Setor paralelo

‘Lava Jato se permitiu torturar pessoas’, diz Gilmar Mendes sobre prisão para forçar delações

Declaração foi dada ao site Jota. Procuradores comemoraram pedido de acordo de delação, após Moro ameaçar transferir ex-presidente da Petrobras e do Banco do Brasil a presídio com relato de violência

Antonio Cruz-Marcelo Camargo/ABr - Canal Jota/Reprodução
Antonio Cruz-Marcelo Camargo/ABr - Canal Jota/Reprodução
Em entrevista, Gilmar Mendes fez críticas ao sistema paralelo montado pela força-tarefa sob a chancela de Sergio Moro, mas apontou que o Judiciário brasileiro criou, de alguma forma, as condições para que essa anomalia se viabilizasse

Conjur – “O que nós fizemos para que se chegasse a esse ponto?”, questionou o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, referindo-se às relações de proximidade entre julgador e acusação no decorrer da operação “lava jato”. A declaração foi dada a Felipe Recondo e Fábio Zambeli, do Jota, em entrevista nesta terça-feira (9).

Ao comentar a nova enxurrada de revelações sobre o modus operandi do consórcio de Curitiba, que o deixou “desorientado”, o ministro destacou uma notícia da ConJur sobre comentários feitos por Deltan Dallagnol diante da possibilidade de fechar um acordo de delação.

Conforme a notícia, um interlocutor teria dito a Deltan que o ex-presidente do Banco do Brasil, Aldemir Bendine, ao ser ameaçado de transferência para uma carceragem de condições precárias, sinalizou que estaria disposto a fazer delação premiada. Deltan então responde: “Nunca uma transferência foi tão eficiente, rsrsrs”.

“Em algum lugar mais sensível e talvez mais ortodoxo em matéria de Direito, é de se dizer: essa gente estava se permitindo torturar pessoas. É lícito isso?”, questionou Gilmar.


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Gilmar Mendes fez críticas ao sistema paralelo montado pela força-tarefa sob a chancela de Sergio Moro, mas apontou que o Judiciário brasileiro criou, de alguma forma, as condições para que essa anomalia se viabilizasse.

Judiciário constrangido

“Mas a pergunta que me ocorre como homem do Direito é: o que nós fizemos de errado para que, institucionalmente, produzíssemos isso que se produziu? Um setor que se desliga por completo, que não está acoplado a nenhum sistema jurídico funcional, que cria a sua própria Constituição e que passa a operar segundo os seus sentimentos de justiça. O Russo, que é o Moro, criou seu próprio Código de Processo Penal, o CPP da Rússia. Sabiam que estavam fazendo uma coisa errada, mas fizeram com o sentimento de que tudo estava coberto”, afirmou Gilmar.

“Eu tenho a impressão de que tudo que foi revelado nos enche de constrangimento. Muitos colegas que despacharam e que deram azo a alguns episódios desse assunto certamente têm muito constrangimento ao ver que de alguma forma foram cúmplices de algo deplorável”, completou.

Sem diminuir a responsabilidade do Judiciário, nas instâncias do Supremo e do Superior Tribunal de Justiça, o ministro voltou a atribuir a parcela de responsabilidade que cabe à imprensa. “Sem a participação da mídia e sem a cobertura (no sentido mais chulo da palavra), sem a blindagem que se ofereceu, isso não teria ocorrido.”

“Portanto, nós estamos num imbróglio muito grande, eu não sei como isso vai ser desatado.”


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