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Previdência: ‘Presidente do STF não deveria participar de pacto que retira direitos’, diz analista

Projeto de "reforma" do governo Bolsonaro prevê desconstitucionalização da Previdência Social, que deveria ser defendida pelo Supremo

Marcos Corrêa/PR
Marcos Corrêa/PR
"Mais vulneráveis" devem pagar o pacto entre poderes que retira direitos das aposentadorias

São Paulo – O presidente Jair Bolsonaro defendeu um “pacto” entre os três poderes da República para aprovar medidas que, segundo ele, serviriam para destravar a economia. Os presidentes do Senado e da Câmara, David Alcolumbre (DEM-AP) e Rodrigo Maia, e do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, foram tomar café da manhã no Palácio da Alvorada nesta terça-feira (28). No cardápio, a “reforma” da Previdência. Além de aumentar o tempo de contribuição e reduzir o valor das aposentadorias, o projeto prevê a retirada da Constituição de parâmetros que regulam os benefícios.

Para o cientista político e professor da Universidade Federal do ABC (UFABC) Vitor Marchetti, é “muito esquisita” a participação de Toffoli num acordo desse tipo. Inclusive o texto que servirá de base para o nomeado Terceiro Pacto Republicano pela Realização de Macrorreformas Estruturais foi levado pelo próprio ministro do STF.

“Preocupa que o presidente da Casa guardiã da Constituição participe de uma conversa desse tipo”, disse Marchetti aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria, do Jornal Brasil Atual, nesta quarta (29). “Não é papel dele construir esse tipo de agenda. Que sinal que o Supremo dá para o país ao se dispor a discutir temas que claramente afrontam a Constituição?”, destaca.

Pagar o ‘pacto’

Segundo o analista, quem deve acabar arcando com os custos de um pacto desse tipo é certamente a “população mais vulnerável”, que se ampara na Constituição na esperança de ver concretizados direitos ali os direitos previstos. O professor explica que o STF tem justamente a função de zelar pela legalidade das ações dos poderes Executivo e Legislativo. Ele lembra que a Carta Magna foi resultado de um “enorme pacto” feito pela sociedade, em 1988, que elegeu uma Assembleia Constituinte para elaborar o documento.

“Agora um pacto entre os chefes dos três Poderes, num momento instável, de incertezas, com derretimento de popularidade desses atores, crise de legitimidade e dificuldade de articulação entre esses mesmos poderes, a gente vai fazer um pacto de desconstitucionalização?”, pergunta Marchetti. Segundo ele, esse tipo de movimentação, além de preocupante, tem a finalidade de tentar resgatar a confiança perdida dos “agentes do mercado” que estão “abandonando o barco do governo Bolsonaro”.

Caneta

Outra contradição apontada é que Bolsonaro, ao mesmo tempo em que acena para um “pacto de governabilidade”, a todo momento entra em rota de colisão com os outros dois poderes. O episódio mais marcante foi a convocação do presidente para as manifestações ocorridas no último domingo (26), que tinham o intuito de acuar o Congresso e fazê-lo apoiar as pautas de interesse do governo. No mesmo dia do encontro com os chefes dos poderes, Bolsonaro disse que tem mais poder na caneta que Maia. “De manhã, ele toma café com os demais poderes tentando apaziguar as coisas e, à noite, volta a jogar querosene na fogueira. Não é possível que os agentes de mercado ainda consigam acreditar que essa presidência ainda é capaz de produzir alguma racionalidade”, criticou Marchetti.

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