta, a parlamentar do Psol pediu a Moura que se “controlasse”. “Respeite a fala de sua colega”, cobrou. A conexão de Isa Penna acabou caindo. E, na sequência, a questão de ordem foi repassada à deputada Professora Maria Izabel Noronha, a Bebel (PT), que protestou, chamando a atitude de Wellington Moura de “machista”. 

O voto de Moura

Bebel reforçou o questionamento da deputada do Psol, ressaltando que não parecia correto que o autor do pedido de afastamento por 119 dias estivesse envolvido. 

O deputado do Republicanos, além de ser responsável pela manobra para garantir o funcionamento do gabinete de Fernando Cury, também marcou sua posição no Conselho de Ética, atenuando o crime de importunação sexual como um “excesso” cometido por um deputado “que é família”. 

Ligado à igreja Universal, durante votação no colegiado, no início de março, Moura se dirigiu à deputada Isa Penna, pedindo que ela perdoasse seu assediador. “Acredito que existe o amor de Deus dentro de você para você nesse momento aprender a perdoar”, cobrou o deputado do Republicano. 

Silenciamento

Pelas redes sociais, Isa Penna denunciou que “estão tentando me calar a todo custo”. “É absurdo como qualquer parlamentar consegue falar mais que eu nesta sessão. E todo mundo fala mais do que a forma objetiva da questão de ordem. É bizarro”, descreveu. 

A sessão desta quarta pode confirmar a aplicação da suspensão temporária de mandato de Fernando Cury por quatro meses. Com apoio de parte dos parlamentares, inclusive da direita, Isa Penna vem trabalhando para que o que chama de “férias remuneradas” não seja aplicada. Nesta terça (30), Isa Penna e Emídio de Souza ajuizaram mandado de segurança, com pedido de liminar, para garantir que as emendas aumentando a pena fossem votadas e a sessão de hoje suspensa até a análise. Uma hora e meia após iniciada o debate de hoje, às 11h30, o desembargador Francisco Casconi, do Tribunal de Justiça de São Paulo, negou a liminar

Parlamentares da esquerda à direita, contudo, fazem o enfrentamento para que a pena seja aumentada e um novo acordo costurado pelas lideranças.


Leia também


Últimas notícias