Tendenciosa

Manchetômetro: principais jornais apostam na falsa simetria entre Bolsonaro e PT

Estudo detalha como os principais veículos impressos apresentaram, entre 2014 e 2020, cobertura tendenciosa contra a esquerda brasileira

REPRODUÇÃO
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Este procedimento, que precede um inquérito civil, tem potencial para desencadear ações legais. Entre elas, indenizações e outras medidas punitivas

São Paulo – De acordo com análise detalhada em estudo publicado pela Fundação Friedrich-Ebert-Stiftung Brasil, o PT foi alvo de um verdadeiro “cerco midiático” por parte dos principais jornais impressos do Brasil durante a cobertura política realizada entre 2014 e 2020. O levantametno foi conduzido pelo cientista político e criador do Manchetômetro João Feres Junior, com base em análise de editoriais e textos de opinião dos jornais Folha de S.Paulo, O Estado de S.Paulo e O Globo.

“Em 2014, a Dilma ainda era presidenta e concorria à reeleição. A cobertura mostra que as manchetes contra ela já eram mais negativas do que àquelas em relação a outros candidatos. Depois de eleita, em janeiro, o número de notícias negativas triplicou. Os textos negativos sobre ela passaram de 300, por mês, só em três jornais”, explica o cientista político, em entrevista a Glauco Faria, no Jornal Brasil Atual.

O estudo ainda traz um comparativo entre a cobertura da imprensa em relação ao segundo governo de Dilma e a gestão de seu sucessor, Michel Temer, que assumiu a presidência após o impeachment. Feres explica que Temer teve um tratamento benevolente por parte dos grandes jornais, mesmo com o envolvimento de seus ministros com escândalos de corrupção desde o início de seu governo.

“Temer gozou de pacífica e longa lua de mel da parte dos editores e articulistas dos grandes jornais, a despeito do intenso envolvimento de seus ministros com escândalos de corrupção desde o início de seu governo. Isso viria a mudar com denúncias graves de corrupção oriundas da divulgação de gravação de conversa entre ele e o empresário Joesley Baptista, em julho de 2017 – evento responsável pelo mais alto pico de negativas em sua cobertura”, diz o estudo. “Mas é exatamente aqui que se revela uma diferença impressionante no tratamento dispensado a ele e a Dilma. O número de contrárias cai mês após mês após o escândalo, vindo a se acomodar com as curvas das outras valências. Já na segunda metade de 2018 era como se nada tivesse acontecido.”

Lula

O levantamento também traz números da cobertura sobre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em março de 2016, por exemplo, os três ‘jornalões’ publicaram um total de 62 editoriais que eram de alguma maneira desfavoráveis a Lula, contra dois favoráveis e dois neutros. A média é de um editorial contra o petista por dia.

“Houve posicionamento ferozmente contrário ao ex-presidente por parte dos donos e editores dos jornais. Esse posicionamento foi refletido nos textos de opinião, que mostraram perfil negativo similar aos editoriais no agregado, e houve um forte alinhamento da mídia com a Operação Lava Jato e as forças políticas que a sustentavam”, diz a análise.

Falsa simetria com Bolsonaro

O levantamento analisa a equiparação feita de forma recorrente por colunistas e veículos da mídia tradicional entre as posturas do PT e de Jair Bolsonaro. O cientista político aponta que jornais usualmente tratavam ambos como “radicalizações equivalentes”, uma à esquerda e outra à direita, do espectro político-ideológico.

Feres explica que essa retórica colocava o PT e “o projeto fascista de Bolsonaro” como ameaças à estabilidade democrática do país, uma falsa simetria. “Os três jornais publicaram editoriais que colocavam o PT como ameaça à democracia, comparável ao Bolsonaro. No segundo turno, isso foi intensificado. O argumento da equivalência continua a ser feito, a todo momento esses jornais continuam publicando artigos sobre isso”, criticou.

Em uma dos exemplos de falsa simetria, o estudo traz o editorial d’O Globo, publicado em julho de deste ano, dizendo que “O bombardeio de mensagens em época de campanha é recurso que já foi usado pelo PT e serve de base para processo que a chapa Bolsonaro-Mourão enfrenta no TSE”.

“Se há uma equivalência que pode ser feita, é a grande imprensa brasileira com as fake news. Vale lembrar do falso sequestro do Abílio Diniz atribuído ao PT, o debate entre Collor e Lula, a bolinha de papel no Serra, além da atribuição de escândalos vinculados ao PT. Tudo isso é usado nas campanhas eleitorais para manchar a imagem do partido, e é feito há muito tempo”, aponta o cientista político.

O especialista diz que a mídia tradicional não age como um “cão de guarda” para defender o interesse público, como muitos defendem, mas em favor dos interesses do capital financeiro. “Há uma manipulação de noticiário e do debate, levando à concepção de que o Estado precisa ser pequeno, o gasto público precisa ser controlado, tudo isso num país desigual como o Brasil”, acrescentou.


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