Respeito à Constituição

‘Quem milita nos direitos humanos tem de ser otimista’, afirma Paulo Vannuchi

Em entrevista, ex-ministro diz que movimentos pela democracia tomam corpo e que a consciência das ameaças ao direito já provocam divisão dentro do Judiciário

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São Paulo – “É preciso falar em direitos humanos exatamente para enfrentar esse tsunami que está em curso, para usar a palavra que ele (Bolsonaro) mesmo usou”, diz o ex-ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos, no período Lula, Paulo Vannuchi. Em entrevista ao canal do Youtube À Esquerda, iniciativa dos ex-senadores Lindbergh Farias (PT-RJ) e Vanessa Graziotin (PCdoB-AM), ele afirmou ser necessário, no atual quadro “dramático” da história brasileira, não apenas militar, mas acreditar na reversão da crise que ameaça os direitos consagrados na Constituição de 1988, herdeiros da Carta das Nações Unidas de 1948, do pós-Segunda Guerra.

“Quem milita nos direitos humanos tem de ser otimista, acreditar num futuro melhor, num ser humano melhor, na igualdade racial, de gênero e social. E, nesse otimismo, a ideia de que vamos vencer, e o Brasil vai recuperar em curto ou médio prazo o respeito às regras da Constituição de 1988, apesar de Bolsonaro”, afirmou.

Um dos motivos pelos quais se pode antever um momento de retomada da democracia no país, para Vannuchi, são as mobilizações de massa que estão “tomando corpo”, o que se pôde observar nas manifestações pela educação e contra os cortes nas universidades.

Outro dado, acrescenta, é que a consciência das ameaças ao direito, à presunção de inocência, à ideia de que a o cidadão não pode ser perseguido judicialmente começa a provocar divisão dentro do próprio Judiciário. Segundo Vanucchi, Bolsonaro não é “um governo de exceção, mas de transgressão contra a Constituição de 1988 e contra os estatutos dos direitos humanos”. Mas, felizmente, algumas paredes do estado democrático continuam de pé e o jogo segue.”

Comissão Arns

Na entrevista, Vannuchi falou da importância e das prioridades da Comissão Arns de Defesa dos Direitos Humanos, criada por autoridades e intelectuais em defesa dos direitos humanos no Brasil e inspirada no cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, morto em dezembro de 2016.

Inaugurada em fevereiro, a comissão não nasceu contra Bolsonaro, esclareceu. “Não nasceu contra ninguém, mas a favor dos Direitos Humanos.” De acordo com a avaliação do ex-ministro, em torno da Comissão Arns está a ideia de que a democracia brasileira precisa do centro, no espectro político. “As forças democráticas da esquerda acreditam no jogo democrático e, nesse sentido, precisa haver o centro. Com a eleição de Bolsonaro, a ficha caiu.”

A comissão “nasceu com pluralidade e juntou 20 figuras de diferentes governos e de governo nenhum.” Ele lembrou que a guinada à direita no país não começou com Bolsonaro, o que é simbolizado pela vice-candidata à presidência da República de Geraldo Alckmin, a ex-senadora Ana Amelia, que aplaudiu os tiros disparados contra a caravana de Lula em 2018. “A vice de um candidato que era tido como democrático. O PSDB não é mais aquele de Covas, de Montoro, o da Constituinte. Foi nesse sentido que a Comissão Arns surgiu.”

O ex-ministro explicou que a comissão selecionou alguns casos que sintetizam a ideia de sua criação: a chacina do Fallet, a questão indígena, a morte de um jovem negro em uma loja da rede Extra e a questão do apelo às armas desencadeado por Bolsonaro.

Nesse contexto, está a discussão do pacote anticrime do ministro da Justiça, Sérgio Moro, e a necessidade de esclarecer sobre suas inconstitucionalidades. “Não há um único especialista em segurança que diga que o pacote ajuda (no combate à violência.)”

Uma “mesa de diálogo” reunindo entidades como CNBB e OAB também faz parte das propostas da comissão. A ideia, disse Vannuchi, se relaciona com a chacina de Suzano, “que estamos esquecendo”. Em resumo, a intenção é manter uma mesa permanente contra a violência e para pregar a paz.

O ex-ministro comentou ainda sobre a descriminalização das drogas, cuja discussão, no Brasil, começou a partir da questão dos medicamentos a base de canabinol, substância química que faz parte da composição da Cannabis sativa. Segundo Vannuchi, a mudança no Brasil, em relação ao tema, fatalmente acontecerá . “É preciso mexer e o Brasil vai mexer. O Bolsonaro gostaria que não mexesse. Ele sendo presidente, vai demorar mais. Mas é uma tendência civilizatória irreversível.”

Assista Paulo Vannuchi em Direitos Humanos e Resistência

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