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Moro diz que não foi ele que pediu, ‘mas poderia ter sido’, sobre investigação de festival punk no Pará

Organizadores do Facada Fest e membros de bandas participantes estão sendo investigados pela PF por cartazes com críticas a Bolsonaro

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"Se incomoda é porque estamos fazendo barulho", afirmou a organizadora do festival

São Paulo – O Ministério da Justiça abriu inquérito contra um coletivo de artistas de rock por suposto crime contra a honra do presidente Jair Bolsonaro, além de apologia ao homicídio. Membros das bandas THC, Delinquentes, Filhux Ezkrotuz e produtores do evento punk Facada Fest foram interrogados nesta quinta-feira (27), pela Polícia Federal (PF) em Belém. As suspeitas sobre a iniciativa da investigação recaíram sobre o ministro Sergio Moro, que negou responsabilidade sobre a decisão de investigar o grupo, mas disse que “poderia ter sido” ele.

Num dos cartazes de divulgação do evento, Bolsonaro é retratado como o palhaço Bozo empalado com um lápis. Em outro, aparece com um um bigode de Hitler, uma cueca com a bandeira norte-americana e uma arma na mão, vomitando fezes sobre uma floresta. Um terceiro mostra Bolsonaro esfaqueado na cabeça. As duas primeiras são do artista Paulo Victor Magno.

No despacho solicitando a abertura de investigação, Moro afirma que há “elementos que indicam a prática, em tese, de crime contra a honra do Sr. Presidente da República”. Sobre a figura do palhaço empalado, o ministro considerou uma “clara apologia ao atentado criminoso” sofrido por Bolsonaro durante a campanha eleitoral de 2018.

Para o artista Paulo Victor Magno, não há incitação ao crime “Não tem nada ver com apologia ao crime ter feito uma coisa tão caricata daquele jeito, né? Não tem incitação de matar ninguém. Não passamos a ideia de fuzilar oposição”, criticou.

Ao jornal Folha de S.Paulo, ele afirmou que o lápis representa a educação derrotando a “palhaçada” da ignorância, e que a imagem foi produzida em meio aos cortes promovidos pelo Ministério da Educação.

Parcialidade

Para o cientista político e membro do Instituto de Advogados Brasileiros (IAB) Jorge Rubem Folena, o episódio marca, mais uma vez, a parcialidade do ministro. “Vir a público dizer que não fez, mas poderia ter feito, não é papel de um ministro. É se colocar numa postura inferior. Ele perde mais uma oportunidade e mostra a sua parcialidade, desde a época em que ainda era juiz”, afirmou aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria, para o Jornal Brasil Atual, nesta sexta-feira (28).

Ele lembrou que durante as manifestações pelo impeachment da presidenta Dilma Rousseff, ofensas muito mais graves, com tons misóginos, foram proferidas contra ela, sem que nenhuma ação de investigação ou censura fosse tomada. O advogado afirmou ainda que Moro deveria estar preocupado em investigar os financiadores das manifestações convocadas para 15 de março pelos grupos de extrema-direita que apoiam o presidente, pois estariam “patrocinando ações criminosas contra o Estado de direito no Brasil”, na medida em que atacam os demais poderes da República, como o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF).

Conservadores

A primeira investida contra o grupo partiu do presidente do Instituto Conservador, Edson Salomão, que pediu investigação ao Ministério Público Federal de São Paulo (MPF-SP), relacionando os cartazes e o nome do festival ao atentado sofrido por Bolsonaro. Contudo, o Facada Fest existe desde 2017. Os cartazes também foram alvo do vereador Carlos Bolsonaro e do deputado federal Éder Mauro (PSD-PA).

Marcado para julho do ano passado, os organizadores passaram a temer confronto com grupos bolsonaristas, e suspenderam as apresentações, que ocorreriam num espaço público. Nova tentativa, agora em um bar fechado, também fracassou, devido à ação da polícia, que alegou falta de alvará do local. A sequência de cancelamentos causou comoção entre parlamentares de esquerda e movimentos sociais da cidade, que passaram a apoiar o festival, que ocorreu em setembro do ano passado.

“Achávamos que as autoridades já tinham entendido que se tratava de uma manifestação cultural”, diz Josy Lobato, baterista das bandas Klitores Kaos e THC, fundadora do coletivo e autora do nome Facada. “Ficamos surpresos, mas não vamos parar por conta disso. O Facada nasceu na periferia, já sofremos violência todos os dias. Se incomoda é porque estamos fazendo barulho”, afirmou ela à Folha.


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