Vaza Jato

Glenn no Roda Viva foi ‘aula’ de jornalismo e processo penal, afirma advogado pela democracia

Integrantes de veículos de imprensa - que se abasteceram fartamente dos vazamentos da Lava Jato - trataram jornalista do The Intercept como um "fora da lei", em programa da TV Cultura de São Paulo

©TV Cultura/reprodução
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Roda Viva tratou público como "analfabeto político", ao ignorar principais questões reveladas pela Vaza Jato

São Paulo –O advogado criminalista, professor de Processo Penal na UniCuritiba e integrante do coletivo Advogadas e Advogados pela Democracia, José Carlos Portela Junior, criticou a atuação da banca entrevistadora do programa Roda Viva, da TV Cultura de São Paulo, que na noite da segunda-feira (2) teve o jornalista americano Glenn Greenwald, fundador do site The Intercept Brasil, em seu centro. Segundo ele, em vez de discutir as ilegalidades cometidas pelos procuradores da Lava Jato e pelo então juiz Sergio Moro trazidas pela série de reportagens que passou a ser chamada de “Vaza Jato”, preferiram tratar o convidado como um “fora da lei”, baseado apenas na suposição de que ele teria obtido as informações reveladas a partir de supost “atividade criminosa”.

“O que Greenwald está fazendo é amparado pela Constituição Federal. É o direito de informar ao público sobre negócios públicos, notadamente quando existem questões graves, como a revelação de que o aparato de Justiça estava contaminado por interesses privados e partidários”, afirmou Portela ao jornalista Glauco Faria, no Jornal Brasil Atual desta terça-feira (3),

“Não tocaram (os entrevistadores) em temas importantes como a parcialidade do Moro, as atividades privadas de Deltan, contaminando a sua atuação como procurador, as tramoias nos bastidores para que recursos que permitiriam a soltura do ex-presidente Lula não fossem atendidos. Não se discutiu se a Lava Jato estaria sendo conduzida por motivos partidários evidentes, no sentido de tirar Lula da corrida eleitoral, para colocar Bolsonaro no poder. Nada disso foi debatido. Isso ficou evidente para o público, que não é analfabeto político, como eles acham”, afirmou o advogado.

Além da defesa da atividade jornalística, Portela destacou que Glenn, que também é advogado, deu “verdadeira aula” sobre como deve ser conduzido um processo criminal dentro dos limites da legalidade, postura que não foi adotada pelos “agentes” da Lava Jato. Ele citou o constrangimento dos participantes do programa quando Greenwald alegou que a imprensa tradicional divulgou, sem qualquer tipo de questionamento, os conteúdos de delações e outras informações de processos que corriam em segredo de Justiça, que foram vazados pela própria Lava Jato.

Portela afirmou que foi “constrangedor identificar que jornalistas de importantes veículos de imprensa estavam mancomunados com agentes da Lava Jato para derrubarem a democracia”, já que as informações reveladas pela “Vaza Jato”demonstraram a atuação política dos integrantes da chamada “República de Curitiba”, que se especializou em práticas não republicanas para conquistar objetivos pessoais.

Desconfiança na Justiça

Sobre o última reportagem da “Vaza Jato”, que mostrou que o procurador Deltan Dallagnol captou investimentos de grandes empresários para financiar um “instituto de fachada”, Portela destaca que essa “contaminação” de um processo público por interesses privados representa “uma porrada na credibilidade do sistema de Justiça”. Uma empresária que foi “investidora-anjo” da organização, a advogada Patrícia Tendrich Pires Coelho, seria depois investigada pela Lava Jato, mas sem ter sido denunciada pela operação.

“Há dúvidas. É isso que se pretende evitar quando se determina que o MP e o Judiciário não devem ter relações com agentes privados. É para que se evite essa desconfiança – que mina a credibilidade do público no sistema de Justiça. Ainda que não tenhamos evidência concreta de que ela não foi indiciada por ter doado dinheiro para o instituto, surge uma dúvida. E essa dúvida é problemática. Sempre que o sistema de Justiça é colocado nessa posição, de ser alvo desse tipo de desconfiança, isso complica muito a vida da democracia”, afirmou Portela.

Confira a entrevista completa do advogado José Carlos Portela Junior

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