PF, subordinada a Moro, teria pedido investigação de Glenn Greenwald e do Intercept
Informação é do site 'O Antagonista', pró-Moro. Parlamentares e jornalistas reagem à quebra da liberdade de imprensa, prática comum às ditaduras
Publicado 02/07/2019 - 19h37
São Paulo – Conhecido pela defesa da Operação Lava Jato e por atacar políticos da esquerda brasileira, o site O Antagonista publicou nesta terça-feira (2) a informação de que a Polícia Federal pediu ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) um relatório das atividades financeiras de Glenn Greenwald, editor do The Intercept. Segundo o site, o objetivo seria verificar alguma movimentação atípica relacionada à “invasão” dos celulares de integrantes da Lava Jato. “Trata-se de uma ação de inteligência. O advogado americano só será investigado se houver algum indício de que tenha encomendado o serviço criminoso”, finaliza o texto.
Durante o depoimento de Sergio Moro na Câmara dos Deputados na tarde desta terça, o deputado federal Marcio Jerry (PCdoB-MA) questionou o ex-juiz e atual ministro de Justiça se a PF estaria investigando o jornalista. Moro não respondeu. “Algo de extrema gravidade”, destaca o parlamentar.
Muitos parlamentares e jornalistas reagiram nas redes sociais. O deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) lembra que Moro, como ministro da Justiça, é o chefe da Polícia Federal. “Ao colocar o órgão para investigar movimentações financeiras do jornalista, Moro está aparelhando a estrutura do governo brasileiro para promover perseguição política e coação!”
O ex-prefeito e ex-ministro Fernando Haddad afirmou que Moro age para intimidar o jornalista que o investiga. “Prática é comum em ditaduras. Glenn disse que não recua, apesar das ameaças. Moro, na Câmara, reconhece ‘algumas’ das mensagens divulgadas.”
Para o ex-deputado e advogado Wadih Damous, se isso for verdade, vai se configurar ato de improbidade da autoridade que determinar a medida.
“Moro está usando o Ministério da Justiça e a Polícia Federal pra atacar a liberdade de imprensa”, criticou o deputado federal Marcelo Freixo (Psol-RJ). “Atitude típica de regimes autoritários.”
Investigue tudo
Gleen Greenwald disse a Moro, via Twitter, para investigar tudo o que quiser. “Grupos de liberdade de imprensa em todo o mundo terão muito a dizer sobre isso. Enquanto você usa táticas tirânicas, eu continuarei reportando junto com muitos outros jornalistas de muitos outros jornais e revistas”, disse, a respeito das reportagens que vem veiculando, sobre a troca de mensagens por meios das quais Moro orientava a atuação dos procuradores da Lava Jato.
“Como eu disse desde o início – tanto no caso Snowden quanto no caso Moro –, nenhuma intimidação ou ameaça interromperá as reportagens. Ameaças do estado só servem para expor seu verdadeiro rosto: abuso do poder – e por que eles precisam de transparência de uma imprensa livre.”
Aqui está a diferença entre a) jornalistas reais que acreditam na liberdade da imprensa e b) porta-voz de políticos: quando o @o_antagonista/@RevistaCrusoe foi censurado, fui um dos primeiros as sair em defesa. Eles agora estão liderando o esforço para criminalizar meu jornalismo pic.twitter.com/lDgy80vc0V
— Glenn Greenwald (@ggreenwald) July 2, 2019
Além da minha defesa da liberdade de @o_antagonista/@RevistaCrusoe, o @TheInterceptBr publicou o artigo censurado – mesmo que pensássemos que era jornalismo ruim – em solidariedade à sua liberdade de imprensa. Isso é o que os jornalistas reais fazem: https://t.co/eim69ANCsO
— Glenn Greenwald (@ggreenwald) July 2, 2019
George Marques, jornalista da Fórum, relata que o site entrou em contato com a Polícia Federal. “À Fórum, a PF disse que investigações são sigilosas e não podem ser confirmadas. Mas então vazaram pro site que atua como porta-voz do ministro? Abuso de poder?”
A pitada de humor e ironia veio do jornalista José Simão. “Cuba Urgente! Venezuela News! Moro manda a PF mandar a Coaf investigar atividades financeiras do Glenn Greenwald! Coisas do Conje!”
ONU e OEA contra ataques a Glenn
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e a Organização das Nações Unidas (ONU) manifestaram-se contra as ameaças e os ataques ao jornalista Glenn Greenwald no Brasil, informa o Diário do Centro do Mundo.
O relator especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, Edison Lanza, e o Relator Especial das Nações Unidas para a Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de Opinião e Expressão, David Kaye, emitiram um comunicado informando ao mundo “as ameaças, desqualificações por parte das autoridades e as intimidações recebidas pelo jornalista… bem como com seus parentes, após a divulgação de informações e denúncias de interesse público”.
E destacaram o importante papel desempenhado pela mídia para a democracia. “Como resultado, os jornalistas que investigam casos de corrupção ou ações impróprias por autoridades públicas não devem estar sujeitos a assédio judicial ou outro tipo de assédio em retaliação por seu trabalho.”
O Estado brasileiro foi cobrada em sua “obrigação de prevenir, proteger, investigar e punir a violência contra jornalistas, especialmente aqueles que foram submetidos a intimidação, ameaças ou outros tipos de violência”.