Omissão

Para PFDC, “chefe de Estado não pode manter sob sigilo informações sobre paradeiro de desaparecido político”

Nota pública de órgão do MPF destaca, em relação ao crime de desaparecimento forçado, que qualquer pessoa com conhecimento do paradeiro de uma vítima e que não o revela à Justiça pode ser considerada partícipe do delito

Antonio Cruz/Agência Brasil
Antonio Cruz/Agência Brasil

São Paulo – A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), do Ministério Público Federal, divulgou nota pública a respeito da declaração do presidente Jair Bolsonaro (PSL) sobre a morte de Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira, pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz. O texto menciona as famílias que convivem com situações de desaparecimento e afirma que “o respeito a esse penar é um sinal de humanidade e dignidade, praticado por distintas civilizações e todas as religiões”.

“Por que a OAB impediu que a Polícia Federal entrasse no telefone de um dos caríssimos advogados? Qual a intenção da OAB? Quem é essa OAB? Um dia, se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, conto pra ele. Ele não vai querer ouvir a verdade. Conto pra ele”, disse Bolsonaro ontem (29).

Fernando Augusto Santa Cruz de Oliveira desapareceu em fevereiro de 1974, após ser preso por agentes do DOI-Codi, no Rio de Janeiro. Era estudante de Direito, funcionário do Departamento de Águas e Energia Elétrica em São Paulo e integrava o grupo Ação Popular. A Comissão Nacional da Verdade concluiu que Fernando “foi preso e morto por agentes do Estado brasileiro e permanece desaparecido, sem que os seus restos mortais tenham sido entregues à sua família”. E acrescenta que a ação “foi cometida em um contexto de sistemáticas violações de direitos humanos perpetradas pela ditadura militar instaurada no Brasil em abril de 1964”.

Crime permanente

De acordo com a PFDC, o crime de desaparecimento forçado é permanente, o que significa que sua consumação persiste enquanto não se estabelece o paradeiro da vítima. Assim, qualquer pessoa que tenha conhecimento de seu destino e não o revela à Justiça pode ser considerada partícipe do delito.

O texto, assinado pela procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, e pelo procurador-adjunto Marlon Weichert, ressalta ainda a gravidade desse tipo de delito. “A conduta de desaparecimento forçado por agentes do Estado ou por pessoas ou grupos de pessoas agindo com a autorização, apoio ou aquiescência do Estado, é uma grave violação aos direitos humanos, conforme estabelecem duas convenções internacionais promulgadas e ratificadas pelo Brasil”, diz a nota. “Além disso, é um crime internacional quando praticado no contexto de uma perseguição generalizada e sistemática a uma população civil, nos termos do Estatuto de Roma.”

“Criminalmente, o desaparecimento forçado é um dos delitos que merece a mais severa sanção, pois ele reúne, numa única conduta, diversas ações ilícitas, que se originam com a prisão ou detenção ilegal, perpassam a prática de tortura, falsidade sobre o paradeiro, subtração de provas, obstrução da Justiça e, quase sempre, culminam no homicídio e na ocultação de cadáver. É, por isso, denominado crime pluriofensivo”, diz a nota pública. “Qualquer autoridade pública, civil ou militar, e especialmente o Presidente da República, é obrigada a revelar quaisquer informações que possua sobre as circunstâncias de um desaparecimento forçado ou o paradeiro da vítima. Como referido, além de ser o comportamento ético e moral esperado de qualquer cidadão e especialmente de um agente do Estado, é um dever jurídico, inclusive passível de sancionamento em caso de desrespeito.”

Confira a íntegra da nota pública.

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