A era Bolsonaro

Reunião de 22 de abril: palavrões, xingamentos, ameaças e desprezo pela República

“Quero escancarar o armamento, quero todo mundo armado”, disse Bolsonaro. “Tem que vender essa porra (Banco do Brasil) logo”, defendeu Paulo Guedes

Marcos Corrêa/PR
Marcos Corrêa/PR
A reunião de 22 de abril de 2020 entrará para a história brasileira como um de seus capítulos mais tristes

São Paulo – No vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, liberado pelo ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, nesta sexta-feira (22), o presidente Jair Bolsonaro e alguns de seus ministros de pastas emblemáticas reafirmam o ideário ultraliberal pelo Estado mínimo e a nostalgia do autoritarismo. Mas não apenas isso. O vídeo revela desprezo absoluto pelas instituições e pela República, traduzido por uma série de xingamentos, palavras e fraseado chulos contra figuras públicas, além de exortações a armas e à ditadura.

“E eu não vou meter o rabo no meio das pernas”, disse Bolsonaro, sobre o STF. “É escancarar a questão do armamento aqui, quero todo mundo armado, povo armado jamais será escravizado”, filosofou ainda o chefe de Estado brasileiro.

“Que os caras querem é a nossa hemorroida! É a nossa liberdade! Isso é uma verdade. O que esses caras fizeram com o vírus, esse bosta desse governador de São Paulo (João Doria), esse estrume do Rio de Janeiro (Wilson Witzel), é exatamente isso”, discorreu o presidente sobre ex-aliados, a respeito da política com que tentam combater a pandemia de covid-19, que matou 1001 pessoas no país, nas últimas 24 horas.

Estrago feito

Em entrevista na semana passada ao jornal Zero Hora sobre a política brasileira em relação à covid-19, o cientista Miguel Nicolelis comentou a tragédia em andamento no país: “Vamos viver algo que nunca imaginamos na história do Brasil”. Ele falou também da imagem do Brasil no mundo, diante do quadro: “Talvez quem esteja no Brasil não tenha a exata noção, mas a imagem do Brasil lá fora foi derretida. Não temos mais nada pelo que zelar. Já estávamos nesse caminho, e o coronavírus foi a pá de cal”.

Na área econômica, o tom chulo, na famosa reunião de 22 de abril, é o mesmo: “Tem que vender essa porra (Banco do Brasil) logo”, defendeu o ministro da Economia, Paulo Guedes, discípulo da ditadura de Augusto Pinochet, do Chile, e discípulo dos chamados Chicago Boys, que formularam a política econômica daquela ditadura.

O ministro do meio-ambiente, Ricardo Salles, manifestou seu projeto para uma área hoje considerada estratégica por todos os governos importantes do mundo. É preciso “aproveitar a pandemia para ir passando a boiada”, afirmou, na defesa da destruição da Amazônia.

O ministro da Educação, Abraham Weintraub, pasta considerada estratégica pelas nações que hoje estão na vanguarda científica, declarou: “Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia. Começando no STF”.

Interferência na Polícia Federal

Em relação a um dos temas em que juristas consideram que o chefe do governo brasileiro incorreu concretamente em crime de responsabilidade, o controle da Polícia Federal para defender sua família e amigos, diz o presidente: “Eu não vou esperar f… a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meus, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa. Vai trocar!”.

Sua ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, expôs seus conceitos sobre federalismo. “A pandemia vai passar, mas governadores e prefeitos responderão processos. E nós vamos pedir inclusive a prisão de governadores e prefeitos. E nós tamo (sic) subindo o tom e discursos tão chegando. Nosso ministério vai começar a pegar pesado com governadores e prefeitos”, prometeu a ministra.

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), no estilo cauteloso que lhe é peculiar, defendeu as medidas de Celso de Mello. “Todo mundo quando sofre uma investigação, mais transparência, geralmente faz crítica. Mas ninguém olha o passado”, afirmou.

“No passado, quando seus adversários foram investigados, que veio a público por exemplo o caso das conversas do presidente Lula com a presidente Dilma, eu não vi ninguém do nosso campo, me coloco nesse campo de oposição ao governo da presidente Dilma, criticando a decisão”, lembrou Maia, em entrevista à TV Record.

Bolsonaro reage e mantém confronto

Depois da divulgação do vídeo pelo decano do Supremo, Bolsonaro continuou com sua estratégia de confronto. “Só se o presidente da República for um rato pra entregar o telefone. Jamais entregaria um celular numa situação dessa. Só se fosse um rato pra entregar o telefone”, disse, à rádio Jovem Pan. 

Mais respeitado ministro do STF, Celso de Mello será o primeiro magistrado a deixar a corte durante o mandato de Bolsonaro. Em novembro deste ano, será afastado por aposentadoria compulsória. Ele fará 75 anos, idade limite para integrar o STF,


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