Estado de direito

‘O Supremo pode muito, mas não pode tudo’, diz Kakay no julgamento sobre prisão em 2ª instância

“Vivemos um tempo em que cumprir a Constituição passou a ser um ato revolucionário", afirmou advogado, ao destacar que o texto constitucional é inequívoco

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"Essa ação talvez fosse a ação mais simples de ser julgada", disse criminalista aos ministros do Supremo

São Paulo – Como representante do Instituto de Garantias Penais (IGP), que entrou como amici curiae no julgamento da prisão após condenação em segunda instância, o advogado criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro (Kakay) fez veemente discurso pelo cumprimento da Constituição e do Estado democrático de direito. O advogado assinou a Ação Declaratória de Constitucionalidade 43, mas foi destituído por pedido do PEN, partido que patrocinou a ação.

“Essa destituição é uma honra para mim e demonstra que sempre estive do lado certo”, disse. “Quando entramos (com a ação), tivemos uma pressão midiática dizendo que tudo era contra a Lava Jato. Não havia nada contra a Lava Jato.” Kakay disse que o cliente preferencial que defendeu na ação “foi o negro, o pobre e a prostituta”.

“Essa ação talvez fosse a ação mais simples de ser julgada. É cumprir ou não a clareza de um texto constitucional. Disse aqui, em respeito a vossas excelências, que o Supremo pode muito, mas não pode tudo, porque nenhum poder pode tudo no Estado democrático de direito.”

“Vivemos um tempo em que cumprir a Constituição passou a ser um ato revolucionário. É absolutamente simples o que se pede nesse processo, embora com enorme repercussão”, disse. “O que pedimos é uma analise de um texto que é inequívoco.”

Segundo ele, não se pode admitir que cada juiz tenha a interpretação que quiser de cláusulas pétreas “absolutamente claras”. “Ou então estaremos colocando em risco o Estado democrático de direito, que talvez seja a maior função desta casa.”

O advogado afirmou, “com todo o respeito”, que durante o processo já afirmou, no próprio STF, durante julgamento de liminares de outubro de 2016 (quando a corte definiu que a prisão após segunda instância era admissível), que “o tribunal flexibilizou um direito constitucional para levar milhares às masmorras medievais que são as cadeias brasileiras”.

Kakay também desmentiu que a ação “foi  programada  para beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Ora, apenas em 2018 houve condenação no TRF4. São falácias.”

Kakay terminou sua fala citando um célebre jurista: “É com todo o respeito que digo que o que se pede aqui, em homenagem ao professor Celso Antônio Bandeira de Mello, é: ‘o que se pede é que se cumpra a Constituição’.”

Em sustentação oral na ADC 54, o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo rebateu o argumento de que eventual decisão do STF contra a prisão em segunda instância incentivaria a impunidade. “O principal problema está no sistema prisional. Lá as pessoas entram pequenos delinquentes e saem criminosos. É entrar lá e sair destruído. Ou resolvemos o problema ou não parará a impunidade. Estaremos tratando um tumor com uma pequena pastilha, mas estaremos agravando este tumor.”

Cardozo afirmou que o que está em jogo no julgamento é a “Constituição Cidadã” de 1988. “A Constituição quis dar segurança máxima para que alguém não pudesse perder um bem tão precioso quanto a liberdade. São vidas humanas, não gado. Seres humanos que não são tratados como seres humanos se transformam em bestas feras.”