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Moro autorizou devassa na vida de filha de investigado da Lava Jato para tentar prendê-lo

Mesmo sem evidências de que participava de algum esquema ilegal, filha de empresário teve casa invadida por policiais com metralhadoras e fazendo ameaças ao filho, de 7 anos

Marcos Corrêa/PR
Marcos Corrêa/PR
Moro, agora ministro de Bolsonaro, participa do desfile do 7 de Setembro em Brasília. Denúncias mostram que ex-juiz foi mentor do golpe, com requintes de crueldade

São Paulo – Nova reportagem da série Vaza Jato mostra que os procuradores do Ministério Público Federal (MPF) em Curitiba pediram duas vezes ao então juiz Sergio Moro operações contra a filha de um empresário alvo da Lava Jato que vive em Portugal como forma de forçá-lo a se entregar.

O plano, revelado em mensagens de Telegram trocadas entre procuradores e entregues ao The Intercept Brasil por uma fonte anônima, era criar um “elemento de pressão”, como disse o procurador Diogo Castor de Mattos, sobre o empresário luso-brasileiro Raul Schmidt.

A justiça portuguesa havia determinado o cumprimento da extradição de Schmidt para o Brasil, em janeiro de 2018, mas ele não foi encontrado onde morava, em Lisboa, pelas autoridades locais.

Para forçá-lo a se entregar, o MPF apelou a Moro mirando Nathalie Angerami Priante Schmidt Felippe, filha do investigado: queria que o passaporte dela fosse cassado e que ela fosse proibida de sair do Brasil. Apesar de ser titular de contas no exterior que receberam propinas, ela não era suspeita de planejar e executar crimes.

A sugestão de intervir contra Nathalie foi do procurador Diogo Castor de Mattos, que a fez no grupo “Filhos do Januário 2″, no aplicato Telegram, em 1º de fevereiro. No dia seguinte, o MPF pediu a Moro que a filha de Raul Schmidt fosse proibida de deixar o Brasil. Não queria apenas a apreensão do passaporte, mas também outras medidas: busca e apreensão na casa de Nathalie, bloqueios em contas bancárias dela e da empresa dela, quebras de sigilo fiscal e do sigilo das mensagens no WhatsApp.

Na primeira tentativa, Moro vetou a manobra dos procuradores. “Apesar dos argumentos do MPF, não há provas muito claras de que Nathalie Angerami Priante Schmidt Felippe tinha ciência de que os valores tinham origem ilícita e/ou eram fruto de atos de corrupção”, argumentou num despacho.”

Meses depois, em maio, após novo fracasso em buscas por Schmidt em Portugal, a Lava Jato reapresentou seu pedido a Moro. Dessa vez, sem que houvesse qualquer suspeita adicional contra ela, o juiz mudou de ideia e deu sinal verde ao desejo da Lava Jato, que incluía uma varredura na casa, nas comunicações e nas contas de Nathalie.

No dia seguinte, os policiais cumpriram o mandado de busca e apreensão na casa da filha do investigado, no Rio de Janeiro. A defesa alegou que ela foi coagida pela Polícia Federal, na ocasião, a dizer onde o pai estava.

Nathalie teve o passaporte retido e foi alvo de busca e apreensão em casa, no Rio de Janeiro, em 24 de maio. Nessa busca, segundo a defesa dela alegou quatro dias depois em pedido de habeas corpus ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, “três agentes da Polícia Federal portando metralhadora ingressaram na residência da paciente de forma truculenta, exigindo, aos berros, que ela revelasse o atual paradeiro do seu genitor, sob ameaça de ‘evitar dor de cabeça para seu filho’”, referindo-se à criança dela, um menino então com sete anos.

O plano, no entanto, não teve tempo de ser testado. No mesmo dia, Raul Schmidt conseguiu extinguir seu processo de extradição em Portugal. A Lava Jato tenta até hoje trazê-lo ao Brasil.

Leia a reportagem completa no The Intercept Brasil