MEMÓRIA

Documentos do Itamaraty e SNI reconhecem que ditadura perseguiu inocentes

Documentos históricos mostram que órgão oficiais do Estado reconheceram situação de sete desaparecidos, entre eles Fernando Santa Cruz, pai do presidente da OAB

Reprodução / Metrópoles
Reprodução / Metrópoles
Comunicado do Ministério das Relações Exteriores em resposta a pedido da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre desaparecidos informou, em 1981, que nada constava contra essas pessoas – dentre elas, o pai do presidente da OAB

Brasília – Depois da polêmica com acusações do presidente Jair Bolsonaro (PSL) contra o desaparecido político Fernando Santa Cruz, pai do atual presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, documentos históricos, pesquisados pelo jornalista Eumano Silva e divulgados hoje (19) pelo portal Metrópoles, mostram que o próprio Estado já inocentou Santa Cruz. Um comunicado do Ministério das Relações Exteriores em resposta a pedido da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre sete desaparecidos informou, em 1981, que nada constava contra quatro dessas pessoas – dentre elas, o pai do presidente da OAB.

Além de Fernando, também constam no documento Joel Vasconcelos Santos, Ana Rosa Kucinski e Wilson Silva como desaparecidos políticos cuja situação foi reconhecida pelo governo como “sem qualquer antecedente criminal”. Esse documento do Itamaraty foi avalizado pela cúpula militar.

No mesmo despacho, destaca Eumano Silva, também foi comunicada a absolvição de dois nomes listados entre os desaparecidos durante a ditadura e julgados à revelia: Edgard Aquino Duarte e Ísis Dias de Oliveira. Um sétimo nome, que tinha sido alvo de indagações sobre sua situação no mesmo pedido feito pela ONU, o de Mário Alves de Souza Vieira, foi o único da lista que recebeu condenação por atos contra a ditadura.

Conforme a pesquisa feita pelo jornalista, o documento, encontrado no Arquivo Nacional, está classificado como “confidencial”, “secreto” e “urgentíssimo”. Foi preparado para responder a questionamento feito pelo chamado Grupo de Trabalho sobre Desaparecidos Forçados ou Involuntários, ligado à Comissão dos Direitos Humanos da ONU sobre essas pessoas, mediante pedido feito por seus familiares.

O documento foi elaborado com a ajuda do Conselho de Segurança Nacional (CSN), o Serviço Nacional de Informações (SNI) e o Ministério da Justiça, que na época, compunham o chamado “Grupo Informal de Estudos sobre os Direitos Humanos”, vinculado ao governo. Grupo este, que tinha a missão de responder e tratar das demandas de outros países com pedidos de informação ao governo sobre tais casos.

O jornalista responsável pela pesquisa destaca, no seu texto, que os três ramos da segurança acumulavam dados e prontuários relativos a todos os suspeitos de atuação contra o governo militar, já que, ligado à Presidência da República, o SNI coordenava as atividades de espionagem, informação e contrainformação da ditadura. E o CSN assessorava o Palácio do Planalto em assuntos de segurança nacional.

Poucas semanas atrás, o presidente Jair Bolsonaro disse que Fernando Santa Cruz tinha sido morto pelos próprios companheiros. Durante décadas, a família de Santa Cruz procurou por ele ou pelo seu corpo. O nome de Santa Cruz já consta no relatório da comissão da verdade como desaparecido político.

Para muitos especialistas, o documento que agora vem a público consiste em mais uma prova de que a ditadura prendeu, torturou e matou pessoas que não participaram de crimes.

Leia também

Últimas notícias