Combate à covid-19

Psol pede ao STF que leitos privados de UTI do país sejam geridos pelo SUS

Requisição de bens tem base no desrespeito a preceitos da Constituição e visa a atender o máximo de doentes durante pandemia

RBA
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ADPF lembra que independentemente de o sistema estar lotado ou não, há mais leitos disponíveis a quem tem dinheiro: "Apenas assim os poderes públicos poderão garantir acesso igualitário a esse serviço"

São Paulo – Uma arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) foi o instrumento escolhido pelo Psol para requerer ao Supremo Tribunal Federal (STF) que o poder público administre, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), todos os leitos de UTI no Brasil, inclusive os da rede privada.

A ADPF tem por objetivo fazer cumprir preceitos fundamentais da Constituição Federal, como o dispositivo da lei que rege o SUS e permite aos governos da União, estados e municípios requerer quaisquer equipamentos de saúde para combater o coronavírus, inclusive, no caso, os leitos de UTI. As Unidades de Terapia Intensiva privadas teriam de seguir critérios do SUS. O partido pede ao Supremo concessão de medida cautelar.

Elaborado pelos juristas Pedro Serrano, Walfrido Warde, Gilberto Bercovici e Rafael Valim, Thayná Yaredy e Juliana Serrano, o texto procura evitar que as UTIs sejam usadas apenas pelos mais ricos.

“A despeito de diversas providências adotadas pelo Poder Público, tais providências revelam-se absolutamente insuficientes para resguardar os seguintes preceitos fundamentais: direito social à saúde (art. 6º; art. 23, inciso II; art. 24, inciso XII; art. 194; art. 196; art. 197; art. 198; art. 199 e art. 200), o direito fundamental à vida (art. 5º, caput; art. 227 e art. 230), o direito fundamental à igualdade (art. 5º, caput, e art. 196), o fundamento da República Federativa do Brasil de dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III) e, por fim, o objetivo fundamental da República Federativa do Brasil de construir uma sociedade justa e solidária (art. 3º, inciso I)”, informa a ADPF. “Conforme entrevista veiculada pela pneumologista Margareth Dalcolmo, da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) da Fiocruz, o Covid-19 tende a explodir descontroladamente nas comunidades nas quais as pessoas vivem aglomeradas e sem saneamento.”

Direito de todos

O documento avalia que dada a magnitude da pandemia, e as consequências desastrosas e exponenciais para a sociedade, a União permaneceu inerte na adoção de providências efetivas para assegurar, concomitantemente ao avanço exponencial da pandemia, a ampliação dos leitos qualificados de UTI. “Apenas foram adotadas iniciativas isoladas nesse sentido”, afirma.

A saúde é direito de todos e dever do Estado, lembra a ADPF. “Uma vida não vale mais que a outra. Em tempos de pandemia do novo coronavírus, hospitais abarrotados, escalada nas mortes e sociedade fraturada, é preciso rememorar que a dignidade da pessoa humana é um fundamento da República Federativa do Brasil”, reforça. “Portanto, em uma situação de calamidade pública, como esta que vivemos, cabe ao SUS assumir integralmente a gestão de hospitais e profissionais de saúde. Sejam eles públicos ou privados. Independentemente de o sistema estar lotado ou não, há mais leitos disponíveis a quem tem dinheiro. Apenas assim os Poderes Públicos poderão garantir acesso igualitário a esse serviço.”

Dados comprovam desigualdade

O Brasil tem uma média de 2,6 leitos para cada 10 mil habitantes, informa a ADPF, lembrando que somente 25% da população brasileira possui convênio médico ou dinheiro para pagar o serviço de saúde. Esses 25% têm disponíveis 56% dos leitos de UTI. São cerca de 44 mil leitos ao todo.

Enquanto isso, três quartos da população têm para si 44% dos leitos de UTI, que são os leitos públicos do SUS e conveniados. “Veja-se, portanto, que temos um problema estrutural na saúde que é a desigualdade social, que se manifesta de forma especialmente perversa no tema dos leitos de UTI na pandemia do coronavírus. Por essa razão, o acesso deve ser universalizado por meio do mecanismo de requisição administrativa.”

A ação, explica do documento, visa o equilíbrio na utilização de todo o sistema médico brasileiro, independente do fator monetário e da condição social da pessoa. “É a aplicação mais pura de justiça e consentânea aos princípios expostos na Constituição Federal”, avalia. “Quanto aos ganhos para a sociedade, além do ganho material, há um efeito simbólico muito grande. Tratar as pessoas de forma diferente em um momento como esse, só promove desunidade, tumulto e desordem.”