O que será que será?

Para analista, cenário no país não é nem de impeachment, nem de golpe

Um autogolpe só se concretizaria se Forças Armadas estivessem totalmente unidas ao governo, e isso ainda não ocorre, diz Maria do Socorro Sousa Braga

Reprodução/Facebook/Agência Câmara
Reprodução/Facebook/Agência Câmara
Em reunião com investidores em Madrid nesta sexta (28), Rodrigo Maia afirmou estar confiante nas reformas

São Paulo – Apesar da defesa do impeachment de Jair Bolsonaro crescer entre setores progressistas do país, após o mandatário compartilhar, segundo ele em um grupo de amigos, um vídeo convocando a população a ir às ruas no dia 15 de março, o início de um processo nesse sentido não parece visível no atual cenário. A opinião é da professora Maria do Socorro Sousa Braga, da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar). Por outro lado, ela não vê no momento se desenhar um golpe no estilo militar, ou um “autogolpe”.

Não há ainda uma “peça”, juridicamente, ou motivações políticas que possam unir todas as forças necessárias à aprovação do processo de impeachment, que exige dois terços dos votos da Câmara (342 deputados) para ser aberto. “A gente sabe que pela Constituição ele não pode chamar a população para ir às ruas contra outro poder. Mas não existe ainda a ‘vontade política’”, avalia.

“Precisaria ter uma peça que unisse as forças e a chamada ‘vontade política’ do presidente da Câmara (Rodrigo Maia – DEM-RJ). Se Maia quisesse, teria força para isso, mas não parece que ele queira algo assim no momento.” Cabe ao presidente da Câmara encaminhar o pedido para avaliação do Plenário da Casa. Na opinião de Maria do Socorro, o deputado que comanda a Câmara parece fazer cálculos para as eleições de 2020 e 2022, já que é um candidato forte a se contrapor a “qualquer força progressista, seja Lula ou outra”.

Se a gravidade das intervenções recentes de Bolsonaro – contra o Congresso e o STF ou os insultos à jornalista Patrícia Campos Mello – já caracterizariam crime de responsabilidade, por outro lado “não parece que as forças de direita e centro-direita se uniriam contra Bolsonaro agora”, aponta a professora. “Até porque agora seria o momento.”

O que acontece em caso de impeachment de Bolsonaro?

O processo contra Dilma Rousseff foi desencadeado, pelo então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), em dezembro de 2015, fim do primeiro ano do mandato da então presidenta. “No caso de Dilma, a ‘improbidade’ foi só a peça, mas resultado de uma articulação política. Tem que haver uma peça que una os setores no Congresso, e hoje não tem. Há vários motivos, mas nenhum deles une o Congresso contra Bolsonaro.”

E há ainda outro fator: o mercado financeiro não está ainda suficientemente descontente com o governo. O cenário, na opinião de Maria do Socorro, “tende para termos mais reformas que atinjam ainda mais a classe trabalhadora; a direita e a centro-direita querem essas reformas”. Em outras palavras, num Congresso conservador como o atual, reunir dois terços dos parlamentares contra Bolsonaro parece improvável.

Em viagem oficial à Europa, o presidente da Câmara participou, nesta sexta-feira (28), de encontro com investidores em Madrid. Na ocasião, afirmou estar confiante na aprovação das “propostas para que a gente possa dar uma sinalização forte de que o Brasil está no rumo correto”.

Se for confirmado o acordo que estaria sendo costurado pelos presidentes da Câmara (Maia) e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), pelo qual o Palácio do Planalto “esfriaria” a manifestação do dia 15 de março, enquanto o Congresso afrouxaria o orçamento impositivo, o impeachment fica mais distante ainda. “Mas é complicado os presidentes (das duas casas do Congresso) ficarem subordinados ao governo. Tudo indica que há um acordo, que acaba colocando essas lideranças muito à mercê do Executivo.”

Finalmente, há um outro cálculo político. Nos Estados Unidos, a tentativa do impeachment contra o presidente Donald Trump foi uma iniciativa precipitada que se demonstrou equivocada. Os democratas pretendiam, no mínimo, enfraquecer o presidente, mas o que conseguiram foi o contrário, e o republicano tem grandes chances de se reeleger em outubro deste ano. Mesmo forças políticas conservadoras que apoiariam o impeachment do presidente brasileiro fazem esse cálculo.

Golpe?

Maria do Socorro não vê também um autogolpe se desenhar no horizonte, por enquanto. “As Forças Armadas teriam que estar coesas e unidas totalmente ao governo, e não consigo visualizar isso ainda”, diz. Nesse cenário, Bolsonaro precisaria ter o apoio “maciço” das Forças Armadas, da população e mesmo da mídia.

Bolsonaro tem, concretamente, cerca de um terço da população a seu lado. A manifestação do dia 15 vai ser um termômetro. “Um setor o apoia e vai à rua dia 15, mas estão mais divididos. Penso que vai ter menos gente do que na última manifestação (em 26 de maio de 2019).”


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