Lava Jato

Para analista, chance de punição severa a Dallagnol pelo CNMP é pequena

Para Frederico de Almeida, da Unicamp, conflito aberto entre o procurador-geral Augusto Aras e a Lava Jato pode favorecer coordenador da força-tarefa da operação

José Cruz/Agência Brasil
José Cruz/Agência Brasil
Pensamento do procurador: "Em razão da minha cosmovisão cristã, me parece que Deus está abrindo uma janela de oportunidade"

São Paulo – A pauta do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) prevê, para esta terça-feira (18), o julgamento de três ações contra o procurador da República Deltan Dallagnol. Os senadores Renan Calheiros (MDB-AL) e Kátia Abreu (PP-TO), além do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, são autores dos procedimentos que vão ser julgados por 11 integrantes do órgão. Os julgamentos estão nos itens 23, 80 e 83 da pauta. O processo de Lula é o mais antigo dos três, e foi protocolado em 15 de setembro de 2016. A apreciação do caso foi adiada pelo conselho 40 vezes.

A ação da defesa de Lula diz respeito à polêmica apresentação feita por Dallagnol naquele ano. Em uma entrevista coletiva, ele utilizou uma demonstração em PowerPoint para acusar Lula de comandar uma organização criminosa. No mês passado, segundo o Consultor Jurídico, Zanin afirmou que a defesa do ex-presidente conseguiu provar que “o PowerPoint foi baseado numa apresentação que a Suprema Corte dos Estados Unidos reconheceu ilegal”.

O julgamento dos Estados Unidos citado pelo advogado foi anulado pelo máximo órgão do Judiciário daquele país. Zanin explicou que a expressão ‘propinocracia’, utilizada pela Lava Jato para caracterizar o governo de Lula, se origina no termo em inglês ‘kleptocracy‘ (cleptocracia). Segundo Zanin, “é um setor específico do Departamento de Justiça dos Estados Unidos, com poderes praticamente ilimitados de coleta de dados”. As punições a que os procuradores como Dallagnol estão sujeitos, da menos para a mais grave, são advertência, censura, suspensão, demissão e cassação de aposentadoria.

O procurador pode também ser retirado da Lava Jato. Dallagnol já foi punido pelo CNMP, em novembro passado, com uma advertência, porque afirmou, em entrevista à rádio CBN, que ministros do Supremo Tribunal Federal formam “uma panelinha” e demonstram “leniência a favor da corrupção”.

Fux suspende punição

Nesta segunda-feira, o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu aquela advertência aplicada a Dallagnol emnovembro pelo CNMP. Pelas regras, na reincidência, Deltan poderia ser afastado da Lava Jato no julgamento desta terça, mas, com a decisão de Fux, essa possibilidade fica afastada.

Na série de reportagens conhecida como Vaza Jato, o site The Intercept Brasil revelou, em 2019, um diálogo comprometedor entre Dallagnol e procuradores da força tarefa, sobre sua relação com o ministro do STF. Segundo o site, o procurador relatava uma conversa com Fux na qual teria dito: “Só faltou, como bom carioca, chamar-me para ir à casa dele rs. Mas os sinais foram ótimos. Falei da importância de nos protegermos como instituições. Em especial no novo governo”, disse, de acordo com o Intercept. Dallagnol teria encaminhado a mensagem ao então juiz Sergio Moro, o qual teria respondido: “Excelente. In Fux we trust (Em Fux nós confiamos)”.

Para Frederico de Almeida, cientista político da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), não se pode cravar se o conselho vai aplicar ou não uma sanção ao procurador chefe da Lava Jato, por dois fatores: o primeiro é o conflito aberto do procurador-geral da República, Augusto Aras, presidente do CNMP, com a Lava Jato e, por consequência, com grande parte dos procuradores do país (leia aqui); o segundo, a postura de “defesa corporativa” do órgão. “Há dois elementos contra a condenação de Dallagnol. Mas sempre podemos ser surpreendidos”, diz Almeida.

“Cosmovisão cristã”

“A derrota de Aras seria consequência de uma reação dos procuradores para conter o procutador-geral. Mas há ainda a chance de o caso ser novamente tirado de pauta”, avalia. Na opinião do analista, a possibilidade de Dallagnol ser enquadrado com punição severa não é grande, embora exista.

“Do início de julho para para cá, Aras ficou ainda mais acuado na briga com procuradores. Minha impressão é que a capacidade de Aras de conseguir maioria para enquadrar Dallagnol é pequena”, diz. “Até porque a defesa de Dallagnol, independentemente dos temas específicos da Lava Jato, é uma defesa da autonomia dos procuradores. Não acho que haja clima para um resultado contundente contra a Lava Jato e eles.”

Fora sua polêmica atuação como procurador, o procurador Deltan Dallagnol, ao longo do tempo, deu declarações pouco afeitas ao posicionamento de um procurador da República. Ao falar para um público evangélico, por exemplo, no auge da Lava Jato, ele destacou sua crença de que o suposto combate à corrupção teria um caráter de missão divina.

“Do meu ponto de vista, em razão da minha cosmovisão cristã, me parece que Deus está abrindo uma janela de oportunidade para mudanças e que depende agora da nossa ação, nos unirmos ao que Deus já vem fazendo, para contribuir com a transformação deste país”, declarou aos fiéis.


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