Contornando o público

Mídia manipula debate sobre julgamento da prisão em segunda instância no STF

Juíza Raquel Braga avalia que cobertura midiática tem feito "ameaça" e até "inversão de discurso" como se a pauta do Supremo nesta quinta (17) não fosse um direito e garantia constitucional

Nelson Jr. / SCO / STF
Nelson Jr. / SCO / STF
Execução antecipada, que será julgada nesta quinta (17), é responsável por um quarto da população encarcerada hoje

São Paulo – É incontestável para a Constituição Federal o direito à ampla defesa jurídica de qualquer cidadão, definida pelo artigo 5º. Mas, ainda assim, a imprensa corporativa no Brasil tem passado por cima dessa garantia fundamental no debate sobre prisão após condenação em segunda instância, a chamada execução antecipada da pena, que será julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quinta-feira (17). A avaliação é da magistrada Raquel Braga, integrante da Associação Juízes pela Democracia (AJD).

A questão que vai ao plenário da Corte tem por base o debate sobre a constitucionalidade da prisão em segunda instância que, ao contrário do direito à defesa, não está prevista na Carta Magna. Em entrevista à Rádio Brasil Atual, a juíza avalia que desde o momento que o presidente do STF, o ministro Dias Toffoli, pautou o processo, a cobertura dos meios de comunicação hegemônicos tem apresentado o tema quase como um tipo de “ameaça ou fazendo uma inversão do discurso, como se a ausência desse julgamento não fosse importante por tratar de uma garantia e de um direito constitucional”, analisa a integrante da ADJ.

O apelo midiático teria, na verdade, preocupação com o veto à prisão após segunda instância – entendimento dado como certo nos bastidores de Brasília – mas que a mídia ressalta quase como tom de “impunidade” pelo alcance da decisão, que pode refletir sobre o caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, apesar de a execução antecipada da pena encarcerar hoje pelo menos um quarto da população do sistema prisional, como mostra um levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

“Sim, (a imprensa) sempre faz essa confusão em nome da corrupção, como se quem defendesse o contrário defendesse a corrupção, Não, ninguém defende a corrupção. O que nós defendemos, os juízes democráticos, o próprio MP (Ministério Público) pela democracia, é que esses direitos sejam assegurados, exercido para todos”, explica Raquel, citando como exemplo as prerrogativas da própria Lava Jato, que condenou Lula, e para delatores usou de “acordos de leniência” que beneficiaram diversos empresários envolvidos em esquemas de corrupção, mas que tiveram uma pena mais branda por “contribuir” com a Justiça.

“É sempre um jogo de palavras, que misturam o político com o jurídico”, ironiza a juíza. “Mas na verdade toda essa operação visava única e exclusivamente um partido e, nesse partido, algumas figuras centrais que poderiam pôr em risco os projetos neoliberais de uma parcela da população, inclusive financiada por interesses de potências estrangeiras. Isso é que nos revela os vazamentos da equipe do The Intercept Brasil da imprensa alternativa para tentar esclarecer ao cidadão do jogo e da manipulação da imprensa, que são tão presentes e cada vez mais reveladas na sequência de vazamentos”, ressalta Raquel sobre o papel da mídia nos desmandos da operação Lava Jato denunciada pelo próprio ministro da STF Gilmar Mendes.

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