Mais crimes

Bolsonaro usa ministro da Saúde para praticar abuso de poder, diz Comparato

“Quando ele diz que os opositores deveriam procurar a PQP, tenho impressão de que foi, pelo menos, infringido o dever de proceder com decoro”, afirma jurista

Reprodução/Yitube
Reprodução/Yitube
"O presidente atua de forma a impedir que o ministro da Saúde exerça com correção as funções do seu cargo", afirma jurista

São Paulo – O presidente da República, Jair Bolsonaro, acumula sobre suas costas 63 pedidos de impeachment na Câmara dos Deputados. Desses, cinco foram arquivados. Portanto, o presidente da Casa, Rodrigo Maia  (DEM-RJ), tem à sua disposição 58 possibilidades de escolha para colocar em andamento um processo por crime de responsabilidade. O jurista Fábio Konder Comparato considera que há dois motivos a mais dignos de enquadrar Bolsonaro. O mais recente foi ao dirigir-se a cidadãos mandando-os “à puta que o pariu”, a propósito das compras de R$ 1,8 bilhão efetuadas pelo governo para alimentação dos quadros governamentais, incluindo R$ 15 milhões para leite condensado.


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O jurista cita o artigo 9°, inciso 7, da Lei do Impeachment (n° 1079/1950). Segundo o dispositivo, é crime de responsabilidade “proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo”. “Ele usa e abusa das palavras gentis”, ironiza Comparato. “Quando ele diz que os opositores deveriam procurar a PQP, tenho impressão de que foi, pelo menos (risos), infringido o dever de proceder com decoro”, acrescenta. Embora menos óbvia do que esta evidente quebra de decoro, a maneira como Bolsonaro conduz as questões da Saúde por meio de seu ministro, o general Eduardo Pazuello, também pode ser facilmente enquadrada como crime de responsabilidade, na opinião do jurista.

Receituário de Bolsonaro

Por exemplo, a pasta de Pazuello, já sob seu comando, publicou um protocolo sugerindo a prescrição de hidroxicloroquina e cloroquina para tratamento da Covid-19, o que o ministro depois negou. Além disso, o ministério fornece os medicamentos, sem nenhuma eficácia comprovada contra a doença. O próprio Rodrigo Maia afirmou, na segunda-feira (25), que Pazuello cometeu crime ao defender o chamado “tratamento precoce” para a Covid-19. Os atos do ministro são claramente a manifestação do “receituário” do próprio Bolsonaro.

Para Comparato, neste caso, tanto a Constituição como a Lei 1079 enquadram Bolsonaro. Ele cita novamente a Lei do Impeachment, que “tem definição ampla de crime de responsabilidade do presidente da República”. O artigo 7°, inciso 5, da lei prevê que é crime de responsabilidade contra o livre exercício dos direitos políticos, individuais e sociais “servir-se das autoridades sob sua subordinação imediata para praticar abuso do poder, ou tolerar que essas autoridades o pratiquem sem repressão sua”.

“Essa é uma referência que faço ao ministro da Saúde, aquele que diz que obedece a todas as ordens do presidente. Uma das formas de abuso de poder é a omissão dos deveres funcionais do cargo de ministro da Saúde. O presidente atua de forma a impedir que o ministro exerça com correção as funções do seu cargo. E a função do ministro da Saúde é obviamente proteger o direito de qualquer cidadão à saúde, um direito fundamental de qualquer pessoa, como está na Constituição”, ensina Comparato.

Concomitantemente à Lei do Impeachment, a Constituição, no artigo 85, elenca como passível de impeachment ato do presidente contra o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais.

“Pressão deve continuar”

Por esses e outros motivos já fartamente listados por especialistas em Direito, Comparato diz defender o impeachment. “Sou favorável. Mas o presidente da Câmara está sentado em cima de mais de 60 pedidos e não decide. Mas, mesmo que ele não aceite, é sempre uma pressão. A meu ver, a pressão deve continuar”, diz.

Comparato não só critica Rodrigo Maia como não está otimista do ponto de vista político. “Agora ele (Maia) vai sair e o próximo vai ser um amiguinho do presidente”, prevê, em referência ao candidato de Bolsonaro, Arthur Lira (PP-AL), líder do Centrão. Se Baleia Rossi (MDB-SP), candidato de Rodrigo Maia, for eleito presidente da Câmara na próxima segunda-feira (1°), ainda haverá possibilidade de, com muita pressão social, Bolsonaro finalmente ser processado no Congresso. Comparato interrompe o repórter, e diz: “Pois é, mas Baleia Rossi não vai se eleger. Tenho certeza”.


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