Juiz incompetente

Decisão de Fachin sobre Lula foi correta, mas veio tarde, diz advogado criminalista

Lula foi impedido de disputar a eleição de 2018 por decisão de um juiz declarado incompetente. “Uma decisão nula não pode produzir efeitos, muito menos uma prisão”, diz Leonardo Yarochewsky

Ricardo Stuckert
Ricardo Stuckert
Com decisão do ministro do STF, Lula pode disputar eleição de 2022

São Paulo – A anulação de todos os processos – e portanto as condenações –contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva restabelece a confiança no Judiciário e na democracia? “Vamos aguardar. É muito prematura a decisão do Fachin. Esperemos que a decisão prevaleça”, diz o advogado criminalista Leonardo Yarochewsky. Nesta segunda-feira (8), surpreendentemente, o ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu habeas corpus declarando a incompetência do ex-juiz Sergio Moro para (leia a íntegra da decisão aqui). Com a decisão, Lula pode voltar a disputar eleições

“Além da suspeição e da incompetência de Moro, ele possuía uma ‘competência universal’. A seu bel prazer, escolhia aquilo sobre o que se considerava competente ou não. Isso tinha que ser rechaçado”, continua  Yarochewsky. “Foi uma decisão correta, embora tenha vindo tarde. Além de ter sido impedido de disputar a eleição de 2018, Lula foi preso por decisão de um juiz agora declarado incompetente. Uma decisão nula não pode produzir efeitos, muito menos uma prisão.”

PGR vai recorrer

Segundo a assessoria de Comunicação do STF, para a concessão da ordem de habeas corpus de Fachin cair, teria de haver recurso. A Procuradoria-Geral da República, por meio de sua assessoria de imprensa, já informou que vai entrar com recurso. Nesse caso, o julgamento seria feito pelo Plenário da corte. O recurso na PGR ficará sob responsabilidade da subprocuradora-geral Lindôra Maria de Araújo, braço-direito do procurador-geral, Augusto Aras.

Na semana passada, o jurista Celso Antônio Bandeira de Mello e o advogado Wadih Damous lembraram que, apesar das várias notícias-crime contra o presidente Jair Bolsonaro enviadas ao órgão, até agora a PGR não tomou nenhuma atitude contra o atual presidente. O habeas corpus de Fachin abrange os processos do Triplex do Guarujá, do sítio de Atibaia,  da sede do Instituto Lula das doações ao próprio Instituto. Os casos, agora, passam à competência da Justiça Federal do Distrito Federal.

De acordo com o ministro do STF, os casos não têm relação direta com a Petrobras e, por isso, não deveriam ter tramitado na 13ª Vara Federal de Curitiba (PR). Em nota, os advogados de Lula, Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Zanin Martins, afirmaram ter recebido “com serenidade” a decisão do ministro do STF. “A incompetência da Justiça Federal de Curitiba para julgar as indevidas acusações formuladas contra o ex-presidente Lula foi por nós sustentada desde a primeira manifestação escrita que apresentamos nos processos, ainda em 2016”, anotam.

Segundo Fachin, “não há o apontamento de qualquer ato praticado pelo paciente (Lula) no contexto das específicas contratações realizadas pelo Grupo Odebrecht com a Petrobras S/A, o que afasta a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba ao processo e julgamento das acusações”.

Acusações absurdas

De acordo com a defesa, “as absurdas acusações formuladas contra o ex-presidente pela ‘força tarefa’ jamais indicaram qualquer relação concreta com ilícitos ocorridos na Petrobras e que justificaram a fixação da competência da 13ª Vara Federal de Curitiba”. Esse argumento foi um dos citados por Fachin em sua decisão de hoje. A defesa de Lula reafirma, na nota, o “conluio entre o então juiz Sergio Moro e os membros da ‘força tarefa’ de Curitiba”.

Yarochewsky afirma ser importante mencionar que o artigo 5° (“Dos direitos e garantias fundamentais”), inciso 37, da Constituição Federal de 1988 determina expressamente que “não haverá juízo ou tribunal de exceção”. E o inciso 53 do mesmo artigo prevê que “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”.

Nas Nações Unidas

Zanin Martins e Valeska lembram que levaram, em 2016, ao Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas, a denúncia da violação irreparável às garantias fundamentais de Lula, inclusive em virtude da inobservância do direito ao juiz natural, o direito de todo cidadão de ser julgado por um juiz cuja competência seja definida previamente por lei e não pela escolha do próprio julgador.

Analistas de mercado sugeriram que a decisão de Fachin seria motivada por uma estratégia para preservar a operação Lava Jato, ante a iminente possibilidade da declaração de suspeição de Sergio Moro pela Segunda Turma do tribunal. Para Yarochewsky, tal afirmação não pode ser facilmente comprovada. “Falar em estratégia dos outros é complicado.”

“Vitória da democracia”

“Estamos aguardando a análise jurídica da decisão do ministro Fachin, que reconheceu com cinco anos de atraso, que Sergio Moro nunca poderia ter julgado Lula”, escreveu a deputada Gleisi Hoffmann no Twitter. “O julgamento conduzido por Moro foi viciado, político e recheado de fraudes processuais. Essa é uma vitória da democracia e do Estado de Direito”, disse Marcelo Freixo (Psol-RJ) na mesma plataforma


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