Acuado, Bolsonaro busca na intimidação uma estratégia de sobrevivência política
Crise entre Bolsonaro e militares passa por disputas internas nas próprias Forças Armadas, além de ser uma tentativa de desvinculação de alguns generais em relação à impopularidade do governo
Publicado 31/03/2021 - 11h33
São Paulo – O presidente Jair Bolsonaro criou uma crise política e militar, além da sanitária e econômica, com o objetivo de colocar o país numa aventura golpista, ressuscitando fantasmas do golpe civil-militar de 1964. De acordo com cientistas políticos, enfraquecido, Bolsonaro busca sobreviver politicamente e tenta intimidar opositores e instituições.
Nesta última terça-feira (30), foi divulgada a saída coletiva do governo de Jair Bolsonaro dos três comandantes das Forças Armadas. Já na segunda-feira (29), o ministro da Defesa, general Fernando Azevedo Silva, foi demitido.
O cientista político e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Cláudio Couto diz que, neste cenário, a troca de Azevedo foi preocupante já que o general sugeriu, em sua nota de demissão, ter havido uma tentativa de transformar as Forças Armadas em instituições de governo, e não de Estado. “Ao que parece, Bolsonaro caminha para finalmente tentar dar um golpe de Estado no Brasil. Não há outra leitura possível”, alertou Couto, em entrevista a Glauco Faria no Jornal Brasil Atual.
Ainda ontem, o deputado federal Major Vitor Hugo, líder do PSL na Câmara, apresentou um Projeto de Lei que aumentaria os poderes do presidente da República ao incluir a pandemia entre as situações nas quais seria possível decretar o estado chamado de “Mobilização Nacional”.
“Este é um projeto absurdo, o que se pretende é dar o controle ao governo federal das polícias estaduais”, observa Couto. “No contexto em que Bolsonaro ataca governadores, assumir o controle das Polícias Militares é uma evidente tentativa de golpe de Estado. O presidente está tentando dar um golpe e intimidar seus adversários”, disse Couto.
Militares de saída?
O governo de Bolsonaro é considerado um ‘governo militar’, segundo muitos especialistas. Atualmente, a gestão federal conta com 6.157 militares em funções civis. O número representa um aumento de 108,22% em relação a 2016.
A crise entre Bolsonaro e militares passa por disputas internas nas próprias Forças Armadas, além de ser uma tentativa de desvinculação de alguns generais em relação à impopularidade do governo. “Alguns militares estão vendo que estar no governo é um problema para as Forças Armadas. Sair do governo se tornou uma atitude mais plausível do que apoiar o Bolsonaro até o fim, pois é um presidente delirante. Os militares são autoritários, mas não são delirantes como o presidente”, acrescentou Cláudio Couto.
O professor do Departamento de Política da Unicamp, Wagner Romão, lembra que os militares estão envolvidos politicamente desde o golpe parlamentar de 2016. “Uma liderança como Bolsonaro coloca muitas fraturas, porque ele é paranoico e se torna difícil ser liderado por ele. Os militares estão saindo para se isentarem de culpa e saírem como defensores da democracia.”
Wagner Romão acrescenta que Bolsonaro flerta com um golpe, mas lidera um governo impopular, responsável por mais de 300 mil mortes decorrentes da covid-19 e fechado com um setor da direita fisiológica. Portanto, não tem nenhuma força política para aplicá-lo de forma bem sucedida. “Ele está tentando se resguardar de um processo de impeachment. Estamos numa crise sanitária sem precedentes, uma crise econômica brutal e também uma crise política, por causa da incompetência de Bolsonaro. Se ele tentar uma situação golpista, ele teria uma resposta forte e retirado da presidência. Não sairia vitorioso.”
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