Conjuntura

Ruptura com PSL sinaliza isolamento de Bolsonaro

Para o cientista político Paulo Niccoli Ramirez, presidente adota postura "perigosa" com seu intuito de sair do partido pelo qual foi eleito, podendo perder força política. O resultado poderia ser um governo sem bases democráticas e mais autoritário

Marcelo Camargo/EBC
Marcelo Camargo/EBC
"Futuramente isso pode criar um isolamento com o próprio Congresso, quem sabe até mesmo com o STF, que são poderes que tomam posturas contra alguns projetos de Bolsonaro", avalia cientista político

São Paulo – Para manter a imagem de “honestidade” e de “luta contra a corrupção”, o presidente Jair Bolsonaro realiza “uma manobra muito perigosa” ao manifestar seu intuito em deixar o PSL – a sigla partidária pela qual foi eleito –, de acordo com o cientista político e professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo Paulo Paulo Niccoli Ramirez, em entrevista à Rádio Brasil Atual. Na análise do docente, Bolsonaro “tenta uma ruptura com o Congresso” que pode fazê-lo perder força política ou ainda subir o tom autoritário de seu governo.

“Se ele não governa com o PSL, ele governará com o apoio de quem?”, questiona Ramirez aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria. “Das duas, uma: ou ele perderá sua força política, conduzindo, quem sabe, a um futuro impeachment caso sejam reveladas questões de desvio de verba em sua campanha eleitoral, ou então ele tentará de alguma maneira reforçar o seu poder sem as bases democráticas. Um parlamento, por mais conservador que seja, é eleito democraticamente, é uma base democrática, então Bolsonaro governará a partir de seus próprios decretos e vontades”, explica o cientista político e professor.

A prova dessa tensão que se acirra, alimentada pelas denúncias de candidaturas laranjas utilizadas para o desvio de verbas públicas que teriam fortalecido a própria candidatura de Bolsonaro, foi reiterada em evento nesse último final de semana, em São Paulo, o CPAC, considerado um dos maiores congressos conservadores do mundo. Organizado pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), o evento que contou com participação de ministros do governo e alçou Eduardo como sucessor político posto de seu pai. Contudo, o evento não deixou de evidenciar o racha entre os atores políticos do PSL com a ausência de alguns integrantes importantes, como a deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP), além da troca de ofensas neste domingo (13) entre o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) e o senador Major Olímpio (PSL-SP).

Com a sinalização do dissenso, impulsionado pelo próprio presidente da República, Bolsonaro pode se afastar ainda mais do Congresso e, principalmente, da interlocução de outras siglas partidárias com seu partido, como avalia Ramirez. “A longo e médio prazo isso pode resultar numa paralisia decisória por parte de Bolsonaro, e a gente não pode esquecer que saindo do PSL, a grande base de apoio do presidente passa a ser o Exército”, ressalta o cientista político, sobre o que considera como “isolamento” de Bolsonaro.

Reportagem da Folha de S. Paulo nesta segunda-feira (14), indica que o presidente ampliou a presença de militares em 30 órgãos federais.

A manipulação da Lava Jato 

A recente denúncia divulgada pela Vaza Jato nesta segunda-feira (14) comprova novamente ” indícios de que a Lava Jato é uma investigação tendenciosa que evita algum tipo de interpretação mais neutra, coisa que evidentemente não existe, mas uma tentativa muita mais política de intervenção sobre as dinâmicas do país”, avalia o cientista político Paulo Niccoli Ramirez sobre a atuação da força-tarefa de Curitiba que escolheu o momento para divulgar a denúncia do sítio de Atibaia contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para desviar a atenção da fracassada colaboração premiada do empresário Joesley Batista, articulada pelo então procurador-geral da República Rodrigo Janot.

Preocupados com a imagem da Lava Jato, uma vez que o episódio colocava em xeque a credibilidade do MPF, a força-tarefa de Curitiba para “criar distração” e “mostrar serviço”, promoveram nova ofensiva contra o ex-presidente cinco dias depois da notícia-bomba. “Isso vai demonstrando uma tentativa da Lava Jato de deslegitimar a imagem do PT, principalmente a figura de Lula, e isso permanece até hoje”, afirma o cientista político.

Ouça a entrevista na íntegra

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