Vaza Jato

Moro determinou vazamento de dados sigilosos da Venezuela, diz Intercept

Novos diálogos indicam que a Lava Jato queria interferir na política da Venezuela, em resposta ao endurecimento do governo do país com o Brasil

Marcelo Camargo/ABR
Marcelo Camargo/ABR
Com vazamento, houve “risco de vida” de ex-funcionários da Odebrecht, de procuradores e da própria população venezuelana

São Paulo – O The Intercept Brasil e o jornal Folha de S.Paulo divulgaram hoje (7) novos diálogos de Sergio Moro com procuradores da Lava Jato, que indicam uma articulação do ex-juiz federal para vazar dados da delação da Odebrecht sobre a Venezuela,  que estava sob sigilo. Segundo o Intercept, “as conversas privadas pelo aplicativo Telegram em agosto de 2017 indicam que a principal motivação para o vazamento era política, e não jurídica, e que os procuradores sabiam que teriam que agir nas sombras”. Para a Folha, “os diálogos indicam que o objetivo principal da iniciativa era dar uma resposta política ao endurecimento do regime imposto pelo ditador Nicolás Maduro ao país vizinho, mesmo que a ação não tivesse efeitos jurídicos”.

Os novos diálogos reforçam que o atual ministro da Justiça do governo de Jair Bolsonaro (PSL) agia como chefe da força-tarefa, e não como juiz parcial.

“Talvez seja o caso de tornar pública a delação dá Odebrecht sobre propinas na Venezuela. Isso está aqui ou na PGR?”, sugeriu Moro a Dallagnol em 5 de agosto de 2017. Um ano antes, executivos da construtora haviam fechado acordo com a Lava Jato e admitido pagamento de propina a outros governos, além do Brasil. O objetivo era obter benefícios em negociações. Um desses países seria a Venezuela, presidida por Nicolás Maduro, aliado do PT.

As conversas inéditas indicam que o chefe da força-tarefa,  o procurador Deltan Dallagnol, estava consciente da ilegalidade do vazamento das informações sobre a Venezuela,  sob sigilo.

“Não dá para tornar público simplesmente porque violaria acordo, mas dá pra enviar informação espontânea [à Venezuela] e isso torna provável que em algum lugar no caminho alguém possa tornar público”, escreveu Dallagnol.

Outros procuradores que participavam da conversa também demonstravam preocupação com as articulações de Moro e Dallagnol para prejudicar o governo venezuelano. “Vejam que uma guerra civil lá é possível e qq ação nossa pode levar a mais convulsão social e mais mortes”, escreveu Paulo Galvão. “Imagina se ajuizamos e o maluco manda prender todos os brasileiros no territorio venezuelano”, disse Athayde Ribeiro Costa.

Mas  Dallagnol  insistia, conforme as conversas. “PG, quanto ao risco, é algo que cabe aos cidadãos venezuelanos ponderarem”, respondeu à mensagem de Paulo Galvão. “Eles têm o direito de se insurgir”, completou o chefe da força-tarefa.

O vazamento das informações sigilosas sobre a delação da Odebrecht na Venezuela foi concretizado outubro de 2017, poucos meses após a ex-procuradora-geral da Venezuela, Luísa Ortega Díaz, já destituída, ter se exilado no Brasil.

Ortega chegou antes deles no Brasil, em 22 de agosto, duas semanas depois de a força-tarefa começar a se movimentar. “Vcs que queriam leakar as coisas da Venezuela, tá aí o momento. A mulher está no Brasil”, escreveu o procurador Paulo Galvão.

Os colegas reagiram como se Galvão estivesse brincando. Semanas depois, já em outubro, Ortega publicou em seu site dois vídeos, com trechos de depoimentos do ex-diretor da Odebrecht na Venezuela, Euzenando Azevedo, nos quais ele admite ter repassado US$ 35 milhões da empreiteira à campanha eleitoral de Maduro.

Segundo o Intercept, na delação, Ortega também admitiu ter doado US$ 15 milhões para a campanha do candidato da oposição, Henrique Capriles, o que não foi incluído nos vídeos divulgados por ele. Faltavam cinco dias para as eleições para os governos estaduais quando a população venezuelana viu nas redes o ex-diretor da Odebrecht no país detalhar a corrupção no governo Maduro.

Ainda segundo o site dirigido por Glenn Greenwald, o vazamento de informações sigilosas da delação teria gerado, inclusive, “risco de vida” de ex-funcionários da empresa, procuradores e da própria população venezuelana.

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