dois pesos...

Lentidão ou rapidez dos processos na Justiça depende dos ‘humores da política’, diz analista

Para Wagner Romão, “falar de reforma do Judiciário não está tão em voga, por haver um cálculo politico, sobretudo dos agentes do Legislativo"

José Cruz/Agência Brasil
José Cruz/Agência Brasil
Cálculo político: Moro e Raquel Dodge representam um sistema de Justiça cada vez com menos credibilidade no mundo

São Paulo – A falta de credibilidade do Judiciário brasileiro, diante de juristas internacionais e parcela importante dos operadores do Direito no Brasil, tem crescido diante da parcialidade da Operação Lava Jato e, principalmente, após as revelações do The Intercept Brasil a partir do início de junho. Nesta segunda-feira (12), o site divulgou informações segundo a quais o ex-juiz Sergio Moro instruiu procuradores, e especificamente Deltan Dallagnol, a não apreender celulares de Eduardo Cunha. A orientação destoa dos procedimentos da chamada força-tarefa.

A atuação da Lava Jato e a lentidão ou celeridade com que processos são encaminhados no Judiciário brasileiro seriam dois aspectos a ser abordados numa eventual reforma do Judiciário, mas uma iniciativa nesse sentido não está na pauta dos agentes políticos do país no momento. “Hoje, falar de reforma do Judiciário não está tão em voga, por haver um cálculo politico, sobretudo dos agentes do Legislativo, sobre o que é mexer nesse vespeiro da Justiça”, avalia o cientista político Wagner Romão, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em entrevista ao jornalistas Glauco Faria e Marilu Cabañas, na Rádio Brasil Atual.

“O modo como a Procuradora Geral da República e os ministros do Supremo Tribunal Federal  escolhem os processos aos quais vão dar atenção é absolutamente arbitrário”, diz. “Há lentidão em alguns casos e urgência para outros.” Segundo o jornal Folha de S. Paulo, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, segurou por mais de 120 dias investigações contra o presidente Jair Bolsonaro (PSL), diante da possibilidade de ser reconduzida ao comando do Ministério Público Federal (MPF).

O caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é emblemático da rapidez com que o sistema de Justiça e os tribunais encaminham os processos, quando há interesse nisso. “Depende dos humores da política”, observa Romão. Ele lembra o episódio da semana passada, quando a possibilidade de Lula ser transferido mobilizou mais de 70 deputados que foram pressionar o STF.

“De todos os lados, o Judiciário está prostrado frente às injunções da política e o STF se colocou nessa posição. Por isso, temos que ousar pensar em maneiras de controle mais efetivo do Judiciário. Infelizmente, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) é absolutamente inoperante”, afirma o analista da Unicamp.

Em debate na noite desta segunda, a propósito dos governos de extrema-direita como o brasileiro de Jair Bolsonaro, a filósofa Marilena Chaui destacou: “Com exceção dos Estados Unidos, eles (esses governos) passam a ter controle total do Judiciário. Oferecem ao magistrado proteção em troca de lealdade. Não temos um judiciário atrelado, mas estarrecido pelo medo”.

Nas últimas revelações do Intercept, é explícita a ascendência do então juiz Sergio Moro sobre o Ministério Público de Curitiba, sobre o que o órgão deveria ou não fazer, avalia Romão. Como se Moro dissesse “não é todo mundo que a gente deve tratar do mesmo jeito”. “Fica claro o protagonismo do Moro e a parcialidade dele na condução da Lava Jato.”

Um dos momentos em que a parcialidade ficou evidenciada foi quando o atual ministro da Justiça, ainda em Curitiba, recomendou não incomodar o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, para não “melindrar” um potencial aliado.

Ouça a entrevista de Wagner Romão à Rádio Brasil Atual