Moro se defende com ameaça. ‘Não se constrói Estado de direito com essa forma de justiça’
Questionado sobre seus erros, ex-juiz cita número de prisões efetuadas para dizer que Lava Jato fez justiça. Professor critica
Publicado 03/07/2019 - 11h35
São Paulo – Quando tem seus métodos à frente da Lava Jato questionados, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, já mostrou uma viciada argumentação: não nega diretamente os diálogos com o procurador da operação Deltan Dallagnol, mas questiona a origem da fonte do site jornalístico The Intercept Brasil, além de avaliar sua conduta como algo “trivial”. Mas é também desviando o foco de sua atuação questionável como juiz, para a Operação Lava Jato, que Moro reforça o que pode, na prática, resultar no desmonte do Estado de Direito: o punitivismo. A avaliação é do professor do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Políticas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP) Rogério Arantes, em entrevista à Rádio Brasil Atual.
Moro, que em conversa com Dallagnol parece atuar como chefe da força-tarefa, violando o sistema acusatório que impede o juiz de descumprir o princípio de imparcialidade, defende a Lava Jato pelo número de prisões realizadas no âmbito da operação, como se a promoção de justiça estivesse associada ao cárcere. Algo que, de acordo com Arantes, sempre foi usado contra a população mais pobre do país.
“Não é o padrão que desejamos nem para ‘os de cima’, nem para os ‘de baixo’. Não se constrói um Estado de direito praticando justiça dessa maneira. Não se chega a uma aplicação justa da lei por métodos heterodoxos, que desrespeitam as garantias do processo legal, como a gente tem visto neste caso da Lava Jato e em tantos outros”, avalia o professor aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria.
Um levantamento feito pela advogada criminalista e integrante da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) Clarissa Nunes, ao jornal Brasil de Fato, mostra que de 2014 para cá cerca de 160 condenações foram assinadas pelo ex-magistrado, em um total de penas que, somadas, ultrapassam 2 mil anos (aproximadamente 2.294 anos de penas). “Acho que o episódio mais recente (“Vaza Jato”) dessas revelações todas vai nos levar a fazer essas reflexões e a tentar retomar os princípios básicos de operação do Estado de direito, de modo a respeitar as garantias e a liberdade que a Constituição de 88 garantiu como norte para o nosso princípio civilizatório. E a gente, hoje, enfrenta grave riscos de perdê-las”, defende Arantes.