Vícios processuais

Decisão de Fachin indica mudança de ‘humor’ do STF em relação à Lava Jato

Defesa do ex-presidente havia apontado nulidade na produção de provas obtidas em sistemas de contabilidade da Odebrecht

Nelson Jr./STF
Nelson Jr./STF
Mesmo alinhado com a Lava Jato, Fachin manda 13º Vara de Curitiba respeitar o direita de defesa

São Paulo – O ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou na quarta-feira (24) que o juiz Luiz Antônio Bonat – substituto de Sergio Moro na Lava Jato em Curitiba – julgue uma ação interposta pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que contesta a validade de provas no caso Odebrecht.

Os advogados argumentaram que a perícia no material mostrou vícios processuais em procedimentos de cooperação internacional para a transmissão das provas extraídas dos sistemas de contabilidade da empreiteira. Até então, o juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba havia se negado a avaliar a validade dessas provas. A decisão de Fachin, por outro lado, também não entra no mérito da questão.

Ainda assim, de acordo com o professor do departamento de Ciência Política da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Wagner Romão, a decisão indica que os “humores” do STF contra a Lava Jato continuam se “expandindo”. Em entrevista a Glauco Faria, no Jornal Brasil Atual desta sexta-feira (26), ele disse que é mais uma decisão que pavimenta o caminho rumo à declaração de suspeição de Moro, pedida pela defesa do ex-presidente.

A decisão chama mais a atenção,porque Fachin é tido com um dos magistrados mais alinhados à Lava Jato. Em entrevista recente ao jornal Folha de S.Paulo, chegou a defender a operação, que estaria sendo submetida a ataques, segundo ele. O histórico de apoio de Fachin foi inclusive comemorado pelo procurador Deltan Dallagnol, ex-chefe da Lava Jato. Em conversa vazada entre os procuradores, ele proferiu a já célebre “Aha uhu o Fachin é nosso“.

Direito de defesa

Apesar da simbologia, Romão ressalta que se trata de uma decisão que garante os princípios básicos da ampla defesa. E disse ser “absurdo” que um ministro do STF tenha que “ensinar” procedimentos básicos na preservação de direitos constitucionais.

“Está muito claro que tudo o que aconteceu na 13ª Vara de Curitiba foi no mínimo suspeito. Foram procedimentos absolutamente abusivos, que cercearam o direito à ampla defesa. Produziram decisões baseadas em ilações na ideia que ficou bastante marcada, a das ‘convicções’. A Lava Jato se tornou uma grande chaga para o devido processo jurídico no país. É uma vergonha mundial”, disse Romão.

Foro privilegiado

O professor da Unicamp avaliou também a tramitação no Congresso Nacional da chamada PEC da Imunidade. A proposta pretende ampliar a imunidade dos parlamentares, restringindo as hipóteses de prisão. Essa discussão ocorre depois que o STF determinou a prisão em flagrante do deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), que ameaçou ministros da Suprema Corte. Para Romão, é importante garantir a imunidade parlamentar, mas essa não pode extrapolar os limites do decoro.

Além disso, o cientista político também destacou o fato de que não são apenas os parlamentares que gozam dessa imunidade. Integrantes do Judiciário e do Ministério Público também detêm a chamada prerrogativa de função. E também abusam dessas prerrogativas para cometer abusos de poder. Como foi o caso de um desembargador que humilhou um guarda civil, em Santos, litoral de São Paulo, após ser multado pela recusa do uso de máscara.

Assista à entrevista

Redação: Tiago Pereira