Liberdade de expressão

Patrícia Campos Mello e Felipe Neto rechaçam LSN: ‘Tentativa de silenciamento’

Jornalista e influenciador digital, ao lado do presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, participaram de live pelos 57 anos do golpe de 1964 promovida pela Comissão de Constituição de Justiça do Senado

site do PT
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São Paulo – A rejeição e o repúdio à Lei de Segurança Nacional (LSN) foi ponto em comum nas participações de Patrícia Campos Mello, jornalista da Folha de S.Paulo, do influenciador digital Felipe Neto e do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, em live organizada pela Comissão de Constituição de Justiça do Senado nesta quarta-feira (31), como parte das atividades para marcar os 57 anos do golpe de 1964. Além dos três, participaram Humberto Costa (PT), presidente da comissão, e os também senadores Zenaide Maia (Pros-RN) e Fabiano Contarato (Rede-ES).

A Lei de Segurança Nacional foi criada durante a ditadura civil-militar (1964-1985) e tem forte conteúdo autoritário. Foi usada para enquadrar opositores e tratar divergências políticas como crime. Apesar de ainda em vigor, ela raramente chegou a ser utilizada nos governos que vieram depois dos chamados anos de chumbo. Até a chegada de Bolsonaro.

Patrícia Campos Mello criticou a legislação ao citá-la como uma das formas de censura “das mais incidiosas” usadas nos regimes autoritários atualmente. “Se a gente contar que desde 2019, início do atual governo, foram 85 investigações invocando a Lei de Segurança Nacional, muito mais do que em qualquer outro dos governos democráticos, é uma coisa assustadora o uso de um entulho da ditadura como forma de intimidação”.

Na semana passada, a justiça de São Paulo condenou o presidente Jair Bolsonaro a indenizar Patrícia Campos Mello, por ofensas com declarações machistas e sexistas. Neste caso, porém, não houve invocação por parte do presidente da Lei de Segurança Nacional.

Bolsonaro Genocida

Felipe Neto é um dos alvos mais recentes da LSN. Em 15 de março, ele foi intimado pela Polícia Federal a depor, com base na legislação, por ter chamado o presidente Bolsonaro de genocida. “Há uma tentativa de silenciamento através do uso da Lei de Segurança Nacional contra a população e pessoas públicas com alguma voz. Todo mundo tá vendo isso acontecer”, disse. Ele entende que essa ofensiva serve para inibir as pessoas de criticarem o governo. “Ao me atacar, reverbera e a população fica com medo”, resumiu.

Lei de segurança nacional LSN

O caso de Felipe Neto costuma ser comparado com o do deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ), preso com base na LSN após, divulgar vídeo com vários ataques às instituições democráticas. Entre eles, ofender e ameaçar agredir fisicamente os ministros do STF. “É fundamental que a gente lute pelo fim da Lei de Segurança Nacional. Não tem mais cabimento dentro de uma sociedade democrática. Mas também é importante que a gente ressalte a diferença entre uma crítica política ao presidente da República, seja ela contundente ou não, seja ela com palavras duras ou não, e o que fez e fazem os membros reacionários dessa extrema direita doentia e mau caráter, que defende fechamento do Congresso Nacional, que defende fechamento do STF. E que propõe atirar em opositores, dar porrada em ministros do STF, que propõe o tempo inteiro o ódio”, completou Felipe.

“São coisas tão absurdamente distintas e há um abismo tão grande entre as duas, que é até bizarro que isso seja uma pauta de debate. Você criticar um presidente da República não pode ser enquadrado no mesmo lugar de um sujeito que atira fogos de artifício contra o prédio do STF”, acrescenta. “Precisamos fortalecer, dentro dos meios legislativos, o combate a esse tipo de atitude, tanto no discurso como em ação. Não é através da Lei de Segurança Nacional, aos meus olhos, que essas pessoas deveriam ser enquadradas”, completa.

Não se pode calar a crítica

Felipe Santa Cruz falou em um uso “absolutamente impróprio da Lei de Segurança Nacional. O Supremo precisa dar uma resposta rápida às ações que estão ajuizadas contra o entulho do autoritarismo, que hoje ganhou uma nova forma de atuação. Um dos que mais se utiliza desse instrumento, o senhor ex-ministro da Justiça André Mendonça, que agora foi para a Advocacia Geral da União, pra se prestar a fazer o que o José Levi não estava fazendo”.

O presidente da OAB conclamou também o Congresso, considerado por ele o grande local de resistência aos entulhos autoritários. “Não há outro local. Onde a Lei de Segurança Nacional tem de ser transformada em uma lei de defesa da democracia? É no Congresso Nacional”, disse. “Nenhum presidente da República no período pós Constituição de 88 teve o benefício do silêncio de seus opositores. Nenhum teve essa facilidade de silêncio que o presidente (Bolsonaro) busca. Calar a crítica”, finalizou.

Intimidação e ataque à reputação

A LSN não foi o único tema ligado à ditadura lembrado pelos participantes da live. Patrícia Campos Mello destacou o conceito atual de regime autoritário. “Eles vão corroendo as instituições por dentro, usando instrumentos da democracia para corroer essa mesma democracia”.

Ela falou ainda em formas atuais de intimidação, como a judicial e o assassinato de reputações. “Os jornalistas vêm sendo processados sistematicamente, de uma forma muito mais frequente”. Sobre ataques a reputações, destacou que “no caso das mulheres, quase sempre têm um aspecto misógino, se refere muito à aparência, ou acusa de ‘oferecer sexo’, ou fala da família da mulher. Dificilmente é uma crítica legítima, ao conteúdo”.

“Essa investida contra a liberdade de expressão, contra a liberdade de imprensa é essencial para o tipo de governo que temos hoje no Brasil. Um governo que precisa manipular o debate público pra conseguir se manter no poder”, acrescentou a jornalista.

Por fim, ela citou um ponto positivo dentre o caos que o país está vivendo. “É uma revalorização da função do jornalista pra sociedade civil, e dos ativistas e da academia. Fica cada vez mais patente como a gente precisa de pessoas que estão indo em busca de informação factual. Isso é muito valorizado no momento em que a gente está questionando os fatos básicos da verdade”.

Pra nunca esquecer

Felipe Neto também falou sobre o 31 de março. “Dia muito triste para o Brasil, representa uma tristeza para a nação”, disse.

“É muito importante que a gente mantenha a história viva. Eu nasci em 1988, no mesmo ano que nasceu a Constituição. Ou seja, eu vivi apenas o período pós ditadura militar. E cresci com muito medo da ditadura, porque a minha geração cresceu ouvindo com muita proximidade o que tinha acontecido no passado recente. E quanto mais a História passa, se nós não lembrarmos dela, se não repetirmos o (relato do) que aconteceu, falando e mostrando a realidade, a tendência é que esse medo diminua. Eu vejo hoje muitos jovens comprando um discurso reacionário, de pessoas violentas e autoritárias, como se o período da ditadura militar tivesse sido maravilhoso, e isso muito me preocupa.”

“A cultura essas horas exerce um papel fundamental, de contar a história. Quantos filmes, quantos livros, quantas histórias, quantas músicas foram feitos para que nós não nos esqueçamos da primeira guerra mundial, da segunda guerra mundial, da temeridade do nazismo, do fascismo”, finalizou.

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