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Núcleo agrário da bancada do PT na Câmara tenta barrar portaria da grilagem

Para o autor do projeto, João Daniel (PT-SE), a portaria que incentiva e legitima a grilagem é inconstitucional, facilitará a anexação de terras pelo agronegócio e aprofundará ameaças ao meio ambiente

Arquivo Ibama
Arquivo Ibama
Para o parlamentar, o agronegócio deverá ser favorecido pela nova portaria do governo

São Paulo – O deputado federal João Daniel (PT-SE), que coordena o núcleo agrário da bancada do PT na Câmara, protocolou, na sexta (4), Projeto de Decreto Legislativo (PDL 520/2020) que na prática suspende a Portaria Conjunta nº 1, de 3 de dezembro. O objetivo é sustar os efeitos da portaria baixada pelo governo de Jair Bolsonaro que estimula e legitima a grilagem de terras. Assinada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, em conjunto com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), a medida institui o programa Titula Brasil.

O objetivo do governo é acelerar e facilitar os procedimentos de titulação e regularização fundiária de áreas rurais sob domínio da União ou do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária.

Em seu projeto, Daniel argumenta que a portaria é inconstitucional. Ela transfere às prefeituras atribuições de regularização fundiária de áreas da União, contrariando o artigo 184 da Constituição. O artigo diz que “compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social.”

Além disso, a portaria de Bolsonaro incentiva e legitima a ação de grileiros, promove a iniquidade no acesso à terra e tem consequências danosas ao meio ambiente, ferindo acordos e tratados internacionais assumidos pelo Brasil. O parlamentar aponta ainda que o programa facilitará a anexação de terras pelo agronegócio, aliado do governo Bolsonaro. “A defesa de titulação pura das terras levantada pelo governo, além de atentar contra a Constituição Federal e leis que tratam do tema, servirá meramente para a futura anexação destas terras perante o grande agronegócio, detentor de grande poder aquisitivo”, afirma João Daniel

Luta pela terra

Nessa perspectiva, os assentados, cada vez mais desassistidos pelo Estado, sofrerão com o acirramento das desigualdades no campo, marcadas pelo poder econômico. “Essa portaria privilegia apadrinhados, contribui para as desigualdades no campo. É injusta e ilegal. Por isso, é urgente sua revogação”, completa.

Segundo o parlamentar, a medida é mais um revés ao Plano Nacional de Reforma Agrária. Enquanto governos passados entregaram em média três mil títulos por ano, em 2019 – primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro –, foram entregues apenas nove. “Esta é uma clara demonstração que a narrativa de burocracia maçante defendida pelo governo não se sustenta. O que está por trás é a notória posição ideológica que criminaliza e exclui os movimentos populares que lutam por terra com fim social para ela”, denuncia o coordenador do núcleo agrário do PT na Câmara.

MP da grilagem

O parlamentar alerta por fim que a distribuição de terras a partir dessa portaria do governo Bolsonaro passará de vez a servir a fins políticos, favorecendo a grilagem e, consequentemente, aqueles que promovem o desmatamento ilegal, a destruição da fauna e flora, infringindo acordos que preveem a proteção ambiental, a punição dos agressores da natureza e a defesa da própria vida no planeta.

João Daniel compara a portaria com a Medida Provisória (MP) 910, que ficou conhecida como MP da Grilagem, e que acabou caducando no Congresso devido à pressões da sociedade. E lembrou que, por meio do próprio Incra, Bolsonaro enviou recentemente a Força Nacional para reprimir trabalhadores rurais na Bahia, em terras reivindicadas por aliados bolsonaristas, o que foi barrado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).