Reconstrução

Zé Dirceu: ‘É preciso trazer revolução social de volta ao nosso vocabulário’

Zé Dirceu valoriza resultados da unidade democrática já em andamento contra Bolsonaro, e aponta diferenças com a direita liberal que se apresenta para 2022

Marcelo Camargo/ABr
Marcelo Camargo/ABr
Zé Dirceu: "Nós somos alternativa para 2022, mas precisamos unificar as forças progressistas em torno de um programa mínimo"

São Paulo – A esquerda e o campo progressista devem ter como objetivo disputar a consciência social das classes trabalhadoras e voltar a dialogar com elas sobre o conceito de revolução social. É assim que, na avaliação do líder político e ex-ministro José Dirceu, terão condições de se apresentar como alternativa ao bolsonarismo em 2022. Com trabalho de base, sim, como nos velhos tempos, e também com inteligência estratégica. Por exemplo, unificando ações em massa a partir dos polos de poder nos estados e municípios onde o campo progressista está presente. E também nos organismos de representação popular, como sindicatos e movimentos sociais. Em entrevista ao também ex-ministro Tarso Genro, ex-governador do Rio Grande Sul, Zé Dirceu observa que muito da sonhada unidade do campo progressista na construção de uma frente já está em andamento.

“Nós somos alternativa para 2022, mas precisamos unificar as forças progressistas em torno de um programa mínimo.” Esse foi o foco do República e Democracia – O Futuro não Espera, exibido pela TVT e a Rádio Brasil Atual na noite desta terça-feira (26). O programa está em sua segunda edição – na semana passada ouviu Ciro Gomes – e tem ainda muitos convidados pela frente para tratar desse desafio. O próximo será o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB).

Zé Dirceu diz que o campo da direita liberal já está se movendo para se apresentar como alternativa a Bolsonaro em 2022. Esse campo, no plano partidário, é representado por PSDB e DEM. No plano institucional, por parcela importante do Supremo Tribunal Federal (STF). E no plano da economia e empresarial por correntes liberais que se opõem ao caráter autoritário, obscurantista e ao fundamentalismo religioso do bolsonarismo.

“Porém, não ao seu programa econômico, e não, talvez, nas questões internacionais. Mas que nas questões ambientais, na agenda antirracista, na luta das mulheres e LGBT, já está disputando uma base social que sempre votou como o campo progressista”, aponta o experiente articulador político.


“Nós seremos capazes de juntar não só os partidos – PT, PSB, PDT, PCdoB, Psol, Rede, Cidadania, PV… – mas também setores importantes da sociedade (intelectuais, artistas, classes médias progressistas)?”, provoca Dirceu. “Dá para apresentar uma candidatura única? Eu acredito que sim”, diz. E exemplifica com uma constatação do enfrentamento cotidiano ao governo Bolsonaro: “Nós temos uma atuação conjunta no Congresso. Na reforma tributária, na Previdência, trabalhista, na questão do pacote anticrime. E agora na disputa na Mesa da Câmara. Estamos na agenda do impeachment. E estamos juntos também numa questão fundamental deste momento, que é a vacinação universal e gratuita. E ainda o auxílio emergencial e um programa de investimentos públicos de emergência para o país”.

Fio da história

Zé Dirceu considera, portanto, o campo progressistas adiantado em relação ao ponto de partida para uma plataformas que o unifica, que chama de “fio da história – um Brasil independente e soberano”. A segunda questão, entretanto, seria como construir uma estratégia agregadora pela restauração da democracia. E que para ele passa por superar um “governo militar, e do ponto de vista institucional, o que é mais grave”. Ele pondera que o campo democrático nunca conseguiu submeter o poder militar ao poder civil, “apesar da redemocratização do país e da vigência, por mais de 30 anos, da Constituição de 1988”.

“Só não vivemos uma ditadura porque o STF, o Congresso, a oposição de esquerda e uma parte importante da direita liberal se opuseram à marcha acelerada que o Bolsonaro pretendia fazer”, argumenta. “O Supremo impôs limites ao Bolsonaro. Na censura, na autonomia das universidades, na escola sem partido, quando ele quis governar por decreto, no meio ambiente, na questão indígena”, ilustra. “E o Congresso não só impediu o pacote anticrime, a privatização da Previdência, como evitou o descalabro que seria o desvio de recursos do Fundeb para a educação privada.”

Revolução social

Dirceu, enfim, desenha o que une o campo democrático progressista. Mas mostra plena ciência do que o separa da direita liberal: reformas privatizantes, desindustrialização, desmonte do Estado nacional e do bem-estar social. Ele relembra: Fernando Henrique pretendia enterrar a Era Vargas, e o golpe a partir de Temer, enterrar a Era Lula. “Ou seja, abrir mão de um projeto de desenvolvimento nacional. E, mais grave, desmontar o Estado de bem-estar social, uma conquista de 100 anos de luta, que não caiu do céu. Sempre houve luta neste país, e essa agenda se cristalizou na Constituição de 1988.”

O problema é que o que a esquerda viu no potencial brasileiro, a direta também vê. Um país determinante no mundo. Quinto território, sexta população, entre as 10 maiores economias. “Não temos invernos. Temos base industrial, tecnológica, soberania de alimentos, soberania energética e limpa, um dos maiores mercados internos do mundo”, ilustra. “E caminhávamos para consolidar a partir do pré-sal um novo ciclo de desenvolvimento econômico do país. Tudo isso foi cortado por uma operação que levou ao golpe – sacramentado com a prisão de Lula e sua exclusão do processo eleitoral de 2018.

Enfim, para não ter de sucumbir a essa direita liberal – que a mídia hegemônica já constrói como opção para derrotar o Bolsnarismo –, o caminho é “reconstruir a consciência social na classe trabalhadora”. E trazer de volta ao vocabulário a ideia de revolução social. “Sem medo. Explicitando o que ela é.”

Acompanhe a entrevista na íntegra


A TVT e a Rádio Brasil Atual transmitem toda terça, às 22h30, o programa República e Democracia: O Futuro não Espera. A cada semana, um debate com 12 lideranças da esquerda e centro-esquerda brasileira. Sempre em busca de “consensos estratégicos” para a construção de uma unidade progressista, com vistas às eleições presidenciais de 2022. Depois de Ciro Gomes e Zé Dirceu, estão confirmados Flávio Dino (PCdoB), Guilherme Boulos (Psol), Roberto Requião (MDB), Manuela D’Ávila (PCdoB), Luiza Erundina (Psol), Aloizio Mercadante (PT), Marina Silva (Rede), Celso Amorim e Fernando Haddad (PT).


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