Sob risco

Moro se defende com ameaça. ‘Não se constrói Estado de direito com essa forma de justiça’

Questionado sobre seus erros, ex-juiz cita número de prisões efetuadas para dizer que Lava Jato fez justiça. Professor critica

Fabio Rodrigues Pozzebom/EBC
Fabio Rodrigues Pozzebom/EBC
"Não é padrão que nós desejamos nem para os de cima, nem para os de baixo, não se constrói um Estado de Direito praticando justiça dessa maneira", contesta professor sobre argumentos de Moro

São Paulo – Quando tem seus métodos à frente da Lava Jato questionados, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, já mostrou uma viciada argumentação: não nega diretamente os diálogos com o procurador da operação Deltan Dallagnol, mas questiona a origem da fonte do site jornalístico The Intercept Brasil, além de avaliar sua conduta como algo “trivial”. Mas é também desviando o foco de sua atuação questionável como juiz, para a Operação Lava Jato, que Moro reforça o que pode, na prática, resultar no desmonte do Estado de Direito: o punitivismo. A avaliação é do professor do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Políticas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP) Rogério Arantes, em entrevista à Rádio Brasil Atual.

Moro, que em conversa com Dallagnol parece atuar como chefe da força-tarefa, violando o sistema acusatório que impede o juiz de descumprir o princípio de imparcialidade, defende a Lava Jato pelo número de prisões realizadas no âmbito da operação, como se a promoção de justiça estivesse associada ao cárcere. Algo que, de acordo com Arantes, sempre foi usado contra a população mais pobre do país.

“Não é o padrão que desejamos nem para ‘os de cima’, nem para os ‘de baixo’. Não se constrói um Estado de direito praticando justiça dessa maneira. Não se chega a uma aplicação justa da lei por métodos heterodoxos, que desrespeitam as garantias do processo legal, como a gente tem visto neste caso da Lava Jato e em tantos outros”, avalia o professor aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria.

Um levantamento feito pela advogada criminalista e integrante da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) Clarissa Nunes, ao jornal Brasil de Fato, mostra que de 2014 para cá cerca de 160 condenações foram assinadas pelo ex-magistrado, em um total de penas que, somadas, ultrapassam 2 mil anos (aproximadamente 2.294 anos de penas). “Acho que o episódio mais recente (“Vaza Jato”) dessas revelações todas vai nos levar a fazer essas reflexões e a tentar retomar os princípios básicos de operação do Estado de direito, de modo a respeitar as garantias e a liberdade que a Constituição de 88 garantiu como norte para o nosso princípio civilizatório. E a gente, hoje, enfrenta grave riscos de perdê-las”, defende Arantes.

Ouça a íntegra da entrevista