Desmoronando

Flávio Bolsonaro usou dinheiro público para financiar construções ilegais da milícia

Nova reportagem do Intercept mostra como “rachadinhas” do filho Zero Um do presidente, foram desviadas para além de loja de chocolates

Beto Barata/Agência Senado
Beto Barata/Agência Senado
Nem só de chocolate é feito o patrimônio do filho 01. Investigações do MP-RJ apontam que senador enriqueceu financiando a construção ilegal de edifícios pela milícia do Rio

São Paulo – O senador Flávio Bolsonaro (sem partido) usou dinheiro público arrecadado pelo esquema conhecido como “rachadinha” – em que um parlamentar exige devolução para sua conta bancária pessoal de parte do salário que paga aos funcionários de seu gabinete – para financiar e lucrar com a construção ilegal de prédios erguidos pelas milícias. É o que mostram documentos sigilosos e dados levantados pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) que serviram de base a mais uma reportagem do portal de jornalismo investigativo The Intercept Brasil.

Segundo o portal, os advogados do senador, filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro, já tentaram por nove vezes que o MP-RJ suspenda o procedimento, num claro sinal de que a família hoje instalada no Palácio do Planalto está preocupada com o rumo das investigações.

O inquérito do MP-RJ que apura fatos de organização criminosa, lavagem de dinheiro e peculato (desvio de dinheiro público) pelo filho “Zero Um” de Bolsonaro segue em sigilo. Sob condição de anonimato, os investigadores afirmaram ao Intercept que o cruzamento de informações bancárias de 86 pessoas suspeitas de envolvimento no esquema ilegal, que serviu para irrigar o ramo imobiliário da milícia, comprovam o envolvimento de Flávio.

Os dados mostrariam que o hoje senador receberia o lucro do investimento dos prédios por meio de repasses feitos pelo ex-capitão do Bope Adriano da Nóbrega – executado em fevereiro – e pelo ex-assessor Fabrício Queiroz, que segue desaparecido.

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Condecorado por Flávio Bolsonaro com a Medalha Tiradentes, principal honraria do Rio, Adriano da Nóbrega foi morto a tiros em um controverso cerco policial no interior da Bahia, com indícios de queima de arquivo. Foragido da Justiça, o ex-capitão estava escondido no sítio de um vereador bolsonarista. Os diversos celulares do miliciano apreendidos na ocasião ainda aguardam por perícia.

A reportagem detalha o funcionamento do esquema de Flávio Bolsonaro com as milícias:

  • Flávio pagava os salários de seus funcionários com a verba do seu gabinete na Alerj.
  • A partir daí, Queiroz – apontado no inquérito como articulador do esquema de rachadinhas – confiscava em média 40% dos vencimentos dos servidores e repassava parte do dinheiro ao ex-capitão do Bope, Adriano da Nóbrega, apontado como chefe do Escritório do Crime, uma milícia especializada em assassinatos por encomendo.
  • A organização criminosa também atua nas cobranças de “taxas de segurança”, ágio na venda de botijões de gás, garrafões de água, exploração de sinal clandestino de TV, grilagem de terras e na construção civil em Rio das Pedras e Muzema.
  • As duas favelas, onde vivem mais de 80 mil pessoas, ficam em Jacarepaguá, na zona oeste do Rio, e assistiram a um boom de construções de prédios irregulares nos últimos anos. Em abril do ano passado, dois desses prédios ligados a outras milícias desabaram, deixando 24 mortos e dez feridos.
  • O lucro com a construção e venda dos prédios seria dividido, também, com Flavio Bolsonaro, segundo as investigações, por ser o financiador do esquema usando dinheiro público.

O papel de “investidor” nas construções da milícia ajudaria a explicar a evolução patrimonial de Flávio Bolsonaro, que teve um salto entre os anos de 2015 e 2017 com a aquisição de dois apartamentos: um no bairro de Laranjeiras e outro em Copacabana, ambos na zona sul do Rio. Os investimentos também permitiram a compra de participação societária numa franquia da loja de chocolates Kopenhagen.

Flavio entrou na vida política em 2002, com apenas um carro Gol 1.0, declarado por R$ 25,5 mil. Na última declaração de bens, de 2018, o senador disse ter R$ 1,74 milhão. A elevação patrimonial coincide com o período em que a mãe e a mulher do ex-capitão estavam nomeadas em seu gabinete.

Nas redes sociais e nas poucas entrevistas em que falou sobre o esquema de rachadinha, Flávio Bolsonaro afirma ser vítima de perseguição da imprensa e critica o vazamento de informações do processo, que está sob segredo de justiça. O político também afirma não ter conhecimento sobre o fracionamento de salários de seus funcionários. Procurado pelo Intercept, o senador não se manifestou.

A reportagem completa pode ser lida aqui.


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