Afronta

Brasileiros reagem à submissão de Bolsonaro a Trump: ameaçam a paz

Presença do secretário de Estado dos EUA em Roraima com ofensas e ameaças à Venezuela é rechaçada por ex-chanceleres, Rodrigo Maia e Lula

Itamaraty
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"Utilização espúria do solo nacional por país estrangeiro como plataforma de provocação e hostilização a uma nação vizinha", diz nota de ex-chanceleres do Brasil

São Paulo – “O povo brasileiro não quer uma guerra norte-americana por petróleo na América do Sul, ainda mais a partir do nosso território. Queremos paz e cooperação com nossos vizinhos. A era do porrete acabou.” A afirmação, publicada no Twitter, é do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Lula reagiu ao fato de o governo de Jair Bolsonaro e o atual ministro da Relações Exteriores, Ernesto Araújo, recepcionarem o secretário de Estado dos Estados Unidos, Mike Pompeo, em Roraima na última sexta-feira (18). Na ocasião, Pompeo e Araújo proferiram ofensas contra o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro. Mike Pompeo chegou a acusar Maduro de “narcotraficante” e voltou a proferir ameaças de intervenção no país vizinho.

Os Estados Unidos são apontados como principais articuladores da sabotagem ao governo de Maduro. No Brasil, a interferência, com a cumplicidade do governo provocou reações indignadas de diferentes forças políticas. Na sexta, o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que a conduta de Mike Pompeo chanceler norte-americano, a um mês e meio da eleição presidencial nos Estado Unidos – em que Donald Trump tenta ser reconduzido, não condiz com a autonomia da política externa brasileira determinada pela Constituição. Maia classificou a presença do chanceler norte-americano como “afronta”.

Em, entrevista à agência Reuters, Lula enfatizou que “o Brasil está desgovernado, como um transatlântico em alto mar sem comandante e que Bolsonaro só cuida de contar coisas dele com fake news, sem se preocupar em cuidar do Brasil. O papel de um presidente é cuidar de seu povo. Isso significa pensar no emprego, no salário, na saúde, em comer três vezes ao dia”, declarou.

Apoio a Rodrigo Maia contra Mike Pompeo

Neste domingo, foi a vez de seis ex-chanceleres brasileiros, atuantes desde o governo Collor até ao governo de Dilma Rousseff, manifestarem apoio à postura de Maia. A nota conjunta é assinada pelos ex-chanceleres Francisco Rezek (governo Collor), pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que foi chanceler no governo de Itamar Franco, Celso Lafer (governos Collor e FHC), Celso Amorim (governos Itamar Franco e Lula), José Serra e Aloysio Nunes Ferreira (governo Temer). Também assinam o diplomata Rubens Ricupero, que foi embaixador em Washington, e Hussein Kallout, ex-secretário de Assuntos Estratégicos no governo de Michel Temer.

O documento afirma que a Constituição estabelece os princípios pelos quais o Brasil deve guiar suas relações internacionais: “Independência nacional, autodetermianção dos povos, não-intervenção e defesa da paz”. E considera “espúria” a tentativa de promoção eleitoral de Trump: “Condenamos a utilização espúria do solo nacional por um país estrangeiro como plataforma de provocação e hostilização a uma nação vizinha”, afirmam a nota. Para eles, Rodrigo Maia foi “intérprete dos sentimentos do povo brasileiro”.


Leia íntegra da nota dos ex-chanceleres

Responsáveis pelas relações internacionais do Brasil em todos os governos democráticos desde o fim da ditadura militar, os signatários se congratulam com o Deputado Rodrigo Maia, Presidente da Câmara dos Deputados, pela Nota de 18 de setembro, pela qual repudia a visita do Secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, a instalações da Operação Acolhida, em Roraima, junto à fronteira com a Venezuela.

Na qualidade de Presidente do órgão supremo da vontade popular, o Deputado Rodrigo Maia foi o intérprete dos sentimentos do povo brasileiro ao constatar que tal visita, “no momento em que faltam apenas 46 dias para a eleição presidencial norte-americana, não condiz com a boa prática diplomática internacional e afronta as tradições de autonomia e altivez de nossas políticas externa e de defesa”.

De igual forma que o Presidente da Câmara dos Deputados, os signatários se sentem no dever de reafirmar o disposto no Artigo 4º da Constituição Federal, em especial os seguintes princípios pelos quais o Brasil deve guiar suas relações internacionais: (I) Independência nacional; (III) Autodeterminação dos povos; (IV) Não-intervenção e (V) Defesa da Paz.

Atribuições constitucionais

Conforme salientado na Nota do Presidente da Câmara, temos a obrigação de zelar pela estabilidade das fronteiras e o convívio pacífico e respeitoso com os vizinhos, pilares da soberania e da defesa. Nesse sentido, condenamos a utilização espúria do solo nacional por um país estrangeiro como plataforma de provocação e hostilidade a uma nação vizinha.

Lembramos que representantes eleitos do povo de Roraima como o Senador Telmário Mota vêm repetidamente chamando a atenção para os prejuízos de toda a ordem causados às populações fronteiriças brasileiras por ações extremas do Itamaraty em relação à Venezuela, algumas das quais objetos de suspensão pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal.Finalmente, fazemos votos para que, dando sequência à Nota do Presidente Rodrigo Maia, as duas Casas do Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal, guardiões da Constituição de 1988, exerçam com plenitude as atribuições constitucionais de velar para que a política internacional do Brasil obedeça rigorosamente no espírito e na letra aos princípios estatuídos no Artigo 4º da Constituição Federal.